Delação da Odebrecht mira PSDB e Serra

 

08/08/2016

 

Os executivos da Odebrecht prometeram aos investigadores da força tarefa da LavaJato detalhar como o caixa dois da empresa abasteceu as campanhas eleitorais do PSDB em 2010. A informação foi publicada pelo jornal “Folha de S. Paulo” e confirmada pelo GLOBO junto a pessoas que acompanham de perto as negociações.

De acordo com o jornal, os repasses teriam ido para o hoje ministro das Relações Exteriores, José Serra (PSDB-SP), que concorreu à Presidência da República, em 2010, contra a presidente afastada Dilma Rousseff (PT). Ele teria recebido ilegalmente R$ 23 milhões. O GLOBO não conseguiu confirmar a citação ao tucano e esses valores.

Segundo informações do Tribunal Superior Eleitoral, o valor que teria sido repassado ilicitamente ao tucano representa dez vezes mais do que o doado oficialmente para o Comitê Financeiro Nacional para Presidente da República de Serra em 2010, que totalizava R$ 2,4 milhões. Para comprovar que houve o pagamento por meio de caixa dois, segundo a “Folha”, a Odebrecht vai apresentar extratos bancários de depósitos realizados fora do país que tinham como destinatária final a campanha presidencial do tucano. O ministro era apelidado na contabilidade paralela da empresa de “vizinho” e “careca”.

 

ANASTASIA TAMBÉM TERIA SIDO CITADO

A delação da Odebrecht, segundo o jornal, também envolverá a construção do trecho sul do Rodoanel Mário Covas. A obra aparece em um das planilhas apreendidas durante a 23ª fase da Lava-Jato. A construtora teria pago a pessoas ligadas a Serra que participaram do projeto. As obras do Rodoanel já apareceram na Lava-Jato. Os investigadores apuram repasses de propina em contratos do trecho norte do anel viário.

Não é a primeira vez que um político tucano aparece nas negociações entre a Odebrecht e a Lava-Jato. O GLOBO revelou, no final de julho, que os executivos da empresa prometem relatar repasses a campanhas do governador de São Paulo, Geraldo Alckmin. Ontem, o colunista Lauro Jardim revelou que o ex- governador mineiro e hoje senador Antônio Anastasia também teria sido citado. O senador tucano aparece nas negociações para a delação também como destinatário de caixa dois em uma de suas campanhas. O nome dos dois estão entre os 13 governadores e 35 senadores já listados pela construtora na negociação da delação.

Quem também pode aparecer na delação da construtora é o ex-presidente do PSDB Sérgio Guerra, morto em 2014. O tucano era o presidente do partido no período quando teria ocorrido os pagamentos ilícitos à Serra. Na semana passada, a Polícia Federal iniciou uma nova fase da Lava-Jato que investiga a participação do tucano no esquema de corrupção da Petrobras.

Os investigadores vão apurar se a construtora Queiroz Galvão pagou propina a Guerra em troca de uma operação para abafar a CPI da Petrobras, em 2009. A Polícia Federal teve acesso a uma reunião entre o tucano, o então diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa e empreiteiros onde foi negociado o fim das investigações no Congresso. Guerra é flagrado por uma câmera de segurança negociando o recebimento de R$ 10 milhões. Guerra afirma aos presentes ao encontro que tinha “horror à CPI”.

Os dados dos repasses ao PSDB e a outros partidos estão em documentos que a construtora começou a reunir do Setor de Operações Estruturadas. As informações são o ponto-chave das negociações da Odebrecht com a força tarefa. Os investigadores querem acesso irrestrito aos dados e às transações do setor, que ficou conhecido como a “diretoria da propina”. Eles querem também extratos de contas da empresa no Meinl Bank Antigua, localizado em Antigua. O banco era controlado por operadores ligados à construtora e pode ter sido usado para ocultar propinas pagas a políticos no exterior.

Nas últimas semanas, investigadores ouviram dezenas de executivos da empresa em Curitiba e Brasília durante mais uma etapa da negociação do acordo de colaboração com a Odebrecht. Desde abril, advogados da construtora negociam os termos do acordo que pode ter mais 90 anexos e envolver 51 executivos e gerentes do grupo.

Além de Marcelo Odebrecht, que falou por cerca de dez horas aos investigadores na sede da Polícia Federal na última quinta-feira, estiveram em Curitiba o ex-diretor-presidente da construtora Odebrecht, Benedito Barbosa da Silva Junior, e o ex-executivo Alexandrino Alencar. Os dois, que estão soltos, participaram de uma espécie de entrevista na sede do Ministério Público Federal. Na conversa, eles teriam relatado aos investigadores o que podem falar em delação. Foi com Benedito que os investigadores acharam uma lista com o nome de mais de 200 políticos que teriam recebido valores da empresa nos últimos 20 anos. Ele chegou a ser preso na Lava-Jato, mas foi solto pela Justiça.

Os acordos de delação de Marcelo Odebrecht e de outros executivos da empresa são os mais esperados da Operação Lava-Jato. Maior empreiteira do país, a Odebrecht tem obras e contratos com a administração pública dos três Poderes, e em praticamente todos os estados do país. Só no ano passado, a empresa faturou mais de R$ 130 bilhões com negócios no Brasil e no exterior. Depois de uma primeira etapa complicada, com avanços e recuos, os acordos avançaram nas últimas semanas de forma significativa. Após acertos prévios com advogados, os procuradores começaram a ouvir os executivos para saber quem está apto a fazer o acordo e que assuntos interessam.

Os repasses teriam ido para José Serra, que concorreu à Presidência, contra Dilma Rousseff

 

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O ranking dos queridinhos do Planalto

 
08/08/2016
Júnia Gama
Simone Iglesias

 

Com dois meses e meio de governo do presidente interino Michel Temer, a avaliação no Palácio do Planalto sobre o desempenho dos novos ministros é variada. Alguns, escolhidos por imposição dos partidos aliados, têm se revelado boas descobertas. Outros têm apresentado desempenho insuficiente, segundo interlocutores de Temer.

Entre os bem avaliados, estão Fernando Bezerra (Minas e Energia), Mendonça Filho (Educação) e Bruno Araújo (Cidades), elogiados pela rapidez com que se familiarizaram com os temas de suas áreas e pelas medidas adotadas. Da lista de nomes levados pelos partidos, Bezerra inicialmente causou preocupação ao Planalto por ter só 32 anos e ser inexperiente numa área complexa do governo, onde estão os maiores focos de corrupção: a Petrobras e a Transpetro, além do setor elétrico. Após dois meses e meio, é chamado de “grande revelação”.

 

NA SAÚDE, PROBLEMAS

Dois são considerados hors concours: Henrique Meirelles (Fazenda), visto como a “âncora” que ajudará na aprovação do impeachment com a reversão de expectativas negativas na economia, e José Serra (Relações Exteriores), apontado como um “avião” no governo, apesar de seu hábito de dar palpite em áreas alheias.

Outros têm sido reprovados. O que mais reclamações entre os auxiliares próximos de Temer é Ricardo Barros (Saúde). A avaliação é que suas declarações são um “desastre” e que ele está mais voltado para o setor privado do que para os que necessitam de atendimento.

Entre as declarações polêmicas, integrantes do governo citam a defesa da revisão do atendimento universal pelo SUS, e quando disse que os pacientes “imaginam” estar doentes.

— O Ricardo Barros é um político habilidoso, a mulher é vice-governadora, a filha é deputada estadual. Mas, quando dá entrevista, é um desastre. Ministro não pode ficar entrando em polêmica assim — resumiu um auxiliar presidencial.

O ministro Alexandre de Moraes (Justiça) tem altos e baixos. Seu excesso de exposição e as falas descombinadas do governo causaram desconforto. Além de atuar de forma autônoma, é considerado arrogante. Mesmo assim, é considerado acima da média, principalmente por sua boa relação com a Polícia Federal.

Outro problemático é o pastor Marcos Pereira (Desenvolvimento), cujo desempenho é considerado fraco, mesmo não havendo grande expectativa sobre sua atuação. Fontes do Planalto dizem que Temer precisou aceitar a indicação do PRB, sob pena de perder o apoio do partido.

Mas quem corre risco de perder a cadeira após o impeachment é o advogado-geral da União, Fábio Medina, que já provocou mais de um desgosto no presidente interino, como no episódio em que deixou de recorrer ao Supremo Tribunal Federal (STF) pela troca de comando na EBC. Pela omissão de Medina, até hoje a empresa de comunicação está sob controle de um indicado pelo PT.

De trato político comedido e buscando evitar quaisquer arestas com os aliados em nome da governabilidade, Temer minimiza eventuais comentários sobre a atuação de seus ministros. Sobre Alexandre de Moraes, contemporiza, ao avaliar junto a seus auxiliares que ele cumpre papel importante.

Os dois ministros mais próximos de Temer — Geddel Vieira Lima (Secretaria de Governo) e Eliseu Padilha (Casa Civil) — são o coração do governo e estão em alta, mas com ressalvas.

No caso de Geddel, há queixas sobre seu temperamento forte, mas interlocutores de Temer destacam que ele está sempre de portas abertas para atender demandas de deputados e prefeitos. Padilha é criticado pelas entrevistas.

— Geddel é como a nossa Seleção de 1994. Joga feio, mas ganhou a Copa. Padilha só não pode ser o comentador-geral da República. O trabalho da Casa Civil tem que ser voltado para dentro — diz um assessor do Palácio.

 

O globo, n. 30317, 08/08/2016. País, p. 4