Valor econômico, v. 17, n. 4042, 07/07/2016. Especial, p. A14

META FISCAL DEVE LEVAR A SOLUÇÃO 'SALOMÔNICA'

Por: Fabio Graner e Andrea Jubé

 

Por Fabio Graner e Andrea Jubé | De Brasília

 

Após um dia de intensas negociações entre a equipe econômica e a área política, que entrou até a noite de ontem, o governo do presidente interino Michel Temer ainda não tinha uma meta fiscal de 2017 fechada para anunciar, mas já trabalha com elevação de tributos, como a Cide dos combustíveis.

O senador Wellington Fagundes (PR-MT), relator da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), disse que o objetivo do ano que vem deve ficar entre R$ 150 bilhões e R$ 160 bilhões de déficit primário. Uma fonte do governo que participou da reunião, entretanto, disse que a meta pode ficar abaixo dos R$ 150 bilhões. Na reunião, a equipe econômica disse que, se nada for feito, os cálculos apontam para um saldo negativo da ordem de R$ 194 bilhões e o esforço é para reduzir isso em um montante de R$ 40 a R$ 50 bilhões, o que colocaria a discussão na faixa de R$ 140 a R$ 160 bilhões de déficit.

A equipe econômica quer construir uma meta com o menor déficit possível e gostaria de um número abaixo dos R$ 150 bilhões, permitindo uma sinalização mais clara de melhora na trajetória fiscal do país e algum simbolismo de vitória do ministro da Fazenda, Henrique Meirelles. Temer fez um apelo para que os parlamentares aprovem, até o dia 13 de julho, a emenda constitucional que fixa um teto para os gastos públicos na comissão especial, e a LDO, pelo menos, na comissão.

Uma fonte do Planalto explicou ao Valor que Temer buscava uma solução "salomônica", pois não queria se indispor com Meirelles nem desagradar o núcleo político, que defende maior espaço fiscal em 2017. "Há os números técnico e político. Temer, como bom político, vai buscar um número de equilíbrio entre essas duas extremidades", disse uma fonte.

Para reduzir o déficit, segundo o senador Fagundes, o governo prepara a elevação de tributos que não dependem do Congresso, como a Cide (o mais provável) e outros, como IOF, IPI e PIS/Cofins. Fagundes afirmou que estão sendo levantados números de possível arrecadação adicional com privatizações (um dos cenários seria de R$ 25 bilhões), securitização da dívida ativa e até algum mecanismo para obter recursos da repatriação de ativos no exterior em 2017 (o que implicaria mudança da lei).

O senador disse que Meirelles deve trazer a meta final hoje por volta do meio-dia para apresentar a Temer, e o anúncio oficial deve ficar para o período da tarde.

Desde segunda-feira ficou evidente a disputa entre a alas políticas e econômica do governo, quando o ministro-chefe da Casa Civil, Eliseu Padilha, fez uma defesa aberta da repetição da meta de R$ 170,5 bilhões para o ano que vem. Não se tratava apenas de uma opinião a mais no processo, mas sim de uma manifestação contrária ao que, nas últimas semanas, vinha indicando o Ministério da Fazenda, com declarações do próprio Meirelles, mas também de secretários, como Mansueto Almeida. Ambos disseram que a nova meta iria mostrar uma melhora fiscal no ano que vem.

Ontem, o senador Romero Jucá, ex-ministro e um dos principais interlocutores de Temer, tentou mostrar que, apesar de elevado, o déficit do próximo ano mostrará uma melhora gradual do lado fiscal. "O déficit de R$ 170 bilhões é fundo do poço. A partir do próximo ano, teremos escalada. É uma mudança de indicador que considero consistente", disse no Senado e depois repetiu no Twitter. Ele disse que o governo não iria repetir a estratégia do ex-ministro Joaquim Levy, de tentar um superávit primário a qualquer custo, mas sem sustentabilidade. "Não estamos jogando pro mercado nem para fazer um superávit de ocasião. Não é nossa ação. Nossa ação é sustentável", afirmou Jucá.

Na mesma direção, o ministro-interino do Planejamento, Dyogo de Oliveira, reforçou, no Senado, que o governo tem uma estratégia fiscal de longo prazo, baseada na Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que limita o crescimento dos gastos públicos à inflação do ano anterior.

Ele lembrou que esse controle de despesas deve reduzir o gasto federal em cerca de cinco pontos porcentuais do PIB em dez anos, o que também é levado em conta pelos investidores, além da meta fiscal.

Na tarde de ontem, os ministros Meirelles e Padilha se reuniram para alinhar o direcionamento da meta. Temer participou de uma parte da reunião. No fim do dia, os três voltaram a se encontrar, mas dessa vez com a presença de parlamentares da Comissão Mista de Orçamento.

O núcleo político defende um déficit maior a fim de garantir "estabilidade" para a economia e reserva fiscal para preservar os programas da área social, investir em novos projetos e negociar também com municípios.

Já Meirelles desejava fixar um déficit entre R$ 130 bilhões e R$ 140 bilhões. A avaliação da Fazenda é que é preciso dar um sinal mais concreto ao mercado de que o governo está realmente comprometido com o ajuste fiscal, e disposto a fechar a torneira dos gastos federais.

Uma meta de déficit primário superior a R$ 150 bilhões tende a ser vista pelo mercado como um sinal de fragilidade da equipe econômica e menor disposição do governo Temer de tomar medidas duras. No entanto, no Palácio do Planalto buscava passar o entendimento que um número na faixa de R$ 150 bilhões a R$ 155 bilhões era uma vitória de Meirelles, já que Padilha tinha defendido publicamente um déficit maior.

O problema todo é que o governo Temer tem dificuldade para sinalizar grandes medidas de aumento de arrecadação, diante da forte rejeição do Congresso a elevação de tributos. "Como esse é um governo que se define como semi-parlamentarista, fica difícil falar em subir tributos", disse uma fonte palaciana. (Colaborou Raphael Di Cunto, de Brasília)