Correio braziliense, n. 19367, 04/06/2016. Política, p. 2

Renan critica redução de prazos

Presidente do Senado afirma que vê “com preocupação” a diminuição do cronogramada comissão especial do impeachment. Definição sobre o calendário só ocorrerá após a palavra final do presidente do Supremo, Ricardo Lewandowski

Por: Julia Chaib

 

No dia seguinte à redução da previsão do tempo de trabalho da comissão especial do impeachment, o presidente do Congresso, Renan Calheiros (PMDB-AL), disse “acompanhar, com preocupação, iniciativas que possam comprimir prazos” e suprimir o “direito de defesa”. Como se fosse um jogo de cartas marcadas, ontem, o advogado da presidente afastada Dilma Rousseff, José Eduardo Cardozo, pediu ao presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Ricardo Lewandowski, a garantia de 20 dias para as alegações finais da defesa e da acusação, de modo que a votação da pronúncia em plenário ocorra em só em setembro.

Inicialmente, o calendário apresentado pelo relator do processo na comissão especial, Antonio Anastasia (PSDB-MG), previa a fase da pronúncia para agosto. O prazo foi encurtado em 20 dias, para julho, depois que o presidente do colegiado, Raimundo Lira (PMDB-PB), aceitou uma questão de ordem da senadora Simone Tebet (PMDB-MS). Lira quer esperar a posição de Lewandowski para colocar o calendário em votação, o que pode ocorrer na segunda-feira.

Diante dos movimentos da base, a atual oposição vê um movimento do governo interino para acelerar o processo. O próprio ministro da Secretaria de Governo, Eliseu Padilha, disse na quinta-feira que há interesse de que o processo se resolva “o mais rápido possível”. Mas desde então, o presidente em exercício, Michel Temer, tem negado e demonstrado “indignação” com alegações de interferência do Planalto no processo.

A senadora peemedebista pediu a redução do calendário por entender que o prazo para as alegações finais de ambas as partes deve ser de cinco dias, com base no Código do Processo Penal (CPP). A proposta de Anastasia previa 15 dias para as alegações da acusação e da defesa, baseado na Lei nº 8.038, que rege as normas procedimentais no Superior Tribunal de Justiça e no Supremo.

Já a defesa quer se basear na Lei do Impeachment, nº 1.079, que não estabelece prazo para essa etapa do processo e pede no recurso pelo menos 20 dias para essa fase. Os advogados de Dilma entendem que o processo com base nessa lei deve ser análogo ao aplicado com Fernando Collor de Mello, em 1992. Naquele episódio, segundo o recurso, foram concedidos 20 dias para a defesa prévia. No recurso, afirma que as alegações finais são a “materialidade da defesa”, por isso, o prazo mínimo deve ser de 20 dias.

A comissão terminou na quinta-feira com tumulto, e a defesa se retirando da sala e alegando que Lira havia cometido “golpe” ao colocar para votação em bloco 81 requerimentos analisados por Anastasia. Como medida protelatória, aliados de Dilma queriam discuti-los um a um. Embora não faça parte da comissão, Renan disse ontem que o colegiado não pode usar “expedientes de discutível caráter democrático”.

“É imperioso agilizar o processo para que não se arraste indefinidamente. Para tal, é possível reduzir formalidades burocráticas, mas sem restringir o devido processo legal e, principalmente, o direito de defesa. Dez dias na história não pagam o ônus de suprimi-los”, disse Renan. O peemedebista também ponderou que não se pode sobrecarregar o presidente do STF, que também é o presidente do Senado para o processo de impeachment, e responde como uma instância máxima recursal. Ainda ontem, Cardozo recorreu contra a decisão da comissão que pode trabalhar com Dilma afastada por até 180 dias. “Dentro desses seis meses, acho que dá para terminar esse processo muito antes. Em princípio, pelo que estou avaliando hoje, em setembro, dando o prazo para todas as testemunhas, para fazer perícia, tudo”, explicou ontem Cardozo. O advogado arrolou 48 testemunhas. O número de pessoas foi questionado em recurso ao ministro do STF pelo líder do governo, Aloysio Nunes (PSDB-SP), que quer apenas 16.

Delação de Machado O advogado de Dilma também questionará a decisão da comissão que negou a inclusão das gravações do ex-presidente da Transpetro Sergio Machado, no processo de produção de provas. Anastasia negou o recurso e foi referendado pelos demais senadores da comissão alegando que a delação fugiria ao objeto da denúncia. Cardozo, porém, discorda e nega que as gravações possam ser consideradas “fatos novos”. O advogado afirma que os áudios, principalmente os com o ex-ministro do Planejamento Romero Jucá e o ex-presidente José Sarney, sustentam a tese de “desvio de poder”, também alegada contra o presidente afastado da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ).

Cardozo explicou que os áudios de Machado sustentam uma tese da defesa e, por isso, não alargam o objeto do impeachment. Isso ocorreria se a acusação quisesse tratar de outras denúncias que não os decretos editados sem autorização do Congresso ou as pedaladas fiscais. “Se a defesa descobre um áudio que mostrar má-fé da presidente em relação aos decretos, ela pode juntar”, disse Cardozo.

 

Frase

É imperioso agilizar o processo para que não se arraste indefinidamente. Para tal, é possível reduzir formalidades burocráticas, mas sem restringir o devido processo legal e principalmente o direito de defesa. Dez dias na história não pagam o ônus de suprimi-los”

Renan Calheiros, presidente do Senado

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Restrição aos voos da FAB

Por: PAULO DE TARSO LYRA

 

Uma decisão tomada ontem pela Casa Civil restringiu as possibilidades de usos de aviões da Força Aérea Brasileira (FAB) pela presidente afastada, Dilma Rousseff. De acordo com o documento produzido, que passa a orientar o governo sobre todos os benefícios aos quais a petista tem direito, os aviões da FAB só poderiam ser usados nos deslocamentos entre Brasília e Porto Alegre, onde moram os familiares dela.

Na capital gaúcha, onde participou na tarde de ontem do lançamento do livro A resistência ao golpe de 2016, a petista definiu como “grave” a restrição de seus voos. “Hoje, teve uma decisão da Casa Civil, ilegítima e interina, cujo objetivo é proibir que eu viaje. Vejam bem, vocês têm que ficar alegres. Meu direito de viagem parece que é só de Brasília para Porto Alegre. Mas não podem ficar alegres porque é um escândalo que eu não possa viajar pro Rio, pro Pará, pro Ceará. Isso é grave”, disse a presidente afastada.

Para Dilma, essa limitação é complicada porque, diferentemente de pessoas comuns, ela não tem como pegar um avião de carreira. “Não sei se vocês sabem, mas eu não posso, como qualquer outra pessoa, pegar um avião (normal). Tem que ter toda a segurança atrás de mim, garantindo minha segurança. É a Constituição que manda”, argumentou.

Ela não demonstrou, contudo, disposição para alterar a agenda de viagens que pretende iniciar pelo país. “Estamos diante de uma situação que tem que ser resolvida. Eu vou viajar. Vamos ver como vai ser minha viagem”, disse ela. Mais tarde, Dilma participou de protesto contra o presidente interino, Michel Temer (PMDB), no centro de Porto Alegre. O local é ponto tradicional para atos de movimentos sociais, desde a ditadura militar.