Valor econômico, v. 17, n. 4042, 07/07/2016. Política, p. A9

Fracasso em manobra na CCJ faz Cunha sinalizar que renunciará

Por: Raymundo Costa / Raphael Di Cunto

Por Raymundo Costa e Raphael Di Cunto | De Brasília

 

O presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), sinalizou ao governo que deve renunciar hoje ao cargo do qual afastado, segundo fonte próxima ao presidente interino Michel Temer. O aceno ocorreu depois que o parecer do deputado Ronaldo Fonseca (Pros-DF), relator do recurso contra a cassação de Cunha, aumentou a tendência de que a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) dê prosseguimento ao processo de perda do mandato do pemedebista.

Em seu parecer, Fonseca sugere uma nova votação no Conselho de Ética, alegando que não poderia ter sido usado no colegiado a chamada nominal. A argumentação de Fonseca foi considerada pouco convincente por deputados que terão voto decisivo no processo.

Pelo parecer, a votação por chamada nominal do relatório pela cassação não teria previsão no regimento, e "aparentemente" teria causado um "efeito manada", com o deputado Wladimir Costa (SD-PA) mudando seu voto para a cassação.

"Fiz isso para evitar uma nulidade total no futuro", afirmou Fonseca. A chamada nominal, defendeu, só é possível quando o painel eletrônico estiver quebrado ou para autorizar a instauração de processo de impeachment contra o presidente da República. E a votação deveria ser alternadamente entre os deputados de Norte a Sul, e não por bloco partidário, como ocorreu.

Um dos votos que Cunha precisará para se salvar, o deputado Domingos Neto (PSD-CE) discorda. "A resolução que determinou a votação no painel eletrônico é de 1992, mas só em 2013 é que foi implantado nas comissões. Fui presidente de comissão em 2012 e todas as votações eram por chamada nominal, nunca existiu esse negócio de Norte a Sul. Vão anular todas as votações?", criticou.

Com 29 votos certos pela cassação, de partidos ou deputados abertamente contra Cunha, a sobrevida do pemedebista na CCJ depende dos 27 votos do centrão (composto por PSD, PR, PP, PTB, PRB, entre outros) e dos 10 do PMDB. O parecer será aprovado se tiver o apoio de 34 deputados, caso não ocorram abstenções ou votos em branco. Cabem, nesse cenário, três "traições" dos partidos aliados ao presidente afastado que ele ainda venceria.

Mas, na mesma linha de Neto, outros deputados do centrão e do próprio PMDB se mostram resistentes a apoiar o parecer. "Havia até um sentimento na Câmara de aprovar o recurso porque, todos concordam, sem Eduardo Cunha não teria o impeachment e o PT ainda estaria no governo. Mas o argumento não se sustenta", afirmou o deputado Capitão Augusto (PR-SP). "É muito frágil", concordou Edson Moreira (PR-MG).

Covatti Filho (PP-RS) diz que sua intenção é votar contra o parecer, mas que estudará a questão da votação nominal. No PMDB, a articulação é para apoiar Cunha, mas ainda não houve ordem expressa e há pelo menos quatro dos 10 titulares que, nos bastidores, se manifestam contra o recurso.

Sabendo destas dificuldades, Cunha pressiona aliados a tirarem os integrantes contrários ao recurso e incluírem outros favoráveis. Já surtiu efeito no PR - que trocou dois dos cinco titulares, mas os outros três estão contra o recurso-, o SD e PTN. Há pressão ainda sobre PP, PSD e PRB, que resistem à manobra por causa do desgaste.

Mesmo essa estratégia, contudo, mostra fragilidades. O PTN trocou Bacelar (BA) por Carlos Gaguim (TO) há duas semanas, mas já precisa mudar de novo - entrará Jozi Araújo (AP) - porque Gaguim, apesar de aliado de Cunha, disse em reunião na terça-feira que não poderá votar com o pemedebista. O grupo contra Cunha na legenda diz que a indicação do partido para a presidência da Funasa, intermediada por ele, está travada até a votação na CCJ ocorrer.

Se o recurso for aceito pela maioria da comissão, composta por 66 integrantes, o processo voltará à fase de votação no Conselho de Ética - o que deve prorrogar os prazos até agosto e, por causa do calendário eleitoral, empurrar a votação até depois das eleições municipais, conforme o calendário previsto por aliados dele.

Neste caso, Cunha estaria se comprometendo a renunciar à presidência no mesmo dia em que fosse aprovado o recurso na CCJ - que começará a discutir o parecer na segunda-feira e deve votá-lo na terça-feira, dia 12.

Segundo Carlos Marun (PMDB-MS), um dos principais defensores de Cunha, o ideal seria aprovar outras nulidades, como o impedimento do presidente do conselho, mas a defesa ainda não avaliou se essa estratégia é possível. "Não sei se existe a condição política para isso", disse.