Correio braziliense, n. 19390, 27/06/2016. Brasil, p. 6

BRASÍLIA DISCUTE FUTURO DA ÁGUA

MEIO AMBIENTE » Especialistas de diversos países se encontram hoje e amanhã na capital para dar início à preparação do Fórum Mundial da Água, que ocorre em março de 2018, no Distrito Federal

 

Em meio a uma das maiores crises de escassez hídrica já vividas pelo país, Brasília se prepara para receber, em 2018, a oitava edição do Fórum Mundial da Água, que deverá reunir cerca de 30 mil representantes de mais de cem países para discutir o futuro do uso da água e promover a maior conscientização coletiva a respeito de conteúdos relacionados. Com o tema Compartilhando Água, o fórum ocorrerá pela primeira vez no hemisfério Sul.

O primeiro evento de preparação do fórum aberto ao público previamente inscrito teve início ontem à noite, no Ministério de Relações Exteriores, e continua hoje e amanhã, no Centro de Convenções Ulisses Guimarães, reunindo mais de 500 pessoas. Na cerimônia de abertura, o governador do Distrito Federal, Rodrigo Rollemberg (PSB), falou da importância do debate mundialmente. “Temos a convicção de que esse é um tema estratégico para a humanidade. Nós temos os alertas científicos confirmando que as mudanças climáticas trarão eventos climáticos cada vez mais frequentes e severos, com consequências muito grandes na vida das pessoas”, comentou.

Criado em 1996 pelo Conselho Mundial da Água, o fórum é uma oportunidade de discussão em nível mundial e uma contribuição para estabelecer compromissos políticos e incentivar ações em todos os setores da sociedade. O evento recebe empresas públicas e privadas, entidades empresariais, universidades, centros de pesquisa, representantes de governos locais, estaduais e nacionais, legisladores, organismos nacionais e internacionais, membros de comitês de bacia hidrográfica, ONGs e demais organizações da sociedade civil.

Para Rollemberg, o grande desafio é descobrir como o Brasil pode aproveitar o tema para dar um salto de qualidade tanto do ponto de vista do fortalecimento da governança da água, quanto da implementação efetiva da legislação e da questão da sustentabilidade. “Nós estamos vendo que os eventos extremos têm trazido enormes consequências, seja pela falta d’água, estamos vivendo períodos de seca nunca vistos antes no Nordeste e em outras regiões, seja pelas enxurradas e chuvas torrenciais que trazem prejuízos enormes.”

O fórum será estruturado em quatro processos principais: temático, que fornece a base técnica para discussões sobre o tema água em diversas vertentes, tais como água e energia, economia, alimentos, cidades e ecossistemas; político, que garante o debate entre autoridades governamentais e parlamentares; regional, que discute as perspectivas sobre água nos diferentes continentes do mundo; e pelo grupo focal de sustentabilidade, que será um grupo transversal sobre perspectivas do uso sustentável da água. O evento é o maior encontro global sobre a água. Um dos principais objetivos é fomentar o debate, fornecendo uma plataforma para que todos os públicos estratégicos se engajem e catalisem ideias para o gerenciamento dos recursos hídricos.

Paralelamente, o Fórum Cidadão debaterá as responsabilidades conjuntas sobre água. Concomitantemente, acontecerá uma feira demonstrativa de projetos e de divulgação de boas práticas, e uma exposição, aberta a empresas e instituições ligadas ao desenvolvimento tecnológico interessadas em divulgar ideias, contribuições e inovações nos temas relacionados à água. A Agência Reguladora de Águas, Energia e Saneamento Básico do Distrito Federal (Adasa) foi uma das principais protagonistas na formulação e na defesa da proposta que trouxe o 8º Fórum Mundial da Água para Brasília. A Adasa e o Governo do Distrito Federal, em conjunto com órgãos do governo federal, como o Ministério do Meio Ambiente e com a Agência Nacional de Águas (ANA), além de parceiros da iniciativa privada, estão à frente da realização do evento.

Hoje e amanhã, os participantes debaterão os temas fixos propostos pelo Conselho Mundial da Água e poderão sugerir novos temas e plataformas para o evento de 2018. Estarão presentes na abertura, na manhã desta segunda-feira, o presidente do Conselho Mundial da Água, Benedito Braga; o ministro da Integração Nacional, Helder Barbalho; o governador Rodrigo Rollemberg; e o diretor-presidente da Adasa, Paulo Salles; além dos demais representantes que compõem o Conselho Mundial da Água e sua estrutura organizacional.

O evento desta semana, chamado Kick off Meeting, tem como objetivo dar início às definições de atividades do fórum, apresentar os resultados do 7º fórum, ocorrido na Coreia do Sul, em 2015; apresentar propostas preliminares sobre os temas a serem abordados no 8º fórum; promover discussões sobre os temas propostos; e coletar opiniões e sugestões para formular a primeira versão da programação do fórum. As discussões deverão ser condensadas em um documento a ser divulgado ao final do encontro, que já tem o nome de Estrada para Brasília.

De acordo com o diretor presidente da Adasa, Paulo Salles, o fórum tem crescido em importância política. “Em sua primeira edição, em 1997, participaram 500 pessoas. Em 2015, a sétima edição do evento, na Coreia, teve público de 40 mil pessoas”, conta. Na avaliação dele, uma das maiores missões do evento em Brasília é “colocar a questão da água no topo da agenda política do país”.

 

Três perguntas para

Paulo Salles, diretor presidente da Adasa

 

Nossa relação com a água precisa mudar?

As mudanças climáticas estão aí. O estado de São Paulo ficou sem água há pouco tempo. A geração de energia no país caiu em função da escassez. Não se pode ignorar essa realidade. Precisamos discutir a água como um elemento importante na formulação de políticas públicas. Todos os habitantes do planeta precisam se habituar com uma nova realidade. Especificamente no Distrito Federal, temos que começar a olhar para isso com cuidado, com muita atenção. Tudo isso deve servir de alerta. É importante que tenhamos em mente que a água é um recurso finito, ela acaba.

 

A situação é confortável em Brasília?

Temos uma situação privilegiada em alguns aspectos. Estamos num lugar de nascentes. Começam aqui as principais bacias hidrográficas do Brasil. Mas isso tem um custo: estamos no Planalto Central, onde há pouca oferta de água. Não temos rios caudalosos. Nossos rios são de pequeno porte, assim como não há grande oferta de água subterrânea. Há, digamos, uma condição restrita de disponibilidade.

 

A oferta de água é suficiente no Distrito Federal?

Tem sido suficiente. Nos últimos anos, na época da seca, chegávamos a um empate entre a “produção” de água e o consumo existente. No ano passado, tivemos chuvas abaixo da média, o que começa a provocar problemas. No Rio Preto, que tem afluentes no DF, a situação está complicada, faltando água para os agricultores. A produção deles está ameaçada. Nossos reservatórios não estão em crise. Nossa expectativa é de que haverá água suficiente para abastecer a população. Mas a parte que depende de água superficial daquela bacia está sofrendo.