Correio braziliense, n. 19365, 02/06/2016. Artigos, p. 11

MOZART NEVES RAMOS - Jovens merecem uma boa educação

Apesar de ter opinião formada, não usarei esse espaço para opinar se o governo atual é golpista ou não, se o processo de impeachment é legítimo ou não, se a proposta do ministro Henrique Meirelles é um retrocesso, ou não, ao propor o término da vinculação dos recursos à educação. O fato é que o país está diante de uma situação econômica dramática, com um rombo de R$ 170 bilhões, e se não colocar a casa em ordem e resgatar a confiança dos investidores, o país afunda de vez. Fazer o país voltar a crescer de forma sustentável deve ser a maior das prioridades, que exigirá um pacto de nação, e todos deveriam dar sua contribuição nessa hora.

É preciso, apesar de muito difícil — e não sou ingênuo —, deixar a crise política separada da crise econômica. Maus brasileiros usurparam e lesaram o país com níveis elevados de corrupção e de roubo como jamais vistos na história deste país. E nesse mar de lama, que precisa ser rigorosamente apurado pelo Judiciário, para salvaguardar o futuro do Brasil, estão as nossas crianças e os nossos jovens, com quem realmente me preocupo. A melhor maneira de ajudá-los é não deixando de lhes oferecer boa educação. Esse é o caminho mais seguro para proteger o futuro do Brasil.

Por isso vou me dedicar, neste artigo, a propor ideias ao ministro da Educação, Mendonça Filho, que acredito possam ser efetivadas, ainda que num cenário muito adverso. Tive o privilégio de atuar como secretário de Educação e Cultura no governo Jarbas Vasconcelos e Mendonça Filho (2003-2006), na considerada cota técnica. Conheci assim a grande capacidade de trabalho de Mendonça Filho, que, se tiver condições de formar boa equipe, poderá fazer algo pelo país no campo da educação. Os primeiros nomes apontam nessa direção, como Maria Helena Castro, na Secretaria Executiva; Maurício Romão, na Secretaria de Normatização; Maria Inês Fini, no Inep; e Rossieli Soares, na Secretaria de Educação Básica.

Costumo dizer que o MEC virou um cargueiro com programas e atribuições de grande robustez, como Enem, Prouni, Fies e Pronatec, entre outros, tomando praticamente a agenda do ministério. No curto prazo, precisamos colocar em prática novas estratégias para dar mais foco à questão da qualidade e da gestão da educação, aproveitando o que de positivo foi criado nos últimos 15 anos. Não vamos aqui nos enganar pensando que tudo o que foi realizado anteriormente foi errado e malfeito, até porque foram criados bons programas, como os citados acima, que precisam de aperfeiçoamento, e cujo real impacto precisa ser mais bem avaliado. Não podemos também perder de vista o cumprimento das metas do Plano Nacional de Educação (PNE). Não se trata de um plano de governo, mas de sociedade. Assim, precisamos efetivá-lo, e podemos fazer isso incorporando estratégias inovadoras para alcançar algumas de suas metas. O PNE não é só financiamento, mas pode ser uma oportunidade para gastar melhor o dinheiro público, com maior eficiência, eficácia e efetividade.

A Base Nacional Comum Curricular (BNCC), prevista no próprio PNE, é uma dessas oportunidades, na qual o país definirá o que precisa ser aprendido por nossas crianças e nossos jovens em cada etapa da educação básica, da educação infantil ao ensino médio, impactando diretamente os processos de formação de professor e de avaliação da aprendizagem. A BNCC ainda está em processo de aperfeiçoamento e vem mobilizando o Brasil.

Um fato que o MEC não pode ignorar, talvez por ser um cargueiro, é que muito do que hoje está acontecendo no campo da inovação e da criação na educação ocorre no ambiente da sociedade civil organizada, em parceria com as redes de ensino e as secretarias de Educação, sem que o MEC esteja efetivamente contribuindo para alavancar tais iniciativas e compartilhá-las com um número maior de secretarias e redes. O MEC poderia criar pontes estratégicas com a sociedade civil para melhorar os indicadores da educação no país, de forma organizada e transparente.

Esse mar de lama pode ser uma oportunidade para o país se reerguer por um caminho mais sólido, no qual a educação pode ser a melhor das apostas. Por uma educação em que crianças e jovens de fato aprendam não só aquilo que é importante para a vida atual, mas para a futura, tornando-se pessoas críticas e éticas.

 

 

MOZART NEVES RAMOS

Diretor do Instituto Ayrton Senna, ex-reitor da Universidade Federal de Pernambuco e ex-secretário de Educação de Pernambuco