Valor econômico, v. 17, n. 4066, 10/08/2016. Política, p. A7

Temer atua para garantir impeachment

Por: Por Andrea Jubé
Por Andrea Jubé | De Brasília
 
 
Temer (com Otto Alencar ao fundo): interino faz afagos a ex-aliado de petista

 

No dia em que os senadores transformariam a presidente afastada Dilma Rousseff em ré, na etapa de pronúncia do processo de impeachment, o presidente interino Michel Temer conduziu uma solenidade no Palácio do Planalto tendo ao seu lado o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), em uma demonstração de força política. Ao longo do dia, Temer recebeu senadores e acompanhou a sessão plenária de seu gabinete no terceiro andar. O Planalto atuou, com discrição, para abreviar a sessão, pedindo aos líderes governistas que convencessem integrantes de suas bancadas a renunciar aos discursos, acelerando o processo.

Na solenidade de ontem, em que Michel Temer instituiu o programa de revitalização da bacia do Rio São Francisco - o "Novo Chico" -, chamou atenção o protagonismo do senador Otto Alencar (PSD-BA), que discursou por mais de dez minutos e deu o recado: avisou que marcaria aquela data em seu caderno, porque a partir dali, "tinha certeza" que o projeto de revitalização do rio começaria a sair do papel.

Alencar é aliado do ex-ministro da Casa Civil Jaques Wagner, que integra a equipe de Dilma no "bunker" do Palácio da Alvorada. Alencar foi vice-governador da Bahia, companheiro de chapa de Wagner. O petista o considera um voto certo contra o impeachment. Alencar, contudo, guarda uma mágoa de Dilma, que não deu ouvidos ao seu programa de recuperação do Rio São Francisco. O mesmo que foi elogiado por Temer na cerimônia promovida ontem pelo governo. Alencar não declarava seu voto, mas após a ofensiva de Temer, os petistas já não o contabilizavam com igual convicção.

Em seu discurso, Temer foi gentil com o senador baiano. "Não há transposição eficiente se não houver revitalização, isto foi algo que o nosso senador Otto Alencar conseguiu estabelecer como parâmetro para uma ação administrativa extraordinária", disse.

Além de Alencar, a cerimônia lotou o Salão Leste do Planalto com parlamentares do Nordeste. Durante o dia, Temer ainda recebeu em seu gabinete o líder do PMDB, senador Eunício Oliveira (CE), e a senadora Lúcia Vânia (PSB-GO). No Senado, lideranças da base aliada ao governo pediam aos senadores que retirassem suas inscrições para discursar, a fim de abreviar o término da sessão, que se arrastaria madrugada adentro.

O programa de revitalização lançado ontem pretende promover a recuperação do maior rio totalmente brasileiro e de seus afluentes. Conforme o decreto assinado por Temer, o governo assume o compromisso de dar andamento a obras de saneamento e sistemas de abastecimento, que vão beneficiar 217 municípios, sendo R$ 1,162 bilhão em investimentos entre 2016 e 2019.

"São medidas de curto e médio prazo, porém perenes, que necessitam ser feitas o quanto antes para que tenhamos a repercussão a tempo", justificou o ministro da Integração Nacional, Hélder Barbalho (PMDB). "Para não corrermos o risco futuro de ter-se gasto o volume de recursos com a transposição, e a mesma se torne ineficaz pela ausência de volume de água para a entrega aos municípios", completou.

O ministro do Meio Ambiente, Sarney Filho (PV), lembrou que desde 2001, na gestão Fernando Henrique Cardoso, tentou-se viabilizar ações para recuperar o rio, sem sucesso. "Eu era ministro na ocasião, mas nada foi implementado, nada", lamentou. Sarney Filho ressalvou que a solenidade realizada ontem "foi mera coincidência", sem "vínculo programado" com a votação no Senado. Como o projeto favorece milhares de municípios no Nordeste, deputados e senadores da região prestigiaram o evento. "O fato de acontecer aqui uma solenidade que diz respeito aos Estados do Nordeste, e os senadores virem é consequência lógica do assunto", minimizou.