Valor econômico, v. 17, n. 4038, 01/07/2016. Política, p. A7

Cunha negocia sucessão com governo e aceita conversar sobre renúncia

Por: Raphael Di Cunto

Por Raphael Di Cunto | De Brasília

 

As contas na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados são desfavoráveis à manutenção do mandato do presidente afastado Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Além de depender dos votos unânimes do centrão, grupo que lhe deu sustentação até agora, mas começa a desgarrar, Cunha precisa doapoio de quase todo o PMDB para se salvar. E só vai obter isso caso os partidos assumam o desgaste e troquem os deputados que são favoráveis à cassação.

O pemedebista impetrou recurso na CCJ contra o parecer do Conselho de Ética pela sua cassação. Alega que ocorreram 16 irregularidades que exigem a anulação do processo, o que, se confirmado por 34 dos 66 integrantes da comissão, levará a representação à estaca zero ou, pelo menos, a refazer parte considerável da tramitação.

Os partidos contrários a Cunha têm 29 deputados na CCJ. O centrão (formado por PP, PR, PSD, PRB, PTB, entre outros) contabiliza 27 representantes. Vários deles, porém, já se declaram contra aprovar o recurso.Cunha pressiona seus aliados a tirarem esses integrantes por outros que votem contra o parecer do Conselho de Ética, mas líderes dizem nos bastidores que não pretendem repetir o que já fizeram PR, PTN e SD sob risco de rebelião.

O principal argumento é que, embora os líderes prestem solidariedade a Cunha, grande parte das bancadas deseja ver o deputado cassado. "Sou contra o recurso. Quero que o processo vá logo ao plenário", afirmouDomingos Neto (CE), um dos dois titulares do PSD na CCJ - são cinco- que já declara abertamente seu voto.

PP, PR e PTB também contam defecções. "Para se salvar ele vai precisar de unanimidade do centrão, e isso ele não teve nem no Conselho de Ética", afiança um líder aliado a Cunha, lembrando o voto de Tia Eron (PRB-BA),que desempatou o placar a favor da cassação.

Além do centrão, Cunha depende ainda do apoio de quase dos 10 integrantes do PMDB na CCJ. Não são poucos os deputados do partido, contudo, que reclamam que o presidente afastado, ao promover o centrão e brigar com o antigo líder do PMDB, Leonardo Picciani (RJ), isolou sua própria sigla.

Três pemedebistas da comissão ouvidos pelo Valor afirmaram que a tendência é rejeitar o recurso, mas preferem não se expor agora para evitar conflitos com o governo, que já sonda os votos do PMDB. Em busca desses votos e do apoio do Palácio do Planalto para eleger seu sucessor, Cunha tem procurado auxílio do presidente interino Michel Temer, dizem aliados.

O governo tem agido nos bastidores para convencer o deputado a renunciar e liberar a sucessão. Temer está preocupado com o andamento das votações na Casa sob a gestão do interino Waldir Maranhão (PP-MA), que, depois de cancelar as sessões esta semana, já avisou que presidirá o plenário durante o "esforço concentrado" dos próximos dias.

Não foi à toa que ontem o primeiro-secretário da Câmara, deputado Beto Mansur (PRB-SP), ex-aliado de Cunha e muito próximo de Temer, defendeu que o pemedebista renuncie na próxima semana, quando se completam dois meses de seu afastamento pelo Supremo Tribunal Federal (STF).

O principal trunfo do presidente interino em relação à presidente afastada Dilma Rousseff é a força no Congresso para aprovar as medidas que a petista não conseguiu com o objetivo de colocar as contas em dia, ganhar a credibilidade do mercado e assim retomar o crescimento. Mas a pauta não anda. "A ordem do dia, até a renúncia, será o Eduardo Cunha", reclama um governista.

O presidente afastado tenta o apoio do governo em torno de um nome do centrão para sucedê-lo e avisou que, caso seja salvo na CCJ, aceitará renunciar, segundo duas fontes. O parecer sobre o recurso será lido naquarta-feira e a votação está prevista para dia 12.

O favorito no Palácio, pela ligação não tão explícita com Cunha e capacidade de agregar mais grupos na Casa, é o líder do PSD, Rogério Rosso (DF) - que nega a intenção de concorrer como tampão. Parte da antiga oposição, formada por PSDB, PSB, PPS e DEM, também rejeita a ideia. "Com Eduardo Cunha não tem acordo", afirma o líder do PPS, Rubens Bueno (PR).