Valor econômico, v. 17, n. 4078, 26/08/2016. Política, p. A9

Novo formato de propaganda tornará candidatos 'pop stars'

Por: Cristian Klein / Estevão Taiar

 

A propaganda eleitoral em rádio e TV começa nesta sexta-feira e atingirá os eleitores de forma diferente nas campanhas municipais. Os tradicionais blocos do horário eleitoral gratuito deixarão de ser as grandes estrelas. Foram encurtados de 30 minutos para 10 minutos, mas em compensação a quantidade de inserções durante a programação normal aumentou. Será a campanha dos "spots", como estas peças costumam ser chamadas no meio publicitário. "Em uma semana, todos os candidatos serão pop stars", afirma o cientista político e consultor Antonio Lavareda, que trabalhou nas campanhas que elegeram o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso em 1994 e 1998.

Considerada a veiculação em uma emissora de rádio e uma de TV, o volume de propaganda, no horário eleitoral, foi reduzido de 77 horas para 20 horas, uma queda de 256% para uma campanha que terá 35 e não mais 45 dias. Por outro lado, o ouvinte e o telespectador serão bombardeados pelos spots, cujo espaço na grade de programação cresceu 81%. Ocuparão 81,5 horas - antes eram 45 horas - dos intervalos comerciais de uma emissora de rádio e outra de TV. No geral, porém, somadas as inserções e o programa eleitoral, a propaganda para as disputas municipais terá um volume total 20% menor.

A eficiência dos spots, contudo, por pegarem o cidadão de surpresa, deve tornar a imagem dos políticos mais onipresente. Mesmo daqueles que têm pouco espaço em relação aos adversários. "Uma coisa é ter um minuto naquele blocão, outra é ter o mesmo minuto, dividido em duas inserções de 30 segundos, na grade das emissoras ", diz Lavareda.

Mesmo com apenas 10% do espaço de propaganda, um candidato terá sete minutos diários de inserções, ou 14 anúncios de 30 segundos. "É um tempo fantástico, imagine essa exposição simultânea numa Globo e nas outras emissoras, pois é em rede", afirma o cientista político.

Mauricio Moura, diretor do instituto Ideia Inteligência, concorda que o maior número de inserções ao longo do dia pode ajudar os candidatos menos conhecidos. "Esses spots podem igualar as diferenças de conhecimento que o público tem dos candidatos", diz. Outro ponto positivo, segundo ele, é que a mensagem mais curta aproximará eleitor e candidatos.

Lavareda destaca que nenhuma marca - "pode pegar todos os comerciais das empresas de telefonia, de cerveja, de banco" - compra espaço publicitário em rádio e TV equivalente ao que terão candidatos nestas eleições municipais.

Entre as capitais do país, o prefeito de Teresina, Firmino Filho (PSDB), é o que contará com o maior tempo. Ocupará pouco mais da metade do blocos (cinco minutos e seis segundos), exibidos duas vezes por dia de segunda a sábado, e terá uma artilharia de 1.502 inserções de 30 segundos para convencer o eleitor a reelegê-lo - o que dá 12 horas e meia de propaganda em um par de emissoras de rádio e TV.

Neste ano, os candidatos a prefeito deixam de ter o monopólio das inserções nas eleições municipais - os que querem ser vereadores também disporão de anúncios, numa proporção de 60% a 40%. Ainda assim, o espaço para as candidaturas majoritárias aumentou, pois em vez de 30 minutos diários de spots, os concorrentes às prefeituras terão 42 minutos - os candidatos a vereador dividirão os outros 28 minutos, do total de 70 minutos diários de propaganda em inserções.

Lavareda critica esse "latifúndio" nas eleições municipais. "É uma das insanidades do nosso sistema. O candidato a prefeito continua tendo mais exposição do que qualquer outro candidato majoritário, seja senador, governador ou presidente. Não há motivo para que ele apareça mais", diz. A única razão é o fato de as eleições municipais serem disputadas de forma descasada.

No entanto, Lavareda considera positiva a redução do tempo e, logo da importância, do tradicional horário eleitoral gratuito. Em sua opinião, a campanha brasileira ficará mais parecida com as de outros países. "Aquele tijolaço era uma irracionalidade. Imagine se todas as empresas de telefonia ou cerveja resolvessem concentrar seus comerciais em um só bloco. Isso não existe", critica.

A mudança, prevê o cientista político, terá impacto no jeito de ser fazer campanha no Brasil, que ficará cada vez mais publicitária e menos jornalística. "O papel da publicidade vai aumentar bastante, e se reduzir aquele jornalismo televisivo, no qual se tinha que fazer uma espécie de "Globo Repórter" a cada dia", compara. A era dos grandes marqueteiros, com formação jornalística, como João Santana, que fez as campanhas presidenciais do PT em 2006, 2010 e 2014, tende a entrar em declínio, diz Lavareda.

Para Mauricio Moura, no entanto, a publicidade pode aproximar candidatos desconhecidos do público, mas isso não é a mesma coisa que promover um debate com profundidade. "Em 30 segundos, a capacidade que alguém tem de apresentar as suas propostas de maneira mais robusta é muito menor", diz.

Wagner Bezerra, publicitário e mestre em Mídia e Cotidiano pela Universidade Federal Fluminense (UFF), destaca que a diminuição dos custos de campanha, um dos objetivos das novas regras, não deve se tornar realidade. "Essa nova regra aumenta o custo de produção, mesmo com a diminuição do tempo", afirma. "O volume de produção é muito grande", afirma.

No levantamento feito pelo Valor, candidatos do Nordeste concentram os maiores tempos de propaganda. Das seis capitais que têm candidatos com maior espaço, cinco são da região: Teresina, João Pessoa, Recife, Natal e Salvador. Pelo critério partidário, PMDB, com nove candidatos, e PSDB, com sete, são as legendas que têm o maior número de concorrentes que dispõem do maior tempo de rádio e TV em suas capitais.

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Lei eleitoral abre campo para empresas

Por: Carmen Munari

 

O fim do financiamento de campanhas eleitorais por pessoas jurídicas ampliou o mercado para empresas e instituições que desenvolveram plataformas de internet para captar contribuições financeiras dos eleitores. Neste início de campanha, os empreendedores estão enfrentando a negativa de operadoras de transação por cartões de crédito em atuar em campanhas.

Felipe Leite, diretor da Guest Sistemas, de São Paulo, afirma que a Cielo e a Getnet se recusaram a atuar no esquema eleitoral, o que retardou a estreia do plataforma da empresa, que deve fechar com a PagSeguro. Em nota, a Cielo informou que "decidiu que não participará do ciclo eleitoral de 2016".

Na Guest, o sistema custa R$ 599 para vereadores e R$ 1,499 mil para prefeitos e partidos. O executivo explica que candidatos a prefeito podem arrecadar mais que vereadores, daí o preço maior. Estão embutidos nos preços o armazenamento de dados e a prestação de contas até 31 de dezembro, o que inclui os nomes dos doadores, as identificações dos computadores e os valores doados. A empresa não é novata. Está em sua quarta eleição. Em 2014, forneceu a plataforma para 57 candidatos de 16 partidos entre eles Zé Maria (PSTU), que concorria à Presidência.

Com foco no Nordeste, a empresa "Campanha Democrática", com sede em Natal, prevê chegar a 200 ou 400 clientes nesta eleição com preços que variam entre R$ 1,5 mil (apenas a arrecadação) e R$ 2,5 mil (site, blog e arrecadação), sem diferenciação entre vereador e prefeito.

Um dos idealizadores da instituição da Ficha Limpa, o advogado Márlon Reis dá sua chancela à arrecadação por sites e acredita que o sistema ajuda a afastar possíveis atos de corrupção - desde que não haja recursos vindos da iniciativa privada, o eleitor é bem-vindo. "Mesmo com crise e falta de credibilidade nos políticos, acreditamos em ferramenta estratégica para incluir os eleitores, facilitando os meios para a participação cívica", disse.

Reis integra o Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE), que reúne 60 organizações da sociedade civil. A entidade também desenvolveu uma plataforma para a captação por candidatos pela internet. Para que o produto, batizado de Voto Legal, não fosse classificado como doação empresarial aos candidatos, é vendido pelo preço simbólico de R$ 99. O software é livre, para baratear o sistema.

"A plataforma é para o eleitor não ficar só reclamando, mas assumir o protagonismo", afirmou Luciano Santos, advogado e diretor do MCCE, para quem a democracia tem um preço, "ninguém quer pagar o preço, mas para eleger um candidato precisa ter campanha. Está na mão do eleitor", afirma Santos.

As contribuições de cada eleitor têm um limite de doação de 10% dos rendimentos brutos obtidos no ano anterior à eleição.

Na disputa pela Prefeitura do Rio, Marcelo Freixo (Psol) é um dos poucos concorrentes que está a todo vapor na doação de recursos pela internet. O candidato já arrecadou pelo site "Eu financio Freixo" R$ 303.172,00 por meio de 3.524 pessoas. Atingiu 75% da meta de R$ 400 mil. A totalidade dos valores ainda não está declarada à Justiça eleitoral. Em São Paulo, a campanha de Luiza Erundina, também do Psol, afirmou que esse não é seu modelo de campanha.

Outra exigência é a comunicação pelos candidatos à Justiça eleitoral a cada 72 horas do recebimento das doações. Desde o início da campanha no dia 16, a maioria dos candidatos a prefeito da capital paulista, por exemplo, já declarou ingressos, mas nenhum pela internet. Celso Russomanno (PRB) obteve R$ 750 mil com recursos do partido e João Doria (PSDB) informou R$ 700,5 mil, originários de recursos próprios, do partido e de pessoas físicas. A campanha de arrecadação de Doria deve estrear na internet na segunda-feira. A de Marta Suplicy (PMDB) ainda estuda se vai aderir ao sistema.

O mais provável é que a arrecadação pela internet seja utilizada por candidatos de legendas menores. O deputado Alessandro Molon, candidato à Prefeitura do Rio pelo Rede, partido registrado em 2015, aposta no sistema. "Nós teremos uma plataforma específica de arrecadação", disse, mas até agora o candidato não declarou nenhum recurso nenhum obtido.

O Rede prevê utilizar as doações pela internet nas dez capitais em que vai concorrer à prefeitura e está estudando a melhor plataforma, entre elas o Voto Legal. Um dos motivos para recorrer ao eleitor são os baixos valores recebidos do fundo partidário. Segundo porta-voz a legenda, o Rede recebe R$ 400 mil reais mensais, enquanto o PT leva R$ 8 milhões.

Marina Silva, fundadora do Rede, foi das primeiras a utilizar as doações eleitorais virtuais, quando concorreu às eleições presidenciais de 2010. Na época, arrecadou R$ 170 mil de um total de 2.899 doadores.

Para disciplinar este meio, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) rejeitou a "vaquinha virtual", sistema de financiamento coletivo que foi utilizado por petistas ("crowdfunding"). A legislação só permite ao candidato receber doações pela internet por meio de seu site, do partido ou da coligação. A divulgação pode ser realizada em seus sites e também pelo horário eleitoral gratuito de TV.