Título: Amor à prova de balas
Autor: Amado, Guilherme; Gama, Júnia
Fonte: Correio Braziliense, 11/11/2011, Política, p. 3

Depois de ser enquadrado, Lupi pede desculpas publicamente à presidente pela declaração de que não seria demitido. Em cerimônia no Planalto, Dilma demonstra apoio ao ministro.

O ministro do Trabalho, Carlos Lupi, abusou ontem do jeito "italianão", como se refere a si mesmo, na Comissão de Fiscalização e Controle da Câmara. Após perceber que as declarações de que só sairia do ministério "abatido à bala" poderiam custar-lhe o cargo, Lupi se retratou publicamente e, reiteradas vezes, assumiu ter exagerado no tom. O pedetista fez até declaração de amor à presidente Dilma Rousseff. "Presidenta Dilma, desculpa se fui agressivo, eu não iria te desafiar: eu te amo!", disse o ministro durante o depoimento, que começou pouco antes das 10h e terminou por volta das 14h.

Além da declaração de amor, Lupi negou denúncias de corrupção, acusou a imprensa de exercer o papel de "tribunal de inquisição" e fez uma defesa exaltada do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Quase ao mesmo tempo, do outro lado da rua, no Palácio do Planalto, Dilma demonstrou apoio ao ministro e negou que haja uma crise no Ministério do Trabalho. Em evento para comemorar a sanção da lei que amplia os benefícios do programa Supersimples, a presidente deu a entender que perdoou Lupi. "Não tem crise com o ministro do Trabalho. Vocês acreditam mesmo que eu vou responder a isso? Nessa altura do campeonato? Tinha um líder gaúcho que eu não vou dizer qual, que dizia o seguinte: o passado simplesmente passou." A presidente evitou comentar as denúncias sobre o favorecimento a pedetistas no repasse de verbas do ministério.

Na quarta-feira, a ministra da Casa Civil, Gleisi Hoffmann, alertou Lupi de que as declarações dele haviam desagradado a presidente Dilma, que se sentiu desafiada quando o titular do Trabalho afirmou "duvidar" que seria substituído na pasta. Ele negou que tenha levado uma bronca da presidente e que a ministra Gleisi tenha interferido. Segundo Lupi, às 9h da manhã de quarta deu uma entrevista na qual reconheceu que havia exagerado. "Eu reconheci que extrapolei, ninguém precisou me falar." O ministro culpou a imprensa pela reação do Planalto. "Vocês editaram em um ângulo como se eu estivesse desafiando a presidente, quando na verdade eu estava desafiando o denunciante", afirmou a jornalistas na saída de seu depoimento na Câmara.

Defesa Lupi foi obrigado a comparecer à Câmara para dar explicações sobre denúncias de irregularidades nos contratos com ONGs. Em seu depoimento, Lupi desqualificou os denunciantes e os desafiou a apresentar provas contra ele. O ministro se escora na declaração do procurador-geral da República, Roberto Gurgel, de que, até o momento, não há indícios que o incriminem diretamente. "Se condena sem qualquer prova, Jesus! Apareçam as provas, pelo amor de Deus. Apresente quem levou dinheiro e, se alguém levou, foi individualmente. E tem que ir para a cadeia. Eu não compactuo com corrupção."

O ministro do Trabalho aproveitou a sessão para defender os colegas de partido. Segundo o ministro, "não há possibilidade de Marcelo Panella estar envolvido em nada que é irregular". Lupi disse que colocaria a vida "à disposição" por causa da confiança que tem no "companheiro" e negou que tenha afastado Panella em agosto. "Ele demorou para sair, porque eu o segurei", disse. Tesoureiro do PDT, Marcelo Panella foi acusado pela revista Veja de ser um dos articuladores do esquema de cobrança de propina de ONGs conveniadas com o ministério. Panella era o chefe de gabinete de Lupi e deixou o ministério em agosto.

O coordenador de Contratos e Convênios do Ministério do Trabalho, Manoel Eugênio Guimarães, que indicou a mulher para trabalhar em uma ONG inadimplente, também foi protegido por Lupi. O ministro afirmou que, depois de denunciado o caso, Manoel reconheceu o erro e pediu que a mulher deixasse a entidade. "Ele me informou, depois que vocês denunciaram que ele colocou a mulher durante 30 dias, disse que errou e pediu que ela saísse", disse.

Manoel é o responsável pelo acompanhamento dos convênios com ONGs no ministério. Lupi afirmou que não iria demiti-lo. "Ele disse que se arrependeu e que ela ficou lá só 30 dias. Eu acredito na palavra dele, não o demitirei por causa disso", justificou o ministro, para quem a contratação "é um erro e não um crime". A ONG Confederação Nacional dos Evangélicos (Conae) recebeu R$ 3,3 milhões após firmar convênio com o Trabalho. Na época, Manoel Eugênio era assessor especial do ministro Carlos Lupi.

Lupi defendeu também o ex-ministro do Esporte Orlando Silva, último a deixar o cargo por denúncias de irregularidades na pasta. "Acho que se cometeu uma injustiça", disse em relação à enxurrada de denúncias que culminou com a demissão do ministro. No entanto, o pedetista afirmou que não terá o mesmo destino dos outros seis ministros que caíram desde o início do ano. "Vocês terão uma surpresa porque vou provar que a denúncia é infundada e não vai me macular. Vou até o fim", ameaçou.