O globo, n. 30293, 15/07/2016. País, p. 8

Padilha pediu ajuda de executivo para contratar seu call center

Cunha foi convidado para reunião do então deputado com Otávio Azevedo

Por: Thiago Herdy

 

Em mensagens enviadas ao então presidente do grupo Andrade Gutierrez, Otávio Azevedo, o ministro-chefe da Casa Civil, Eliseu Padilha, fez um pedido para que a companhia Oi contratasse a estrutura do escritório de call center que ele tem em Porto Alegre. Na época, a empresa de telefonia era controlada pela empreiteira. O pedido foi feito entre 2013 e 2014, na época em que Padilha era deputado federal. A troca de mensagens consta de relatório da Polícia Federal sobre o conteúdo do celular usado por Azevedo, incluído em inquérito da Lava-Jato.

Padilha admite a troca de mensagens e os encontros com Azevedo, mas afirma que o projeto com a Oi não foi adiante. Ele sustenta que este foi o único motivo de contato dele com a Andrade Gutierrez. O cruzamento das mensagens no celular mostram, no entanto, que o deputado federal Eduardo Cunha foi convidado para participar de pelo menos uma das reuniões entre o executivo e Padilha, o que contradiz a primeira versão apresentada pelo ministro ao GLOBO.

Na manhã de ontem, Padilha disse ter tratado do tema apenas com o presidente da empreiteira e com um parceiro no negócio de call center em Porto Alegre. À noite, informou não lembrar da reunião de São Paulo e da presença de Eduardo Cunha. O ex-presidente da Câmara também afirmou “não ter recordação do encontro”.

As menções diretas à negociação do call center aparecem em textos de fevereiro de 2014:

“Caro Otávio, como foi a reunião com o ministro e o líder?”, iniciou Padilha.

“Tenho um call center em P. Alegre e poderemos fazer ótima parceria”, continuou.

 

“SURGIU UMA LUZ”

Menos de duas horas depois, Otávio respondeu, mas não é possível dizer se ele tratava do mesmo assunto: “A reunião foi boa e surgiu uma luz para acelerarmos o processo”, escreveu.

“Ótimo, podes compartilhar?”, perguntou Padilha três minutos depois, recebendo como resposta: “Call Center precisamos de falar”.

Quatro meses depois, às 15h41m de 25 de junho, Padilha voltou a falar com o executivo:

“Caro Otávio! Caso possas, gostaria de falar pessoalmente em nome da pessoa com a qual estivemos. Hoje ainda, se possível”, escreveu.

De acordo com o mesmo relatório, na noite de 17 de agosto de 2013, Padilha perguntou a Azevedo qual era o endereço do encontro marcado para dali a dois dias. O executivo respondeu:

“Rua Geraldo Campos Moreira, 375, 9º andar. Brooklim Novo (Berrini). É na Praça do Hotel Blue Tree Tower. Telefone 5502 2339, Júlia”.

Trinta e um segundos depois, Azevedo replicou a mesma mensagem com o endereço da reunião para o telefone de Cunha, que respondeu: “ok”.

O relatório da PF aponta que Azevedo tinha intimidade com Cunha. Eles trocaram dezenas de mensagens entre 2011 e 2014, em que acertam mudanças “em segredo” de textos legislativos, encontros e até pagamentos em contas do PMDB e de empresa do deputado fluminense. O endereço para o convite da reunião entre Padilha, Cunha e Azevedo é a sede da Andrade Gutierrez em São Paulo, usada por parte da área comercial da empreiteira e da administração da holding. O prédio nunca teve escritórios da Oi. Trata-se do mesmo endereço usado para reuniões do cartel que atuava em contratos da Petrobras, segundo depoimento do ex-executivo da Camargo Corrêa Dalton Avancini. O local foi alvo de busca e apreensão em junho de 2015.

Dezessete dias depois da data do encontro marcado com Azevedo e Cunha, Padilha voltou a escrever para o então presidente da Andrade:

“Prezado, como vai o cronograma. Quando falamos? Aguardo. abs”. No dia seguinte, enviou nova mensagem: “Tínhamos marcado com o outro player para a próxima semana, mas esperaremos por ti”.

O ministro é dono de dois andares de prédio em Porto Alegre equipados para o call center. O espaço é alugado para a Explorer Call Center, que o remunera de acordo com o número de posições de atendimento utilizadas. Localizado, o locatário das salas, André Carvalho de Fraga, disse não saber que Padilha prospectava clientes para a empresa.

— Se ele indicou algum cliente, não falou comigo. Sou o único que faz o contato comercial.

Em evento em São Paulo, ontem, Padilha disse que Fraga é o player mencionado. Alegou não tê-lo avisado sobre a negociação.

— O outro player é a pessoa que é o arrendatário, sujeito que alugou o prédio (de call center). Eu falei com ele se ele poderia vir a Brasília se eu precisasse e ponto. (...) O Otávio não estava (em Brasília) e o assunto morreu.

Padilha disse que a Oi não assinou acordo por não ter havido “interesse”. — Foi uma conversa comprida — afirmou. Padilha disse não ver conflito de interesses entre ser deputado e pedir ajuda do presidente de uma empreiteira:

— Nunca me pediram nada. Eu que me apresentei com essa ideia (de call center). Otávio me foi apresentado como presidente da companhia, mas nunca fez qualquer pedido específico. Na época eu era deputado, mas nunca participei de nada em que houvesse algum pedido dele — afirma o atual ministro da Casa Civil.

Advogado da Andrade Gutierrez — que na época era a controladora da OI — , Juliano Breda informou que as mensagens de Azevedo “já foram objeto de questionamentos" da PGR. Segundo ele, "sempre que necessário", o executivo "voltará a colaborar com as investigações no interesse da Justiça". (Colaborou Sérgio Roxo).

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Sérgio Moro critica governo e Congresso

Nos Estados Unidos, juiz federal fala sobre imobilismo do país no combate à corrupção

Por: HENRIQUE GOMES BATISTA

 

Parte das investigações da Operação Lava-Jato pode acabar até o fim deste ano. O juiz federal Sérgio Moro, responsável pelo caso na Justiça Federal em Curitiba, afirmou ontem, durante debate em Washington, que pretende acabar com sua participação na operação ainda em 2016, embora tenha dito que é difícil fazer previsões, pois novas evidências poderão surgir. Ele lembrou também que parte dos processos relativos à operação seguirão no Supremo Tribunal Federal, onde os casos podem durar mais tempo.

— A investigação ainda está em aberto. É difícil fazer previsões, minha parte pode ser encerrada no fim do ano, mas não posso dizer isso com certeza — afirmou o juiz, no Instituto Brasil, do Wilson Center. — Não estou tão seguro de que terei poucos meses de Lava-Jato. Um dia disse que poderia terminar até o fim do ano, mas é um caso em aberto e, às vezes, podem chegar novas evidências.

Moro foi crítico ao governo e ao Congresso e disse considerar “sistemática” a corrupção da Petrobras. Afirmou também que, após sua participação na LavaJato, espera tirar longas férias e depois voltar à atividade normal de juiz.

Moro afirmou que, além de discursos, até agora nem governo nem Congresso fizeram contribuições “significativas” para o combate à corrupção.

O juiz disse ainda que, apesar de todo o espaço dado às delações premiadas, a principal arma das investigações continua a ser o rastreamento do dinheiro:

— Alguns críticos da Lava-Jato dizem que a operação depende muito das informações obtidas em acordos de delação. A verdade é que o processo envolve o uso de outros métodos de investigação, e a velha estratégia de seguir o dinheiro continua a ser o mais importante método de investigação.

O juiz disse que a quebra do sigilo bancário dos suspeitos tem auxiliado, juntamente com a cooperação internacional para descobrir valores no exterior. Segundo ele, historicamente casos de corrupção não geram condenações no Brasil, mas isso mudou após o mensalão.

— O aspecto mais problemático do caso (Lava-Jato) é que parece que o pagamento de subornos em contratos da Petrobras não foi uma exceção, mas sim a regra. Alguns dos criminosos cooperantes usaram essa palavra. Eles descreveram os crimes cometidos como uma regra do jogo em contratos do setor público — disse o juiz. — Todos esses fatos, especialmente os casos já sentenciados, permitem concluir que há um ambiente de corrupção sistêmica.

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