Valor econômico, v. 17 , n. 4062, 04/08/2016. Brasil, p. A5

Mercosul se reúne em busca de saída para crise

Encontro em Montevidéu não terá representante da Venezuela, que pode até ser suspensa do bloco

Por: Fabio Murakawa, Daniel Rittner e Carolina Oms

 

Diplomatas dos países do Mercosul se reúnem hoje em Montevidéu para tentar encontrar uma saída para a crise em torno do comando do bloco. Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai confirmaram presença. Mas a Venezuela disse ontem, segundo fontes, que não enviará representante. Caracas alega que a reunião não foi convocada pela presidência pro-tempore do bloco - que o país governado por Nicolás Maduro considera estar ocupando neste momento.

O principal objetivo do encontro é tirar o Mercosul do impasse em que se encontra desde que Brasil e Paraguai começaram a trabalhar para que a Venezuela não assumisse a presidência rotativa.

Mas, a depender da flexibilidade uruguaia, pode já começar a ser gestada uma suspensão dos venezuelanos. A recente escalada na retórica entre a chancelaria em Caracas e o ministro das Relações Exteriores, José Serra, contribui para reforçar essa impressão.

A suspensão se daria ao evocar a cláusula democrática do Mercosul, ou Protocolo de Ushuaia. O Paraguai estava suspenso do bloco por essa mesma cláusula quando a Venezuela foi admitida, em 2012, após o impeachment relâmpago do presidente Fernando Lugo. Hoje, ironicamente, é Assunção que fala abertamente em aplicar aos venezuelanos a mesma punição.

O encontro de hoje será uma reunião de diplomatas e técnicos. Duas possibilidades são cogitadas. A primeira, é que a Comissão de Representantes Permanentes do Mercosul assuma as funções burocráticas até dezembro, quando se encerraria o mandato venezuelano. A outra é que a Argentina, que se ofereceu, assuma a presidência, pulando a vez da Venezuela.

Pela rotação em ordem alfabética, seria a vez dos venezuelanos assumirem a função. Mas Caracas ainda não incorporou quase metade do acervo normativo do Mercosul, perto do fim de um prazo de quatro anos para fazê-lo, neste mês. Além disso, brasileiros e paraguaios vêm questionando as credenciais democráticas do país.

Anteontem, Serra disse que "a Venezuela não é uma democracia" porque há "presos políticos" no país - em referência aos opositores detidos durante manifestações contra o governo, sobretudo em 2014. E afirmou que Maduro não tem condições de comandar o Mercosul neste momento.

"A Venezuela não cumpriu as exigências existentes, os pré-requisitos para integrar o Mercosul. Houve um equívoco no passado nesta matéria", disse Serra, ao justificar sua posição. "Segundo, porque, evidentemente, alguém que não consegue governar o seu país não vai poder levar o Mercosul para um bom caminho."

O ministro respondia a uma nota do mesmo dia em que a chancelaria venezuelana apontara um complô de Argentina, Brasil e Paraguai para impedir que o país assuma a presidência do bloco. No documento, Caracas compara os três países à Tríplice Aliança formada por brasileiros, uruguaios e argentinos na Guerra do Paraguai (1854-1870), que dizimou o país, hoje rival dos venezuelanos. Disse ainda que está em atualmente curso na região uma "nova Operação Condor" - aliança entre ditaduras militares sul-americanas para caçar militantes de esquerda nas décadas de 1960 e 1970.