Governo usará ‘reserva’ para não cortar gastos

 
23/07/2016
Rachel Gamarski
Eduardo Rodrigues
Idiana Tomazelli

 

Para evitar um corte de gastos no Orçamento, o governo do presidente em exercício Michel Temer vai gastar R$ 16,5 bilhões da reserva de R$ 18,1 bilhões criada para acomodar os riscos fiscais. Com nova frustração de receitas e aumento de gastos obrigatórios, se essa reserva não fosse usada, o déficit fiscal para 2016 seria de R$ 187 bilhões, bem acima dos R$ 170,5 bilhões previstos para o ano e já aprovados pelo Congresso. Na avaliação do ministro interino do Planejamento, Dyogo Oliveira, o Relatório de Receitas e Despesas, divulgado ontem, mostrou que, de fato, “não há folga” na meta fiscal. “Esses R$ 16,5 bilhões estão dentro do que o governo havia provisionado para lidar com as incertezas fiscais. Se nada fosse feito, a meta não seria cumprida. Mas o governo teve essa preocupação ao manter uma provisão. O relatório mostra que não havia folga na meta, como algumas pessoas disseram. Pelo contrário, mostra que o governo trabalhou com bastante transparência e clareza”, disse o ministro.

Nos últimos dias, houve um intenso debate dentro do governo se deveria ser feito ou não um contingenciamento de despesas no orçamento, que poderia chegar a R$ 20 bilhões. A ala econômica argumentava que, com a arrecadação em queda, não se poderia correr o risco de descumprimento da meta fiscal. Mas a ala política defendia que não seria muito conveniente anunciar cortes de gastos, principalmente sociais, às vésperas da votação no Senado do impeachment da presidente afastada Dilma Rousseff.

Menos dinheiro. A frustração de receita líquida no relatório de ontem é de R$ 7,9 bilhões em relação à previsão de maio. Já as despesas obrigatórias foram reestimadas em mais R$ 8,6 bilhões. O governo considerou também os R$ 2,9 bilhões que precisou desembolsar para socorrer o Rio de Janeiro, que receberá os Jogos Olímpicos no próximo mês.

Pelo lado da receita, além da queda acima do esperado na arrecadação de importantes tributos, o governo reduziu a previsão com receitas extraordinárias de R$ 9 bilhões para R$6,884 bilhões. A equipe econômica, porém, continua sem explicitar de onde esses recursos serão arrecadados.

Nesse contexto, o governo resolveu assumir, pela primeira vez, que a arrecadação com a CPMF, o imposto do cheque, será zero. Com o discurso de realismo fiscal, o novo governo já tinha deixado claro que não contará com esse reforço de caixa enquanto o projeto não for aprovado pelo Congresso Nacional.

Também houve queda no volume que o governo pretende levantar com concessões e no reforço esperado com a participação especial paga ao Estado na exploração de petróleo.

No campo das despesas, o déficit do Regime Geral da Previdência Social (RGPS) aumentou e será de R$ 149,238 bilhões neste ano. O relatório anterior previa uma estimativa negativa em R$ 146,365 bilhões. O aumento do déficit foi de R$ 2,872 bilhões, fruto de uma projeção de aumento mais intenso nos gastos do que na arrecadação líquida do Regime Geral.

Segundo o relatório, a arrecadação líquida da Previdência será de R$ 358,6 bilhões, mas o pagamento de benefícios totalizará R$ 507,838 bilhões. Na avaliação anterior, de maio, a previsão era uma arrecadação líquida de R$ 356,909 bilhões, enquanto os gastos ficariam em R$ 503,274 bilhões.

A próxima etapa é a divulgação do decreto de programação orçamentária e financeira já considerando os dados divulgados ontem.

PIB melhor. Em relação ao desempenho da economia, o governo também divulgou novas projeções para este ano. Para o Produto Interno Bruto (PIB), passou a prever uma contração de 3,1%. A estimativa oficial anterior era de uma queda maior, de 3,8% para 2016. Economistas ouvidos pelo Banco Central no Boletim Focus preveem uma queda de 3,25%.

A inflação oficial deve fechar este ano em 7,2%, segundo as projeções divulgadas ontem, acima do teto da meta para este ano, de 6,5% (o centro da meta é de 4,5%). Se concretizada a estimativa, será o segundo ano consecutivo que a inflação vai estourar o teto da meta. Até então, o governo contava com uma previsão de inflação de 7%. O mercado financeiro prevê 7,26%. / RACHEL GAMARSKI, EDUARDO RODRIGUES E IDIANA TOMAZELLI

 

Sem folga

“Esses R$ 16,5 bilhões estão dentro do que o governo havia provisionado para lidar com as incertezas fiscais. Se nada fosse feito, a meta não seria cumprida. O relatório mostra que não havia folga na meta, como algumas pessoas disseram.”

Dyogo Oliveira

MINISTRO INTERINO DO PLANEJAMENTO

 

O Estado de São Paulo, n. 44839, 23/07/2016. Economia, p. B3