Título: Subsídios, a bomba de tempo
Autor: Sabadini, Tatiana
Fonte: Correio Braziliense, 25/10/2011, Mundo, p. 18

Cristina Kirchner iniciará o segundo mandato, em dezembro, fortalecida pela vitórias esmagadora na eleição de domingo, mas deverá enfrentar o impacto da crise mundial no crescimento do país e nos gastos sociais. "Os pilares do modelo econômico estão em crise. A Argentina tem muitos sinais amarelos na economia", avalia Alberto Fernández, que foi chefe de Gabinete entre 2003 e 2008, desde o governo do marido e antecessor da presidente, Néstor Kirchner.

O "modelo" kirchnerista, com elevado nível de subsídios, fez o consumo interno subir 4% ao ano, o que alimentou um crescimento anual médio de 8% desde 2003 — com exceção de 2009 — e permitiu baixar a taxa de desemprego em 7%. A outra face da moeda é o incremento anual de 35% nos gastos públicos e uma inflação de 25%, segundo estimativas privadas. "É uma bola de neve: os subsídios chegaram a 75 bilhões de pesos (ou US$ 17 bilhões), o que equivale a 4% do PIB", ressaltou Martín Lousteau, ex-ministro da Economia da atual presidente.

Soledad Pérez Duhalde, da consultora Abeceb, afirma que "é necessário algum ajuste, porque é insustentável o nível atual de subsídios, principalmente no que se refere às tarifas residenciais do setor energético". Para a economista, a redução das subvenções para o transporte e o aumento das taxas de serviços públicos "será feita de forma gradual, já que o impacto será grande". Sergio Berensztein, diretor da consultora Poliarquía, arrisca que o governo terá de negociar um pacto com trabalhadores e empresários, "para moderar expectativas inflacionárias e alargar os horizontes".

Outra pendência é o retorno ao mercado internacional de capitais, do qual o país foi isolado após a moratória de US$ 100 bilhões, em 2001 — o maior da história. Desde então, a Argentina liquidou suas obrigações externas com reservas do Banco Central, que mantém atualmente mais de US$ 47 bilhões. Sem dívidas com o Fundo Monetário Internacional (FMI), depois de pagar US$ 9,81 bilhões em 2006, o governo ainda tem um passivo de US$ 8 bilhões com o Clube de Paris, que reúne governos credores.

"Há um problema político, porque uma renegociação com essa entidade parece exigir a presença do FMI, organização com a qual a Argentina não quer negociar", pondera Fausto Spotorno, da consultoria Orlando Ferreres. O governo de Cristina deverá pagar em dezembro mais US$ 2,7 bilhões. No primeiro ano do segundo mandato, a necessidade de financiamento externo não excede US$ 4 bilhões.