Correio braziliense, n. 19371, 08/06/2016. Política, p. 3

Ministro critica vazamento

Gilmar Mendes considera “Cuma brincadeira com o Supremo” a divulgação do pedido de prisão dos quatro políticos da cúpula do PMDB

Por: Eduardo Militão

 

O ministro do Supremo Tribunal Federal Gilmar Mendes criticou o vazamento do pedido de prisão de quatro integrantes da cúpula do PMDB: o ex-presidente José Sarney; o Presidente do SenadoRenan Calheiros (AL); o presidente afastado da Câmara, Eduardo Cunha (RJ); e o ex-ministro Romero Jucá.  “Não se pode brincar com esse tipo de coisa”, disse ele. “Tem-se um processo oculto, pede-se sigilo, mas divulga-se para a imprensa. Isso é algo grave, não se pode cometer esse tipo de coisa. Isso é uma brincadeira com o Supremo. É preciso repudiar isso de maneira muito clara.”

Um importante advogado de réus da Lava-Jato destacou ao Correio que a revelação da tentativa de colocar os investigados na cadeia significa uma “falta de seriedade” que apequena o Brasil e o Supremo. Na visão dele, o objetivo foi “constranger” o Supremo a julgar o pedido de prisões. Alguns ministros fizeram avaliação semelhante. Publicamente, a maioria deles preferiu não comentar o tema. Ainda assim, alguns deles discutiam ontem detalhes que levaram Sérgio Machado a entregar seus antigos padrinhos na estatal Transpetro — a colaboração premiada dele e as gravações ambientais feitas com Renan, Sarney e Jucá embasaram os pedidos da Procuradoria-Geral da República.

No Ministério Público, a ordem foi o silêncio. Ao menos parte dos procuradores demonstrou um pouco de apreensão e de irritação com a divulgação da informação sigilosa. Sob segredo, ela embasaria uma ação da Polícia Federal para amanhecer à porta de Renan, Sarney, Cunha e Jucá. Gilmar Mendes não quis comentar quem divulgou o pedido de prisão. “Quem está fazendo isso está cometendo crime”, despistou.

 

Flagrante

Advogados criticaram o pedido de prisão de Rodrigo Janot e da equipe de procuradores que trabalha com ele na Lava-Jato. O criminalista Jair Jaloreto Júnior, com 20 anos de experiência na área penal, considerou “descabida” a solicitação de prisão porque não há um crime em flagrante narrado pelas declarações dos senadores Renan Calheiros e Romero Jucá, do deputado Eduardo Cunha e do ex-presidente José Sarney, gravadas pelo ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado — e que afirmou ter entregado propinas aos três primeiros. Segundo Jaloreto, os fatos ocorreram há muito tempo. “Mesmo que seja verdade, não cabe prisão preventiva porque não é flagrante, embora eles possam ser processados e condenados depois”, disse.

Já o constitucionalista João Paulo Jacob lembra que a prisão do ex-senador Delcídio do Amaral (ex-PT-MS) pode trazer argumentos para levar os quatro peemedebistas à cadeia. “O Supremo pode entender que eles pertencem a uma organização criminosa, sendo, portanto, um crime permanente, que continua no espaço de tempo e assim ser considerado flagrante a qualquer momento”, explicou.

Um outro especialista em direito penal disse entender que o fato de Renan defender uma mudança na lei da delação premiada não significa tentativa de obstruir a Justiça. Jaloreto concorda. “Politicamente, talvez Janot tenha dado uma resposta à sociedade, um recado aos políticos para que se ‘comportem’ ou para dar um retorno à delação de Sérgio Machado”, avaliou ele.

O criminalista Fernando Fernandes é da mesma opinião. “Criminalizar políticos porque falam ou tentam influenciar ministros do Supremo sobre a Lava-Jato ou desejam mudar leis para conter o abuso de juiz é tornar crime ter opinião contrária ao (juiz) Sérgio Moro (da 13ª Vara Federal de Curitiba, onde corre boa parte dos processos do caso).”

 

Frase

“Tem-se um processo oculto, pede-se sigilo, mas divulga-se para a imprensa. Isso é algo grave, não se pode cometer esse tipo de coisa. Isso é uma brincadeira com o Supremo. É preciso repudiar isso de maneira muito clara”

Gilmar Mendes, ministro do STF