Valor econômico, v. 17 , n. 4078, 26/08/2016. Política, p. A6

Lula viaja a Brasília e avalia ir ao Senado para ouvir Dilma

Por: Vandson Lima / André Ramalho

 

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva avalia ir ao Senado na segunda-feira para acompanhar o depoimento de Dilma Rousseff. Lula deve chegar no domingo em Brasília, para conversar com parlamentares que não divulgaram voto. A conveniência da ida de Lula à preocupa petistas e aliados. Primeiro, por uma questão de logística: levar Lula ao Congresso é uma operação com grande potencial de causar um enorme tumulto.

Outra razão é que o depoimento no julgamento do impeachment deverá ser o último grande momento na vida pública de Dilma. A ida de Lula tomaria as atenções e ofuscaria a participação da presidente afastada.

O efeito sobre os senadores é incalculável: os que têm simpatia por Lula, mas votarão pelo impeachment, poderiam se sentir constrangidos ou pressionados, o que causaria danos para recomposições futuras - Lula é virtual candidato à sucessão do Palácio do Planalto em 2018.

Também se avalia a participação do ex-presidente em uma manifestação de movimentos sociais, que sairão do Palácio da Alvorada junto com Dilma, quando ela se encaminhar ao Senado, e seguirá até a Esplanada dos Ministérios. Há o temor de que, se Lula acompanhar o grupo, possa haver confronto com manifestantes de movimentos contrários ao PT, que também deverão estar nas ruas de Brasília neste dia.

Em Niterói, Lula disse ontem que o julgamento do processo de impeachment, no Senado, marca o início da "semana da vergonha nacional". Em ato com militantes, na porta do estaleiro Mauá, o ex-presidente saiu em defesa de Dilma, ao dizer que o único crime cometido por ela "foi ser honesta".

Para uma plateia de sindicalistas, militantes e trabalhadores da indústria naval, Lula citou nominalmente as "deslealdades" de Marcelo Crivella (PRB), candidato à prefeito no Rio de Janeiro; do prefeito Eduardo Paes e do deputado federal Marco Antônio Cabral, ambos do PMDB.

"Estranho um companheiro como o [Marcelo] Crivella, que eu apoiei para senador em 2014, um companheiro que fala tanto em nome de Deus. Não pode cometer essa deslealdade com a presidente Dilma, de quem ele foi ministro até outro dia", disse Lula.

Lula foi questionado por jornalistas sobre sua candidatura em 2018, mas preferiu não ser assertivo. "Vamos ver", respondeu. O ex-presidente afirmou que o atual governo interino tenta, no processo de impeachment, descobrir "um jeito de chegar ao poder sem precisar disputar voto popular". E criticou o "complexo de vira-lata" que marca a política do governo Temer. "Não querem que Brasil seja protagonista, querem que o Brasil seja um país de segunda categoria, dizendo 'amém' aos Estados Unidos e à Europa", disse.

O ex-presidente criticou a intenção do governo de vender a BR Distribuidora e disse que o que está em jogo neste momento é uma tentativa de "desmontar o direito desse país ser grande" e de a Petrobras "ser a empresa de petróleo mais importante do mundo".

Com a voz nitidamente desgastada, Lula pediu por diversas vezes compreensão à plateia, brincou que já não pode mais tomar um gole "das outras coisas" para "dar energia à garganta", mas adotou uma postura de desafio na disputa política que cerca o processo de impeachment. "Enquanto eu tiver essa voz rouca e essas duas pernas funcionando, o Lulinha paz e amor desaparece e volta o Lula para brigar e defender o interesse desse povo. Se não tiver mais voz, falarei pela voz de vocês, se não tiver mais pernas, caminharei pela de vocês. A natureza pode acabar com a vida de qualquer um de nós, mas nossas ideias não", discursou.

Ainda durante seu discurso, Lula questionou o andamento da Lava-Jato, ao falar sobre o impacto da operação sobre o desemprego no país. Disse que não tem nada contra as investigações, mas que há muita gente "que pegou dinheiro, contou meia dúzia de mentiras na delação premiada e está em liberdade fumando charuto cubano" às custas do trabalhador brasileiro.

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