Juiz reage à decisão de Toffoli de soltar ex-ministro

Julia Affonso, Mateus Coutinho e Fausto Macedo

01/07/2016

 

 

Paulo de Azevedo, da Justiça Federal em SP, critica ato do ministro do STF que liberou Paulo Bernardo; magistrado cita ‘tendência’ de prender apenas pobres.

O juiz federal Paulo Bueno de Azevedo, que na semana passada mandou prender o ex-ministro Paulo Bernardo, alvo da Operação Custo Brasil, criticou a revogação da prisão preventiva, ordenada anteontem pelo ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal.

Na decisão que mandou soltar o ex-ministro, para cumprir a ordem de Toffoli, Azevedo afirmou que há uma “tendência, ainda que inconsciente” de que a sociedade é ameaçada exclusivamente na ocorrência de crimes violentos praticados por pobres.

O juiz da 6.ª Vara Criminal Federal de São Paulo foi enfático ao criticar o entendimento de Toffoli – segundo o qual a prisão preventiva de um suspeito cabe para os casos de extremada agressividade. “Observo que a doutrina invocada na decisão do Supremo Tribunal Federal (de soltura de Bernardo) fala da possibilidade de prisão preventiva em crimes como ‘homicídio por esquartejamento ou mediante tortura, tráfico de quantidades superlativas de droga, etc.’, o que, a meu ver, reflete a tendência, ainda que inconsciente, de se considerar a existência de riscos apenas em crimes violentos, no mais das vezes cometidos apenas por acusados pobres.” O ex-ministro é o alvo maior da Custo Brasil, deflagrada pela Polícia Federal em parceria com a Procuradoria da República. A investigação aponta detalhes do suposto esquema envolvendo a Consist – empresa de software que teria desviado R$ 100 milhões de empréstimos consignados no âmbito do Ministério do Planejamento, desde 2010, na gestão de Bernardo.

Segundo os investigadores, o ex-ministro teria recebido R$ 7,1 milhões do esquema, via advogado Guilherme Gonçalves, estabelecido em Curitiba. O escritório de Gonçalves teria bancado despesas eleitorais da senadora Gleisi Hoffmann (PTPR), mulher de Bernardo. Eles negam irregularidades. Por meio de Reclamação ao Supremo, a defesa do ex-ministro obteve a revogação da ordem de prisão.

‘Estranheza’. Sobre o pedido de soltura de Bernardo, o juiz federal anotou que “causou estranheza” a decisão de Toffoli. “Preliminarmente, causou estranheza a este Juízo a reclamação defensiva no sentido de que este Juízo teria usurpado a competência do Supremo Tribunal Federal, conforme consta no relatório da mencionada decisão do Supremo. É preciso lembrar que os presentes autos somente foram distribuídos a este Juízo Federal, por determinação expressa do próprio Supremo Tribunal Federal. A alegação de usurpação de competência da Corte Suprema, nestas circunstâncias, parece, no mínimo, leviana.” Ao abordar a fundamentação da prisão preventiva, Azevedo apontou sua preocupação em torno da possibilidade de não ser localizado o dinheiro desviado pelo esquema Consist.

Riscos

“(A decisão do STF) Reflete a tendência, ainda que inconsciente, de se considerar a existência de riscos apenas em crimes violentos, no mais das vezes cometidos apenas por acusados pobres.”

Paulo Bueno de Azevedo

JUIZ FEDERAL