MinC demite 81; ministro aponta 'aparelhamento'

Guilherme Sobota, Valmar Hupsel Filho, Sandra Manfrini e Roberta Pennafort

27/07/2016

 

 

Executivo. Cultura exonera comissionados em postos de chefia da pasta e fala em demanda por ‘gestão republicana’; medida gera reação no setor, crítico ao governo Temer.

O Ministério da Cultura demitiu ontem 81 funcionários ligados a diversas diretorias e instituições importantes de sua estrutura. As exonerações geraram críticas entre representantes do setor, que demonstrou forte resistência ao governo interino de Michel Temer. O ministro Marcelo Calero saiu em defesa da medida, pediu “o fim do aparelhamento no MinC” e disse que a atual gestão não quer “um ministério que se contente com fotinhos bonitas e ‘posts engajados’”.

A pasta chegou a ser extinta após o afastamento da presidente Dilma Rousseff, em maio. Houve forte reação da classe artística. Logo nos seus primeiros dias, a gestão Temer enfrentou protestos de servidores do MinC e artistas. Prédios de órgãos vinculados ao ministério foram ocupados e viraram palco de manifestações “Fora, Temer”.

Diante da pressão, menos de dez dias depois de iniciado o governo interino, Temer recuou e decidiu recriar o MinC – que havia sido rebaixado ao status de secretaria subordinada ao Ministério da Educação (MEC).

A exoneração em massa ocorreu um dia após a Polícia Federal desocupar o Palácio Gustavo Capanema, sede do MinC no Rio.

Os manifestantes estavam no prédio desde 16 de maio, em protesto contra o governo Temer.

Segundo interlocutores do presidente em exercício, Calero assumiu a pasta com a missão de rebater acusações da classe artística de que promove uma desmanche de projetos e de políticas públicas e demonstrar que os recursos do antigo MinC eram desperdiçados e direcionados a um grupo de artistas e produtores privilegiados pela gestão anterior.

As demissões publicadas ontem no Diário Oficial da União incluíam os diretores e coordenadores da Cinemateca Brasileira, em São Paulo – entre elas a coordenadora-geral Olga Toshiko Futemma –, e da Diretoria do Livro, Leitura, Literatura e Bibliotecas, em Brasília.

Também houve exonerações na Fundação Biblioteca Nacional, no Museu Villa-Lobos e em diretorias do próprio MinC. Todos os demitidos detinham cargos comissionados.

De acordo com o ministério, as demissões fazem parte da “reestruturação da pasta e do plano de valorização dos servidores de carreira” e atendem a “uma demanda da sociedade civil por uma gestão republicana”, na qual os servidores concursados ocupariam os cargos de chefia.

Oswaldo Massaini Filho foi confirmado como novo coordenador- geral da Cinemateca.

Segundo fontes ouvidas pela reportagem, as exonerações no Ministério da Cultura ocorreram para “acomodação” política de outros indicados. O Estado apurou que foi dada uma orientação para que todos os servidores sem vínculo com o serviço público federal, que ocupassem DAS 3, 4 ou 5, fossem demitidos. A notícia das demissões repercutiu mal entre especialistas que estavam ligados às políticas do MinC e ex-dirigentes da pasta.

‘Canalhice’. Juca Ferreira, ex-ministro da Cultura na gestão Dilma, afirmou que as demissões comprometem a “capacidade de funcionamento” do ministério.

“É uma tentativa malandra de cativar os funcionários de carreira com essa decisão superficial”, afirmou Ferreira, que classificou como uma “canalhice” a crítica do ministro ao que chamou de “aparelhamento” do MinC.

“Não conseguiram acabar com o ministério, agora querem destruir seu funcionamento”, disse. “O senhor Calero não está preparado para ser ministro da Cultura. Ele não sabe para onde o vento sopra. Vai fazer o que mandarem ele fazer.” No post que publicou no Facebook, o ministro chamou de “levianas e irresponsáveis” as ilações a respeito de eventual extinção da Diretoria do Livro, Leitura, Literatura e Bibliotecas.

“Ao contrário, será fortalecida, na medida em que sua chefia será exercida, preferencialmente, por servidor de carreira”, escreveu. “Queremos um ministério de entregas e resultados.”

Acusações

“Não queremos um ministério que se contente com fotinhos bonitas.”

Marcelo Calero

MINISTRO DA CULTURA

“Não conseguiram acabar com o ministério, agora querem destruir seu funcionamento.”

Juca Ferreira

EX-MINISTRO DA CULTURA

CRONOLOGIA

Guerrilha cultural

12 de maio

Governo interino anuncia a fusão dos ministérios da Educação e da Cultura. O deputado Mendonça Filho (DEM-PE) assume o MEC.

13 de maio

Um dia após tomar posse, o ministro é recebido com vaias e cartazes de protesto por funcionários da Cultura.

15 de maio

Artistas, produtores e servidores públicos iniciam ações de protesto em diversas capitais. O cantor Caetano Veloso faz show na sede da Funarte, no Rio, ocupada por manifestantes.

20 de maio

Em resposta à pressão contra a extinção do MinC, Temer cria o cargo de secretário nacional de Cultura, com status maior, e nomeia o diplomata Marcelo Calero.

21 de maio

Temer volta atrás e recria o MinC, com Calero como ministro. O anúncio é feito por Mendonça Filho.

25 de julho

O Palácio Capanema, prédio do MinC no Rio, é desocupado pela Polícia Federal, em decorrência de decisão judicial em favor do Iphan, que pediu reintegração de posse.