Deputado usava esquema contra inimigos, diz delator

Aguirre Talento e Márcio Falcão

10/07/2016 

 

 

Ex-vice da Caixa disse que Cunha o orientava a barrar projetos de adversários

Apelidado por aliados de "meu malvado favorito", o deputado afastado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) usou um esquema de corrupção na Caixa Econômica para prejudicar seus adversários, segundo a delação premiada de Fábio Cleto, ex-vice-presidente da instituição.

Dentre os alvos do peemedebista estavam o governo de Dilma Rousseff e o empresário Benjamin Steinbruch, da CSN (Companhia Siderúrgica Nacional), segundo informações da delação obtidas pela Folha.

Cleto foi indicado pelo grupo de Cunha para ocupar o cargo na Caixa e também fez parte do conselho do Fundo de Investimento do FGTS, opinando na liberação de recursos para empresas.

Além de usar a influência para cobrar propina das empresas em troca da liberação dos recursos, Cleto disse que atrapalhava a aprovação de projetos, a pedido de Cunha.

Segundo o delator, em outubro de 2014, a Companhia Siderúrgica Nacional pleiteava financiamento do FI-FGTS, via emissão de debêntures, no valor de R$ 1,2 milhão para a ampliação do Porto de Sepetiba (RJ).

Cleto afirmou que avisou a Cunha sobre a proposta, que tinha tramitação sigilosa. O deputado, no entanto, alertou ao afilhado que tinha um relacionamento muito ruim com Steinbruch e que tinha interesse na rejeição da operação. Cleto afirmou que, por causa do pedido, pediu vista da operação e atrasou a análise em mais de um ano.

Pelas regras da Caixa, não há prazo para a liberação de um projeto que teve pedido de vista, mas era praxe que a questão fosse devolvida para a diretoria na reunião mensal seguinte.

Em meio ao avanço da Operação Lava Jato sobre Cunha, Cleto deixou a Caixa em dezembro de 2015 sem devolver o processo.

Ele disse que não tomou conhecimento de pagamento de propina nesse caso.

Adversário da presidente afastada, Cunha também teria bloqueado outra operação apenas para dificultar a vida do governo, segundo o relato do delator.

Em 2013, a Petrobras fez duas tentativas de obter, no total, R$ 3 bilhões do FI-FGTS, com emissão de debêntures. O primeiro projeto seria para a Petrobras Comperj e outro para a Petrobras UTE Baixada Fluminense.

Cleto também teria repassado informações sobre o caso para Cunha, ouvindo do peemedebista que o único intuito dos projetos era ajudar o governo. Por isso, então, ele lhe teria pedido que votasse contrariamente. O ex-vice-presidente da Caixa seguiu a orientação e os projetos acabaram rejeitados.

A PGR (Procuradoria-Geral da República) aponta que Cleto violou o sigilo funcional ao repassar as informações dos projetos para Cunha.

Cleto tinha acesso a esses dados porque recebia a pauta do que seria levado a votação com duas semanas de antecedência da reunião.

Em sua delação, mencionou pagamentos de propina por ao menos dez empresas em troca da liberação dos recursos do FI-FGTS. Cleto disse ter embolsado cerca de R$ 7,3 milhões do esquema e afirmou que também houve a participação de Cunha e do corretor de valores Lúcio Bolonha Funaro, preso preventivamente no dia 1º.

OUTRO LADO

Em nota, o deputado afastado Eduardo Cunha afirmou que nunca teve discussão sobre esses assuntos com o ex-vice-presidente da Caixa Fábio Cleto.

"Não sou desafeto do presidente da CSN. Ao contrário, tenho relações amistosas. Desminto ter tido qualquer discussão com relação a esses assuntos", disse.

O advogado de Funaro, Daniel Gerber, diz que seu cliente é inocente e nega as acusações feitas por Cleto.

O advogado de do ex-vice da Caixa, Adriano Salles Vanni, não quis comentar. 

 

 

Folha de S. Paulo, n. 31875, 10/07/2019. Poder, p. A5.