PF prende cachoeira e apura desvio de R$ 370 mi 

Roberta Pennafort, Vinicius Neder e Constança Rezende 

01/07/2016

 

 

A Polícia Federal prendeu ontem Carlos Augusto de Almeida Ramos, o Carlinhos Cachoeira, e mais três suspeitos de envolvimento em um esquema que lavou R$ 370,4 milhões em recursos públicos federais.

Quinto alvo da operação e apontado como chefe da quadrilha, Fernando Cavendish, dono da empreiteira Delta Construções, é considerado foragido – está, possivelmente, na Europa, segundo a PF. A empreiteira e 18 empresas de fachada que serviam a ela são apontadas como parte da engenharia montada para lavar o dinheiro.

A Operação Saqueador, planejada pela PF e pelo Ministério Público Federal, apurou que o esquema fraudulento montado em torno da Delta resultou no desvio de verbas destinadas a obras entre 2007 a 2012. São obras superfaturadas ou que nem sequer foram realizadas.

Segundo os investigadores, servidores públicos e políticos receberam propina da Delta, mas nenhum foi nominado na denúncia apresentada ontem.

Foram identificadas três organizações criminosas que agiam em conjunto: uma dentro da Delta, outra liderada por Adir Assad e Marcelo Abbud, donos de empresas fantasmas, e uma terceira por Cachoeira, também proprietário de empresas do gênero. Cachoeira e Cláudio Abreu, ex-diretor da Delta, foram presos em Goiânia. Assad e Abbud em São Paulo.

Cavendish embarcou no último 22 do Rio para a Europa, segundo a PF, que não divulgou o destino do voo. O empreiteiro será procurado com a ajuda de Interpol. Ontem cedo, a PF chegou a procurá-lo em seu apartamento, de frente para a praia do Leblon, área nobre da zona sul carioca. No imóvel, os agentes apreenderam um cofre. Da sede da empresa, no centro, levaram um malote de documentos.

Mais 18 pessoas – 14 funcionários da Delta, duas sócias de empresas de fachada e dois contadores – foram denunciadas pelo Ministério Público Federal como operadores do esquema.

Todos por lavagem de dinheiro e associação criminosa.

A PF foi aos endereços indicados como sedes das empresas de fachada, com as quais eram firmados contratos fictícios, e encontrou um consultório de dentista em Santana de Parnaíba (SP) e uma loja de material de construção na capital paulista, além de residências e áreas descampadas. Segundo os investigadores, as empresas emitiam notas fiscais frias, “limpando” o dinheiro.

Depois, os valores eram sacados em espécie para o pagamento de propinas, disse o procurador Leandro Mitidieri, autor da denúncia. “As investigações foram centradas na Delta, mas (os corrompidos) podem ser desde servidores públicos a políticos.” As notas frias eram expedidas para a Delta e outras empresas corruptas, segundo as investigações.

Entre as obras da Delta que constam da denúncia está a do Parque Aquático Maria Lenk, construído no Rio para o Pan Americano de 2007 com dispensa indevida de licitação, e que agora será usado na Olimpíada.

Outra obra é a transposição do Rio Turvo (RJ), para a qual foram destinados R$ 80 milhões.

A transposição jamais foi feita. Cavendish chegou a ser condenado a quatro anos e meio de prisão em regime semiaberto pelo desvio dessa verba, em 2013.

No Rio, o empresário mantinha relação próxima com o exgovernador Sérgio Cabral (PMDB), que não é alvo da operação deflagrada ontem.

Construtora. Apesar de investigada por envolvimento em esquemas de corrupção há pelo menos quatro anos, a Delta continua autorizada a receber dinheiro público. O governo federal a declarou inidônea em junho de 2012 por desvio de verbas federais, mas a decisão foi suspensa ano passado.

No período investigado – 2007 a 2012 –, quase todo o faturamento da empresa Delta (96,3%, cerca de R$ 11 bilhões) foi oriundo de contratos com instituições públicas.

Para chegar aos alvos, os investigadores utilizaram informações de operações da PF de 2012 – Vegas e Monte Carlo – que tiveram como foco os negócios ilegais de Cachoeira, que coleciona acusações por crimes como exploração de jogo de azar, corrupção, lavagem de dinheiro, falsidade ideológica e contrabando. Trechos da delação premiada de executivos da Andrade Gutierrez, na Lava Jato, também foram usadas.

‘SAQUEADOR’

● A Polícia Federal deflagrou ontem operação que investiga lavagem de R$ 370 milhões; Carlos Augusto Ramos, conhecido como Carlinhos Cachoeira, foi preso em Goiânia; outros quatro investigados tiveram a prisão decretada

Como se dava o desvio?

R$ 370 milhões DA DELTA TERIAM SIDO LAVADOS DE 2007 E 2012

● Empreiteira Delta Construções firmava contrato com órgãos públicos para a realização de obras. O dono da empresa, Fernando Cavendish, teve prisão decretada

● Órgão público pagava pelo serviço a ser prestado pela empreiteira

● Obra era superfaturada ou não era sequer executada, segundo as investigações

● Dinheiro recebido era “lavado” por meio de 18 empresas de fachada; “operadores” dessas empresas também foram alvo da operação

● Dinheiro “limpo” era usado para pagamento de propina de agentes públicos. Ex-diretor da Delta, Cláudio Abreu foi preso apontado como responsável por negociar propina

● Operadores do esquema, mostram as investigações, também embolsavam parte do dinheiro.