Título: Enfim, a liberdade
Autor: Tranches, Renata
Fonte: Correio Braziliense, 18/10/2011, Mundo, p. 16

Sob forte comoção, Israel concretiza hoje a troca do soldado Gilad Shalit por 477 presos palestinos

Após mais de cinco anos detido pelo grupo extremista islâmico Hamas, o soldado Gilad Shalit deve ser libertado hoje, como resultado de um audacioso acordo entre Israel e os fundamentalistas, que controlam o território palestino da Faixa de Gaza. A véspera da operação, em que Shalit será trocado por um primeiro grupo de 477 prisioneiros árabes, foi marcada pela expectativa dos que aguardam a volta de Shalit e pela contrariedade daqueles que tiveram parentes mortos em ataques promovidos por alguns dos presos que ganharão a liberdade. Já nas primeiras horas da madrugada, pelo horário local, a Suprema Corte recusou as últimas petições que tentavam barrar a troca.

Desde que foi assinado o acordo entre Israel e Hamas, há uma semana, o debate público cresce a cada dia, principalmente por conta da inclusão de palestinos envolvidos em atentados terroristas. Ontem, o ex-chefe militar Rabbi Avihai Rontzki, ao comentar o acordo em entrevista à tevê Arutz Sheva, afirmou que, a partir de agora, soldados de Israel não devem mais prender suspeitos de terrorismo, mas sim "matá-los em suas camas". Ele negou estar incitando a revanche por parte das famílias das vítimas, mas acrescentou que "isso pode acontecer".

Se tudo correr como combinado (veja o quadro), o sargento Shalit, de 25 anos, será entregue de manhã a autoridades egípcias, na Faixa de Gaza. Ele será levado imediatamente para Israel, onde se reunirá com o premiê Benjamin Netanyahu, o ministro da Defesa, Ehud Barak, e o chefe de Estado-Maior, general Benny Gantz. Em seguida, reencontrá a família, que não vê há mais de cinco anos. Shalit, que também tem cidadania francesa, foi trocado por 1.027, mas hoje sairão 450 homens e 27 mulheres. A maior parte cumpre prisão perpétua. Mais 550 serão soltos nos próximos dois meses.

Algumas famílias israelenses, porém, não concordam com a troca e tentaram até o último recurso para impedi-la. A Justiça preferiu não contrariar a decisão do gabinete. Netanyahu enviou carta aos membros dessas famílias e disse entender e simpatizar com eles, mas reafirmou que tem, como premiê, "a responsabilidade de trazer para casa soldados que foram enviados para proteger nossos cidadãos". O pai do rapaz, Noam Shalit, pediu que a Corte rejeitasse as demandas, pois "cada atraso poderia representar o risco de fazer o acordo fracassar".

Discrição O jornal Haaretz antecipou que Netanyahu deverá fazer um breve comunicado após a libertação de Shalit, no qual se espera que ele diga que o povo judeu "não celebrará a soltura de assassinos". Apesar de prometerem uma comemoração discreta, israelenses se preparavam para receber Shalit sob forte comoção pública. O quadro era semelhante para a chegada dos palestinos, que serão transportados da prisão de Ketziot sob forte esquema de segurança. Alguns dos libertados devem se encontrar com o líder do Hamas no exílio, Khaled Meshaall.

Dos 477 prisioneiros, 204 deverão ser exilados: 164 para a Faixa de Gaza e 40 para outros países. Ontem, foi anunciado que Turquia, Catar e Síria receberiam os últimos. Outros 137 foram autorizados a voltar para casa na Faixa de Gaza, 96 para a Cisjordânia e 14 para Jerusalém Oriental. Seis árabes israelenses também voltarão para casa.

Capturado em 25 de junho de 2006 por um comando palestino, na fronteira com a Faixa de Gaza, Shalit tornou-se um ícone em Israel. Especialmente na última semana, seu rosto estampava de camisetas a cartazes. Cerca de 5 mil palestinos cumprem pena em prisões israelenses, a maioria por crimes relacionados à segurança. Segundo a Autoridade Palestina, entre os detentos estão 35 mulheres e 285 menores de idade. Pelo menos 260 estão detidos sem apresentação de acusação judicial.

Brasileiro será solto Um dos prisioneiros palestinos a serem libertados hoje é Tawfic Abdallah, marido da brasileira Lamia Maruf. Uma reportagem da rede BBC Brasil, citando o advogado da família, Airton Soares, informou que, após deixar a prisão, Abdallah virá morar no Brasil. Ele foi preso com a mulher em 1986, dois anos depois do assassinato do soldado israelense David Manos. Segundo a reportagem, o casal foi preso após forças de segurança israelenses encontrarem o carro utilizado no sequestro do soldado, que havia sido alugado com o passaporte brasileiro de Lamia.