Valor econômico, v. 17, n. 4043, 08/07/2016. Especial, p. A12

LAVA-JATO INVESTIGA BANCO PANAMENHO

Por: Carolina Leal* / Letícia Casado

Por Carolina Leal* e Letícia Casado | De Curitiba e Brasília

 

A Operação Lava-Jato avançou ontem sobre um esquema transnacional de lavagem de dinheiro montado pelo FPB Bank, banco do Panamá que atuava de forma clandestina no Brasil na comercialização de offshore. Os investigadores identificaram 44 offshore negociadas pelo FPB Bank no país e registradas pelo escritório advocatício Mossack Fonseca, já investigado na Lava-Jato. Sete representantes do banco no Brasil foram alvos de mandado de condução coercitiva; não houve prisões na 32ª fase da Lava-Jato, batizada de Caça-Fantasmas.

A investigação agora focará em descobrir quem são os clientes do banco - uma lista apreendida pelo MPF mostra que o FPB Bank no Brasil opera ao menos 71 contas ocultas. Para a força-tarefa da Lava-Jato, os recursos movimentados através dele tem origem potencialmente ilícita.

O caso pode abrir uma nova frente de atuação da Lava-Jato e levar à descoberta de crimes ligados não só a corrupção, mas também a fraudes no sistema financeiro. Segundo o delegado da PF Igor Romário de Paula, "esse é só um dos casos". "Temos outros casos de bancos em situação semelhante, ainda em investigação, que virão à tona no momento oportuno."

O FPB Bank surgiu nas investigações após a análise de documentos apreendidos no escritório da Mossack Fonseca, alvo da 22ª fase da Lava-Jato, em janeiro. A Mossack teria sido contratada por quatro investigados no esquema da Petrobras - os ex-executivos Pedro Barusco e Renato Duque e os operadores Mário Góes e Roberto Trombeta - para abrir empresas offshore, que depois receberiam o dinheiro fruto de corrupção.

As investigações mostraram uma parceria da Mossack Fonseca com o FPB Bank, que é registrado no Panamá, mas não tem autorização para atuar no Brasil. O escritório indicava o banco a clientes que queriam abrir contas offshore e o banco indicava os serviços do escritório a clientes que queriam abrir empresas fora do país.

Os investigadores viram aí indícios de que o FPB Bank seria um intermediário na constituição e registro de offshore para os clientes, figurando como "responsável" ou como "contato" da empresa. O objetivo seria "movimentar valores supostamente à margem do sistema financeiro nacional", além de ocultar os verdadeiros sócios, a fim de viabilizar a lavagem de dinheiro dos clientes.

A Lava-Jato viu indícios também de que o FPB Bank seria responsável por fazer "offshore de gaveta", a ser vendida ou usada em determinadas transações comerciais ou financeiras.

Na Mossack Fonseca, a PF localizou um telefone criptografado que, segundo uma funcionária do escritório, foi instalado a pedido do FPB Bank e servia exclusivamente como uma forma de comunicação segura entre os representantes das duas empresas.

Sem licença do Banco Central, o banco é acusado de utilizar uma empresa de fachada, a Minúcia Assessoria Contábil, para conseguir atuar no Brasil. O Ministério Público Federal cita e-mails e documentos que mostram que o banco atuava por meio da Minúcia e que as atividades das duas empresas se confundiam. Inclusive, afirmam os procuradores, o e-mail de todos os que são apontados como representantes do FPB Bank no país tem a extensão "@minucia.net".

Além disso, os quatro sócios da Minúcia são apontados como sendo também representantes do banco, sendo que dois deles, Edson Fanton e Edsel Okuhara, saíram do quadro societário da empresa um dia depois da Mossack Fonseca se tornar alvo da Lava-Jato, o que reforçou as suspeitas dos investigadores.

Para o juiz Sergio Moro, há uma suspeita plausível de que as empresas panamenhas Mossack Fonseca e FPB Bank tenham acobertado crimes. "O anonimato garantido [pelas empresas] aos seus clientes gera fundada suspeita de acobertamento de crimes", afirma o juiz no despacho em que autorizou os mandados da operação.

Os investigadores vão na mesma linha do juiz Sergio Moro, dizendo que a forma de atuação da Mossack e do FPB Bank favorecia a movimentação de recursos ilícitos. "A documentação era produzida e movimentada de forma tal que não pudessem ser identificados os reais proprietários das empresas. Isso nos leva crer que a grande maioria dos clientes são clientes com recursos que tem origem ilícita", diz o delegado Igor Romário de Paula.

Além disso, a Mossack Fonseca teve "papel de destaque no esquema criminoso que vitimou a Petrobras", uma vez que era usada por investigados para abrir empresas offshore, "as quais teriam recebido e movimentado valores oriundos de corrupção", segundo a investigação.

A Polícia Federal e o MPF chegaram a pedir a prisão dos envolvidos, mas Moro negou e converteu os pedidos em mandados de condução coercitiva, quando o investigado é levado para depor. Eles também foram proibidos de sair do país.

Ao todo, sete representantes do banco foram alvos dos mandados. Cinco são apontados como uma espécie de "gerentes" da instituição, pela sua relevância no esquema. São eles Edson Fanton, Celina Daiub Pirondi, Elizabeth Costa Lima, Edsel Okuhara e Carla Fabiana di Giuseppe. Já Marilene Alves Ferreira e Isidora Maria Solano Carmona são apontadas como funcionárias com papel de menor relevância no esquema.

Fanton, apontado como principal mentor da atuação do banco no Brasil, é também parente do delegado da PF Mário Renato Castanheira Fanton, que acusou delegados da Lava-Jato de terem instalado um grampo ilegal na cela do doleiro Alberto Youssef.

Para a PF, não há indícios de que o delegado tenha envolvimento com as irregularidades praticadas por Edson Fanton nem que isso tenha servido como motivação para as denúncias contra os colegas.

* Especial para o Valor