Valor econômico, v. 17, n. 4047, 14/07/2016. Política, p. A7

Delatores propõem falar sobre aeroportos

Por: Letícia Casado / Fábio Pupo

Por Letícia Casado e Fábio Pupo | De Brasília

 

Candidatos a delatores na Operação Lava-Jato, executivos e ex-executivos de Odebrecht e OAS começam a fornecer informações sobre irregularidades envolvendo aeroportos, apurou o Valor. Eles confirmaram o favorecimento a empresas no processo de concessão de terminais à iniciativa privada, que ocorreu durante o governo da presidente Dilma Rousseff.

As informações são preliminares e fazem parte das propostas de delação premiada; os acordos ainda não foram fechados e os depoimentos ainda não começaram. Cerca de 70 executivos do grupo Odebrecht estão negociando delação, dentre os quais Marcelo Odebrecht, ex-presidente e herdeiro da companhia. No caso da OAS, em torno de 15 executivos estão em tratativas com o Ministério Público Federal, incluindo o presidente Leo Pinheiro. Odebrecht e Pinheiro já foram condenados na Lava-Jato.

No caso da Odebrecht, um candidato a delator disse que a empresa teria sido beneficiada com determinadas regras no leilão de aeroportos do qual saiu vencedora. A empresa levou o aeroporto do Galeão em 2013. Na época, o governo federal colocou em prática duas grandes medidas que acabaram por reduzir o número de concorrentes.

A primeira delas foi elevar a exigência sobre os sócios estrangeiros de cada consórcio, que deveriam comprovar experiência na administração de aeroportos com pelo menos 35 milhões de passageiros ao ano (no leilão anterior, menos de dois anos antes, a exigência era de apenas 5 milhões). Na ocasião, o governo afirmou que queria atrair operadores estrangeiros com maior expertise. Como resultado do "aperto na regra", apenas 14 empresas em todo o mundo tinham tal experiência na época - entre elas, a sócia da Odebrecht no setor de aeroportos, a asiática Changi.

Outra regra criada pelo governo Dilma naquela rodada, e que chegou a causar reações no mercado sobre a falta de embasamento jurídico, foi impedir empresas que já tinham conquistado um ativo no leilão anterior (que concedeu o aeroporto de Guarulhos, por exemplo) de participar da nova disputa - que tinha como alvos Galeão e Confins. Isso tirou do caminho três consórcios que estavam demonstrando forte apetite pelo setor - compostos por empresas como Invepar, Engevix, Triunfo e UTC.

Parte das empresas reclamou que as regras estavam sendo mudadas no meio do jogo (já que a regra só passou a valer depois que o primeiro leilão de aeroportos, em 2011, foi consumado), mas foram repreendidas publicamente por Dilma em seus discursos. Ao fim do leilão de 2013, Galeão ficou com a Odebrecht e Confins (MG) ficou com a CCR (empresa que tem entre as controladoras Andrade Gutierrez e Camargo Corrêa).

Em outra delação, o ex-presidente da OAS, Leo Pinheiro, tem um anexo todo dedicado ao tema em seu acordo. A OAS é sócia de Previ (fundo dos funcionários do Banco do Brasil), Petros (da Petrobras) e Funcef (da Caixa) na Invepar, companhia de concessões de infraestrutura que tenta há anos lançar ações em bolsa e que venceu o aeroporto de Guarulhos - o maior do país.

Em 12 de abril deste ano, a PF cumpriu mandado de busca e apreensão na sede da Invepar e em sua subsidiária Aeroporto de Guarulhos Participações S.A. (Grupar), controladora do GRU Airport. Na mesma data, a PF levou o diretor-presidente da Invepar, Gustavo Rocha, para prestar depoimento sob condução coercitiva.

Considerado um dos principais marcos do governo Dilma pela mudança de postura em relação à iniciativa privada, o primeiro grande leilão de aeroportos do país ocorreu em fevereiro de 2012 e concedeu por R$ 24,5 bilhões os aeroportos de Guarulhos (SP), Campinas (SP) e Brasília (DF).

Os vencedores foram consórcios liderados por Invepar, Triunfo/UTC e Engevix - respectivamente. No segundo caso, as obras não foram terminadas a tempo e até hoje sequer uma multa foi aplicada às empresas. O segundo leilão ocorreu em novembro de 2013 e arrecadou R$ 20,8 bilhões.

O tema "aeroportos" não foi tratado na delação dos 11 executivos da Andrade Gutierrez, mas eles podem ser chamados a prestar novos depoimentos sobre o aeroporto de Confins.

O acordo de leniência firmado com a Andrade Gutierrez também pode abrir novos caminhos sobre a questão do aeroporto de Confins. A empresa está em fase de adesão de funcionários para participar do acordo.

OAS e Odebrecht informaram que não vão se manifestar sobre o assunto. Ambas as empresas negociam acordo de leniência com o MPF. Em nota, a Invepar informou que a Justiça Federal acatou o pedido de arquivamento do inquérito sobre o presidente Gustavo Rocha. A nota afirma que o leilão de Guarulhos seguiu as normas do edital de concessão e que houve um ágio de 373,5%, acima do preço mínimo no certame.