Derrotado, Centrão promete colaborar

 
15/07/2016
Erich Decat

 

Derrotados com a ajuda do Palácio do Planalto na disputa pela presidência da Câmara dos Deputados, líderes do Centrão (PP, PR, PSD, PTB, PSC e partidos nanicos) prometem não atrapalhar a votação de propostas de interesse do governo, após a retomada das atividades no Congresso Nacional, em agosto.

Apesar do abatimento com a derrota, a ordem dentro do grupo é aproveitar o recesso legislativo para “recolher os mortos e cuidar dos feridos”.

“Não gosto de comentar nada logo após a derrota. Prefiro esperar acalmarem os ânimos um pouco. Temos um agrupamento importante, mas mudou o comando da Casa e vamos aguardar para ver como isso vai ser”, afirmou o líder do PTB, Jovair Arantes (GO).

Jovair foi um dos coordenadores da campanha de Rogério Rosso (PSD-DF), que também preferiu minimizar a derrota e a participação do governo na corrida pelo comando da Casa.

“Agora somos parte da mesma base. Com equilíbrio e maturidade, vamos apoiar o presidente Michel Temer e procurar ter uma maior coesão, com menos divisão”, afirmou Rosso, líder do partido. Ele falou com o presidente em exercício logo após o resultado no plenário.

 

‘Efeito Cunha’. Apesar de declarar fidelidade, líderes do Centrão consideram que Temer poderá enfrentar uma “tormenta” caso o deputado afastado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) resolva apontar sua artilharia contra integrantes do PMDB e do governo. Mesmo derrotado na Casa, Cunha ainda tem uma base aliada que pode tentar obstruir votações, por exemplo.

Na análise do Centrão, o governo, ao entrar em campo para derrotar Rosso na disputa pela presidência da Casa, acabou por “entregar a cabeça de Cunha”.

Alguns deputados lembram que o revés na campanha de Rosso, considerado um aliado do deputado fluminense, ocorreu menos de 48 horas depois de Cunha, ao se sentir acuado na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), fazer ameaças contra seus adversários.

“Hoje foi comigo; amanhã será com vocês”, afirmou Cunha no colegiado que julga seu processo de cassação. Ontem, ele voltou a repetir esse discurso e acabou derrotado, tendo seu recurso rejeitado pela CCJ.

Outro elemento que pode provocar “estremecimentos” na base é a leitura de parlamentares de que foi feito um “acordão” entre o grupo que elegeu Rodrigo Maia (DEM-RJ) e o Planalto para a disputa de fevereiro de 2017. Na ocasião, estará em jogo um mandato de dois anos no comando da Casa.

O líder do PP, Aguinaldo Ribeiro (PB), outro coordenador da campanha do Centrão, considerou como um dos motivos para a derrota o clima criado dentro da Casa contra Cunha, considerado o “arquiteto” do grupo.

“Acho que o efeito Cunha foi muito forte, a realidade é essa.

Mas a Casa definiu por duas excelentes candidaturas. O importante é que a decisão foi tomada dentro da base do governo”, afirmou Ribeiro.

No balanço do Centrão, a participação do governo em prol de Maia e a debandada da bancada do PR contribuíram para a derrota do grupo. Na noite da disputa, o líder do partido, Aelton Freitas (MG), chegou a procurar Rosso e informou a ele que, dos 43 integrantes da bancada, ele poderia entregar entre sete a dez para o candidato.

“No segundo turno não tínhamos nenhum compromisso com nenhum dos candidatos.

Questionei um a um da bancada e, de cada dez, oito estavam com Maia”, afirmou Freitas. Segundo ele, o ministro dos Transportes, Maurício Quintella Lessa, também deu o aval pela candidatura do DEM. “Consultamos o nosso ministro. Ele também disse que tinha preferência pelo Maia”, ressaltou o líder.

 

‘Sem interferência’. Procurado, o líder do governo na Câmara, André Moura (PSC-SE), nega que o governo tenha tido qualquer interferência na disputa. “O governo não entrou. O ministro Geddel Vieira Lima (Secretaria de Governo) nos disse para ficarmos distantes”, afirmou.

Sobre o racha no Centrão, do qual o PSC também faz parte, Moura considerou: “Não tenho que ficar preocupado com o Centrão, mas com a base como um todo, o que importa é ela estar unida”.

Para ele, o andamento do processo de Cunha dentro da Casa também não vai contaminar a governabilidade. “Não tem essa história de o governo ter entregado a cabeça dele de bandeja.

A situação de Cunha vai ter que ser enfrentada em algum momento e temos que dar continuidade aos nossos trabalhos.”

 

Dia seguinte

“Agora somos parte da mesma base. Com equilíbrio e maturidade, vamos apoiar o presidente Temer e procurar ver maior coesão, com menos divisão”

Rogério Rosso (PSD-DF

DEPUTADO DO CENTRÃO DERROTADO POR RODRIGO MAIA (DEM)

 

“Acho que o efeito Cunha foi muito forte”

Aguinaldo Ribeiro (PP-PB)

DEPUTADO E UM DOS COORDENADORES DA CAMPANHA DO CENTRÃO

 

COMPOSIÇÃO DE FORÇAS

Com a eleição de Rodrigo Maia, do DEM, à presidência da Câmara, antiga oposição se fortalece e se aproxima de Temer

ANTIGA OPOSIÇÃO - 117

PMDB - 66

CENTRÃO - 222

NOVA OPOSIÇÃO - 97

OUTROS - 10

 

PSDB, DEM, PPS e PSB

Grupo sai fortalecido com a eleição de um representante seu na presidência da Câmara – Rodrigo Maia (DEM)–, mas ainda é minoritário na Casa.

 

PMDB

A eleição de Maia mostrou que o maior partido da Câmara, com 66 deputados, tem cerca de 30% dos seus deputados insatisfeitos com o governo Temer. Ao desidratar a candidatura do correligionário Marcelo Castro, o presidente mostrou que a força do cargo deve se impor sobre essas insatisfações.

 

PP, PTB, PSD, PR, PRB, PSC, PROS, SD, PHS, PTN, PSL, PEN e PTdoB

Além da derrota na eleição para a presidência da Câmara, o grupo sofreu ontem mais uma derrota com o avanço do processo de cassação de seu principal líder, Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Apesar do enfraquecimento e fragmentação, continua sendo a maior força da Câmara e promete alinhamento ao governo nas votações da Casa.

 

PT, PCdoB, PDT, PSOL e Rede

É o menor grupo da Câmara, mas o apoio dado a Rodrigo Maia no 2º turno da disputa à presidência da Casa pode ajudar a contornar essa dificuldade.

 

PV, PRTB, PRP e PMB

O PV detém o Ministério do Meio Ambiente e grupo tende a votar com Temer na Casa.

 

* A composição da Câmara tem 512 deputados porque Eduardo Cunha está afastado

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Castro critica Planalto e diz que ‘faltou lealdade’ do PMDB

 

15/07/2016
Luciano Coelho

 

O deputado Marcelo Castro (PMDB-PI) afirmou ontem que o Palácio do Planalto atuou para derrotá-lo na disputa pela presidência da Câmara. Segundo ele, seu nome foi lançado na sucessão de Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que renunciou na quinta-feira da semana passada, para unir seu partido, que tem a maior bancada da Casa – 66 parlamentares.

O deputado disse que faltou “lealdade”. Para Castro, no entanto, o Planalto fez pressão sobre os peemedebistas a fim de que votassem em outro candidato.

“É porque eu fui ministro da Dilma (Rousseff), votei contra o impeachment e tinha o apoio do PT”, disse o peemedebista em referência à presidente afastada. No primeiro turno da votação, realizada anteontem, Castro obteve 70 votos e ficou em terceiro lugar.

Castro lamentou o fato de ter sido derrotado, apesar da votação interna que definiu uma candidatura para, segundo ele, unificar o PMDB. “Eu poderia ser candidato avulso, mas preferi me submeter ao partido, porque é o maior da Câmara. Esperava superar as dificuldades e criar uma unidade para irmos atrás de outros apoios”, afirmou o parlamentar.

‘Medo’. O deputado disse também que perdeu apoios porque o governo interino de Michel Temer teria mobilizado ministros para pedir, em cada gabinete, que os parlamentares não votassem no candidato do PMDB.

“O Planalto não poderia parecer enfraquecido. A minha candidatura não era do Planalto. O Planalto nem sabia da minha candidatura. Acho que ficaram com medo de eu ser eleito com o apoio do PT. São coisas que acontecem na política”, disse.

“(A articulação do Palácio do Planalto) Atrapalhou a minha ascensão, mas político é acostumado com essas coisas. O PMDB me magoou, porque, se eu tinha direito de ser candidato, não precisava do partido, mas me submeti ao partido para disputar os votos do partido.

Fiz isso aceitando as regras do jogo. Acho que faltou lealdade”, afirmou Castro.

 

Dúvida. O deputado questionou ainda a necessidade de uma votação na bancada: “Para que essa submissão ao partido? O problema é que eles não aguentaram a pressão do Planalto e me tiraram o apoio”, afirmou.

Castro disse que teria ido para o segundo turno com Rogério Rosso (PSD-DF), representante do Centrão, mas as manobras acabaram dando votos a Rodrigo Maia (DEM-RJ).

“O que prevíamos acontecer é o que aconteceu com o Rodrigo Maia, os votos foram descarregados nele, como seriam em mim, contra Rosso. Estão todos contra o Centrão, que ficou estigmatizado”, disse o peemedebista, que, no entanto, destacou o perfil conciliador do deputado federal do DEM.

 

‘Direito’

“O PMDB me magoou, porque me submeti ao partido para disputar os votos do partido.”

Marcelo Castro (PMDB-PI)

DEPUTADO DERROTADO NA DISPUTA

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Partidos têm menos coesão do que grupos ‘parapartidários’

 

15/07/2016
Marco Antônio Carvalho Teixeira

 

O número de candidatos que disputaram a presidência da Câmara revela, pelo menos, duas situações que têm sido comuns na história recente da política brasileira. A primeira situação refere- se à carência de líderes com boa reputação pública capazes de formular acordos e construir agendas legislativas como instrumento de debate público que possibilitasse, minimamente, avançar em respostas que são necessárias para diminuir o déficit de credibilidade dos legisladores perante a sociedade.

A segunda situação vem escancarar ainda mais a incapacidade dos partidos políticos de coordenar as ações coletivas dentro de suas bancadas e produzir um mínimo de consenso político em torno de alguma candidatura. Apesar da votação secreta, o resultado traz algumas evidências: 1) os votos do PT acabaram se dispersando entre pelo menos três candidatos (Marcelo Castro, Orlando Silva e Luiza Erundina); 2) os deputados do PMDB se dividiram entre Rogério Rosso (o preferido de Eduardo Cunha), o peemedebista Marcelo Castro e outras candidaturas como a de Rodrigo Maia; 3) tal dispersão evidencia o quanto as bancadas para partidárias (Centrão, ruralistas e evangélicos, por exemplo) vêm conseguindo obter mais coesão dentre os seus membros do que os próprios partidos em que eles estão filiados.

As implicações políticas da vitória de Rodrigo Maia (DEM) podem ser vistas de diferentes perspectivas. Michel Temer tem motivos para ficar feliz e para se preocupar. O contentamento vem do fato de o governo interino ter ficado livre de continuar tendo um aliado de Cunha conduzindo a Câmara.

Isso pode destravar pautas e diminuir o custo político da tramitação de projetos de interesse governamental. Todavia, Temer deve se preocupar com o tipo de reação que pode ser desencadeada pelo chamado Centrão com a derrota do seu candidato, como também sobre a imprevisível postura que Cunha poderá adotar daqui para frente em relação ao governo, lembrando que ele ainda tem influência sobre pelo menos uma centena de parlamentares. De todo modo, a chegada do DEM à presidência da Câmara tem como consequência o enfraquecimento do Centrão e daquele que seria o seu principal articulador. O triunfo de Maia foi comemorado imediatamente no plenário com gritos de “fora Cunha”.

Do lado da oposição (PT, PSOL, Rede, PCdoB e PDT), o fraco desempenho de seus candidatos (Luiza Erundina e Orlando Silva) demonstra as limitações concretas do grupo para organizar a atuação institucional na Câmara. A oposição – sobretudo o PT – só vai avançar em agendas legislativas se reaprender a atuar como caixa de ressonância de demandas sociais de grupos que não estão sendo contemplados pelo governo e agir como fiscal da ação governamental. Para isso, não poderá dar prioridade apenas à ação institucional sem antes dialogar com diferentes atores da sociedade.

Por fim, não há, pelo menos no curto prazo, a perspectiva de pacificação na Câmara, algo que o novo presidente da Casa colocou como objetivo de sua gestão.

As dúvidas acerca de como o Centrão vai se comportar frente ao espaço político que perdeu e as incertezas acerca dos desdobramentos da Lava Jato e da possível cassação do mandato de Cunha não permitem fazer essa projeção.

 

O Estado de São Paulo, n. 44831, 15/07/2016. Política, p. A8