Correio braziliense, n. 19389, 26/06/2016. Política, p. 2

A ÚLTIMA CARTADA DE DILMA

CRISE NA REPÚBLICA » Diante de uma articulação cada vez mais fraca no Senado para reverter o processo de impeachment, a presidente afastada se reúne amanhã com aliados e juristas para formular proposta de antecipação das eleições
Por: JOÃO VALADARES

JOÃO VALADARES

 

Com a articulação política tímida no Senado para tentar reverter os votos pró-impeachment, os efeitos da Operação Custo Brasil, que prendeu o ex-ministro Paulo Bernardo, e ainda o mergulho estratégico do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, os aliados da presidente afastada Dilma Rousseff tentam a última cartada para retomar o poder. Amanhã, às 19h, reunião no Palácio da Alvorada com lideranças políticas ligadas à petista e grupo de juristas pretende amarrar juridicamente proposta de novas eleições para ser encampada por Dilma caso ela retorne à Presidência da República. Os 10 senadores da bancada do PT no Senado fecharam questão e apoiam integralmente a convocação de um plebiscito para a população brasileira decidir em relação à realização de eleição presidencial neste ano.

O objetivo do encontro é conceber um formato com amparo constitucional para chamamento de eleições e apresentá-lo posteriormente a um grupo de 13 a 15 senadores que, na avaliação dos petistas, poderiam mudar o voto e apoiar o retorno de Dilma. O Correio apurou com fontes petistas que a articulação política no Senado está praticamente parada. Os obstáculos enfrentados, avaliam os aliados de Dilma, são bem maiores do que o imaginado. A primeira dificuldade apontada é que o presidente interino Michel Temer tem a caneta na mão. Foi assim que o peemedebista deu um passo para assegurar o voto do senador Romário (PSB-RJ) a favor do impeachment. Temer, na segunda-feira, trocou o titular da Secretaria Especial dos Direitos das Pessoas com Deficiência. Ele nomeou para o cargo Roseane Cavalcante Freitas, indicada pelo político carioca.

As pesquisas de opinião divulgadas até o momento foram consideradas ruins pelos petistas. Apesar de grande parte das pessoas rejeitar o governo provisório, a população indica que não quer o retorno de Dilma. O outro obstáculo é a própria divisão do partido em relação ao chamamento de novas eleições. Parlamentares do PT afirmam que até a presidente está perdida em relação a este assunto. Reclamam que, até agora, faltando aproximadamente um mês e meio para a definição do impeachment no Senado, não há uma proposta clara, definida, e com amparo constitucional, para apresentar e tentar “virar” os votos.

A avaliação é de que o ex-presidente Lula saiu de cena para se preservar. Ele tem se limitado a fazer reuniões em seu instituto, em São Paulo, para analisar a conjuntura. Pessoas próximas ao político alegam que a votação do impeachment na Câmara, com Lula “dando a cara para bater” e atuando fortemente no “varejo”, trouxe um desgaste muito grande para ele, sobretudo, por causa das traições identificadas. O mergulho de Lula seria uma maneira de tentar preservar minimamente seu capital político, que saiu bastante desgastado após derrota na Câmara. Agora, o petista estaria disposto a só entrar em cena para empenhar a palavra para este grupo de senadores de que a presidente Dilma realmente convocaria o plebiscito em caso de retornar à Presidência da República.

A ideia dos aliados de Dilma é apresentar a proposta aos senadores Cristovam Buarque (PPS-DF), Romário (PSB-RJ), Acir Gurgaz (PDT-RO), Benedito de Lira (PP-AL), Roberto Rocha (PSB-MA), Antônio Carlos Valadares (PSB-SE), Reguffe (sem partido-DF), Marcelo Crivela (PRB-RJ), Edison Lobão (PMDB-MA), João Alberto Souza (PMDB-MA), Jáder Barbalho (PMDB-PA), Lasier Martins (PDT-RS) e Pedro Chaves (PSC-MS), que assumiu o mandato no lugar do senador cassado Delcídio do Amaral.

O presidente do PT, Rui Falcão, é o mais resistente à ideia de um plebiscito. Em uma reunião de coordenação política, o presidente do PDT, Carlos Lupi, chegou a discutir com ele. Falcão tem sofrido críticas de correligionários por prender a legenda à última resolução votada: nenhum direito a menos. A avaliação de grande parte dos petistas é de que a presidente Dilma, sem apoio do Congresso, não reúne mais nenhuma condição para voltar a governar o país.

 

Custo Brasil

A situação que era complicada, ficou ainda mais difícil após a Operação Custo Brasil, que prendeu o ex-ministro Paulo Bernardo e atingiu, por tabela, sua esposa, a senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR). A parlamentar é uma das mais ativas defensoras da presidente Dilma na Comissão Especial de Impeachment, instalada no Senado Federal. Os efeitos da investigação podem sepultar a posibilidade de a presidente afastada se defender pessoalmente na Casa, no dia 5 de julho.

As chances diminuíram bastante em razão de Gleisi ser muito ligada a Dilma. “A prisão de ontem tira o debate da corrupção das estatais e joga no primeiro escalão de Dilma”, lamentou um integrante da bancada de senadores. Além disso, ela acontece em um momento em que, nas palavras de um filiado da legenda, o PT “começava a tomar ar na batalha contra o governo interino. Agora, voltamos para as cordas”. Em público, contudo, seja por meio de nota oficial ou em discursos, os petistas mantêm o tom elevado das críticas e ataques.

Na avaliação do advogado da presidente Dilma Rousseff e ex-advogado-geral da União, José Eduardo Cardozo, a operação não interfere na defesa da presidente. “É evidente que os fatos que estão sendo objeto desta investigação não têm nada a ver com os fatos discutidos na comissão, absolutamente nada a ver”, disse. Ele afirmou ainda que a petista voltará ao colegiado. “A senadora Gleisi é uma senadora combativa, competente, séria, e acho que vai continuar exercendo o seu papel”, completou.

 

12 de maio

Dia em que a presidente foi afastada do cargo