Correio braziliense, n. 19366, 03/06/2016. Política, p. 4

"Dilma mentiu sobre Pasadena"

Delação premiada do ex-diretor de Internacional da Petrobras aponta que a presidente afastada tinha todas as informações sobre a compra da refinaria

 

A íntegra da delação premiada do ex-diretor da Petrobras Nestor Cerveró, tornada pública ontem, revelou acusações contra a presidente afastada Dilma Rousseff. Segundo Cerveró, Dilma mentiu sobre a compra da refinaria de Pasadena. O delator disse supor que a petista sabia que políticos do PT recebiam propina da estatal. Condenado na Lava-Jato, Cerveró está preso desde janeiro de 2015.

Segundo Cerveró, “não corresponde à realidade” a afirmação de Dilma de que aprovou a compra da refinaria, adquirida pela Petrobras em 2006, porque não tinha informações completas. Na época, Dilma era presidente do Conselho de Administração da Petrobras.

Cerveró disse que “houve certa pressa” na aprovação do projeto pelo conselho. “Que Dilma Rousseff tinha todas as informações sobre a refinaria de Pasadena; que o Conselho de Administração não aprova temas com base em resumo executivo”, disse.

E completou: “Que não corresponde à realidade a afirmativa de Dilma Rousseff de que somente aprovou a aquisição porque não sabia dessas cláusulas; que o declarante não tem conhecimento de irregularidade na aprovação da aquisição da refinaria pelo Conselho de Administração da Petrobras”.

Cerveró também afirmou aos investigadores que ouviu de seu advogado que Delcídio do Amaral teria lhe dito que Dilma agiria para tirá-lo da prisão assim como o ex-diretor da estatal Renato Duque, considerado operador do PT. Segundo Cerveró, Delcídio relatou que Dilma teria dito que “cuidaria dos meninos”.

A presidente Dilma já afirmou anteriormente que aprovou o negócio porque não sabia da existência de duas cláusulas que causaram prejuízo e que não constavam no resumo apresentado por Cerveró ao Conselho de Administração da Petrobras.

 

Graça Foster

Nestor Cerveró afirmou também que, em certa ocasião, a então presidente da Petrobras Graça Foster lhe teria dito que estava ali “para defender a Dilma”.  Cerveró declarou que, “quando o caso da Refinaria de Pasadena adquiriu grande repercussão pública, chegou a telefonar para a presidente da Petrobras, Graça Foster, para tratar do assunto, na véspera de um depoimento que prestou na comissão de controle interno da Câmara dos Deputados”.

“Que a intenção do declarante era evitar contradições com declarações oriundas da Petrobras. Que Graça Foster cortou a conversa e disse que estava ali para defender a Dilma.” Procurada, a ex-presidente da Petrobras Maria das Graças Foster disse que não comentaria o episódio.

 

Collor

O ex-diretor da Petrobras ainda acusou o senador Fernando Collor de Mello (PTB-AL) de receber entre R$ 15 milhões e R$ 20 milhões da UTC para que a empresa construísse as bases de distribuição de combustíveis da BR Distribuidora, subsidiária da estatal. Segundo o delator, a empresa ganhou todas as licitações da BR desde que ele assumiu sua diretoria, em 2008.

Cerveró indicou que a empreiteira foi responsável pela construção de pelo menos duas bases de distribuição da subsidiária: a de Porto Nacional, no Tocantins, e de Cruzeiro do Sul, no Acre. Além disso, a empreiteira foi responsável pela ampliação do terminal de distribuição de combustíveis de Duque de Caxias. Todas as obras foram licitadas pelo diretor de Operações Logísticas da subsidiária, José Zonis, afilhado de Collor na empresa.

O pagamento da propina ao senador era feito por intermédio de Pedro Paulo de Leoni Ramos, ex-ministro da gestão de Collor e apontado como o seu representante no esquema de corrupção na Petrobras. A defesa de Collor nega que o senador tenha participado dos processos internos e licitações realizadas pela BR Distribuidora, e afirma que jamais recebeu propina da UTC.

 

Fernando Henrique

Nestor Cerveró disse que, entre as irregularidades que presenciou na estatal durante o governo Fernando Henrique Cardoso (PSDB/1994-2002), está a contratação de uma empresa do filho do ex-presidente, Paulo Henrique Cardoso, “por orientação do então presidente da Petrobras, Philipe Reichstul, por volta de 2000”. A PRS Energia, pertencente ao filho do tucano, acabou se associando à Petrobras naquele período para gerir a Termorio, maior termoelétrica a gás do Brasil, construída pela multinacional francesa Alstom e que custou US$ 715 milhões. A reportagem entrou em contato com o Instituto Fernando Henrique Cardoso, mas o ex-presidente e seu filho estão em viagem e não foram localizados para comentar o assunto.

 

Renan

O delator afirmou que, em 2012, o Presidente do SenadoRenan Calheiros (PMDB-AL), o chamou em seu gabinete para reclamar da “falta de propina”. Na ocasião, o presidente da casa era José Sarney (PMDB/AP). Renan é alvo de 12 inquéritos no Supremo Tribunal Federal. “Em 2012, o declarante (Nestor Cerveró) foi chamado no gabinete de Renan Calheiros no Senado Federal. Na ocasião, Renan Calheiros reclamou da falta de repasse de propina por parte do declarante”, relatou Cerveró. “O declarante explicou que não estava arrecadando propina na BR Distribuidora; que então Renan Calheiros disse que a partir de então deixava de prestar apoio político ao declarante; que, no entanto, o declarante permaneceu na Diretoria Financeira e de Serviços, da BR Distribuidora.”

 

Supremo vai investigar Aécio

O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou ontem o prosseguimento da investigação contra o senador Aécio Neves, presidente do PSDB, e a coleta de provas no inquérito sobre o suposto envolvimento em corrupção em Furnas. Em nota, Aécio disse que é papel do Ministério Público investigar citações e acusações e que no fim, provará sua inocência. Há três semanas, Gilmar Mendes, que é o relator do caso no STF, suspendeu a investigação e pediu que o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, reavaliasse se queria manter os pedidos diante de uma documentação apresentada por Aécio Neves. O procurador-geral, no entanto, manteve o pedido original que fez ao STF e pediu o prosseguimento da investigação, baseado na delação premiada do senador cassado Delcídio do Amaral. Janot também pediu o desarquivamento da citação feita pelo doleiro Alberto Youssef sobre o parlamentar.

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STF rejeita recurso de Cunha

Por: Eduardo Militão

 

O Supremo Tribunal Federal (STF) determinou a abertura oficial da ação penal contra o presidente afastado da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Em julgamento na tarde de ontem, o plenário rejeitou por unanimidade um recurso do deputado e determinou a “imediata” autuação do inquérito em que o congressista é acusado de receber US$ 5 milhões de propina em uma ação penal antes mesmo de a decisão ser publicada. Cunha é réu no Supremo por suspeita de corrupção e lavagem de dinheiro em meio a um esquema de desvios de dinheiro na Petrobras, apurado pela Operação Lava-Jato.

No julgamento, o relator da Lava-Jato disse que os recursos de Cunha e da ex-deputado Solange Almeida (PMDB), outra ré no processo, querem apenas discutir novamente uma decisão do STF que recebeu a denúncia do Ministério Público para que o processo continuasse no tribunal. No entanto, isso não é permitido nos chamados “embargos de declaração”, mecanismo para corrigir ambiguidades, omissões e trechos mal esclarecidos de uma ordem da Justiça.

“Não merecem sequer conhecimento embargos que, a pretexto de sanar obscuridades e contradições, traduzem mero inconformismo com a conclusão adotada”, disse Teori ao ler seu voto. “O que existe é a invocação de fundamentos já esgotados na decisão recorrida. Não pretende o embargante qualquer tipo de esclarecimento, mas sim o rejulgamento da matéria.”

Ameaças à família

O advogado tributarista Francisco Prehn Zavascki, 35 anos, filho do ministro Teori Zavascki, disse em rede social que é obvio que há “movimentos” para “frear a Lava-Jato” e que os criminosos não seguirão as leis do país. No comentário, feito em 26 de maio, ele alerta para possíveis represálias à família. “Porém, alerto: se algo acontecer com alguém da minha família, vocês já sabem onde procurar... Fica o recado!”

Interlocutores de Francisco Prehn disseram ao Correio ontem que as ameaças não aconteceram, mas que o advogado não quer “pagar para ver”. A preocupação da família é que o processo da Lava-Jato tem sido muito “difícil” para Teori e seus filhos, apurou o jornal, por causa das pressões. O advogado disse a esses interlocutores que pedidos de interferência não são nada perto do que realmente a família do ministro pode estar sujeita.