Valor econômico, v. 17, n. 4071, 17/08/2016. Brasil, p. A3

Se Congresso não votar reformas, não haverá ajuste, alerta Mansueto

Secretário transfere para o legislativo responsabilidade por eventual fracasso da política fiscal

Por: Edna Simão e Cristiane Bonfanti

 

O secretário de Acompanhamento Econômico do Ministério da Fazenda, Mansueto Almeida, endureceu o discurso e jogou no colo do Congresso Nacional a responsabilidade por um eventual fracasso do ajuste fiscal, caso a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 241, que limita o crescimento dos gastos públicos, não seja aprovada. O governo federal vem sendo cobrado pelo mercado por rapidez na aprovação de medidas fiscais. Mas o presidente Michel Temer tem optado por negociar e buscar consensos.

"Se o Congresso não quiser aprovar nem a PEC do crescimento do gasto nem a reforma da Previdência, não terá ajuste fiscal. Sem ajuste fiscal, como ninguém pode me forçar a financiar o governo com juros baratos, vou cobrar juros caros para financiar o governo. Isso significa que a gente terá uma dívida crescendo mais rápido e uma volta da inflação", afirmou o secretário durante audiência pública promovida pela Comissão de Assuntos Econômicos (CAE).

Durante quatro horas, o secretário de Acompanhamento Econômico bateu várias vezes na tecla que o "ajuste fiscal por natureza é um ajuste político", jogando toda a responsabilidade para o Congresso Nacional.

Na avaliação de Mansueto, o ajuste nas contas públicas precisa ser feito por redução das despesas, pois não há disposição dentro do Congresso e da sociedade para aumento da carga tributária. O secretário observou, porém, que um ajuste pela despesa deve ser gradual e não pode ser concluído em um ou dois anos, como querem os agentes econômicos.

"Temos que estancar o tamanho da dívida e temos que transformar déficit primário em superávit. A velocidade desse ajuste é novamente um debate político", disse Mansueto. "Quem decide a velocidade do ajuste não é um técnico dentro do gabinete, mas sim os deputados e senadores", afirmou o secretário.

Apesar do tom forte do discurso de Mansueto, o presidente interino Michel Temer tem dado prioridade à negociação e, em algumas situações, como o caso da renegociação de dívidas dos Estados, fez concessões para garantir a aprovação do projeto de lei, o que não deve se repetir no debate da PEC dos gastos. A audiência no Senado foi um termômetro da batalha que o governo irá enfrentar para conseguir aprovar a PEC do gasto.

O secretário também rebateu críticas sobre a legitimidade da PEC proposta por um governo interino. Para Mansueto, a medida é legítima porque precisará do aval do Congresso Nacional para começar a valer.

O governo pretende aprovar a PEC, que no momento tramita na Câmara dos Deputados, neste ano para dar uma sinalização aos agentes financeiros de compromisso com o ajuste fiscal, mesmo com a fixação de déficit primário do governo central de R$ 170,5 bilhões para este ano e de R$ 139 bilhões para 2017.

Dentre os senadores presentes, os petistas criticaram a PEC do gasto, porque, segundo o senador Lindbergh Farias (PT-RJ), a proposta "rasga" a Constituição Federal de 1988 e estabelece uma "austeridade permanente" pelos próximos 20 anos, comprometendo o crescimento. "O que os senhores estão propondo é um desastre social para os mais pobres", disse Farias. A senadora Fátima Bezerra (PT-RN) levantou dúvidas sobre o impacto do teto do gasto para a educação.

O cumprimento do teto de gasto, caso seja aprovado pelo Congresso Nacional, depende da aprovação da reforma da Previdência Social. "Se o Congresso decidir que não quer fazer reforma da Previdência, isso é legítimo. Mas a gente vai ter de aumentar a carta tributária em dez pontos percentuais do PIB para o déficit da Previdência não aumentar. E não terá espaço para crescer gasto em nada mais", disse Mansueto. Ele defendeu ainda uma discussão sobre a estrutura de reajuste dos salários dos servidores públicos.

O professor do Instituto de Economia da Universidade de Campinas (Unicamp), Pedro Linhares Rossi, disse aos parlamentares que a PEC " não passaria no pleito eleitoral. Minha opinião é que o parlamento tem que rejeitar essa proposta."