Correio braziliense, n. 19381, 18/06/2016. Economia, p. 8

Receita perde R$ 37 bi no ano

Recolhimento de tributos federais tem queda de 7,36% nos cinco primeiros meses do ano, refletindo a forte retração na atividade econômica. Recuo só não foi maior porque governo reverteu parte das desonerações concedidas anteriormente

Por: Rosana Hessel

 

A arrecadação do governo federal vai de mal a pior, refletindo a retração da economia brasileira. Em apenas cinco meses, a Receita Federal deixou de recolher o equivalente a um ano de Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF). De janeiro a maio, as receitas administradas somaram R$ 517,1 bilhões, volume R$ 37 bilhões menor que o registrado no mesmo período de 2015, de R$ 554,1 bilhões (considerando valores corridos pela inflação), o que representa uma queda real de 6,69% em relação ao mesmo período de 2015. Os dados foram divulgados ontem pelo Fisco. Em 2007, último ano em que a CPMF vigorou, a União arrecadou R$ 37,2 bilhões com o tributo.

Já a receita total encolheu 7,36% em termos reais no acumulado do ano em comparação ao mesmo período de 2015, totalizando R$ 519 bilhões, o menor volume no período desde 2010. “O recolhimento tem se mostrado bem aderente ao comportamento da economia. A atividade ainda demonstra sinais de forte contração e isso se reflete na coleta dos tributos federais”, explicou o chefe do Centro de Estudos Tributários e Aduaneiros da Receita Federal, Claudemir Malaquias. Ele destacou que, em alguns segmentos, já se observa redução no ritmo de queda, mas avaliou que ainda é cedo para prever uma reversão da tendência.

Os principais tributos federais continuaram registrando retração generalizada. O maior recuo foi o da receita previdenciária, que encolheu R$ 8,8 bilhões entre janeiro e maio, em relação ao mesmo intervalo do ano passado, para R$ 152,9 bilhões. O recolhimento de Cofins/Pis-Pasep caiu R$ 7,8 bilhões, para R$ 109,5 bilhões. A exceção ficou com o Imposto de Renda Pessoa Física (IRPF) sobre rendimentos de capital, que cresceu R$ 1,1 bilhão no ano, para R$ 19 bilhões.

A queda da arrecadação no ano só não foi maior porque o governo conseguiu reverter parcialmente as desonerações tributárias concedidas no governo anterior a vários setores econômicos. Com isso, a renúncia fiscal teve redução de R$ 9,2 bilhões em relação a 2015, para R$ 37,7 bilhões. Além disso, a recomposição da Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide) sobre os combustíveis desde meados do ano passado ajudou a incrementar a arrecadação em R$ 2,4 bilhões na comparação com os primeiros cinco meses de 2015.

Somente em maio, o total de tributos recolhidos caiu pelo quinto mês consecutivo, somando R$ 95,2 bilhões e registrando queda real de 4,81% na comparação com o mesmo período de 2015. Esse foi também o menor volume para o mês desde 2010. O dado ficou levemente acima dos R$ 94,9 bilhões esperado pelo Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre-FGV) e das estimativas do mercado.

Previsões

“Apesar da atividade econômica ainda bastante deprimida afetar as receitas, a queda real acumulada no ano vem diminuindo mês a mês, reflexo principalmente da desaceleração da inflação em relação ao ano passado”, destacou e especialista em contas públicas Fábio Klein, da Tendências Consultoria. Ele lembrou que o ritmo de queda real das receitas previdenciárias, entre 4% e 5% ao mês, reflete a deterioração do mercado de trabalho, mesmo com a reversão parcial das alíquotas da desoneração da folha de pagamentos no fim de 2015. Malaquias manteve a previsão de queda real de 5% na arrecadação tributária em 2016.

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Ministro prevê recuperação

 

A arrecadação tributária do governo federal voltará a crescer acima da inflação em 2017, com a recuperação esperada da atividade econômica, segundo o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles.  “Consideramos que a receita deve crescer no ano que vem acima da inflação, à medida que o  país terá crescimento positivo”, avaliou Meirelles, em entrevista, ontem à Rádio CBN.


Segundo o ministro, a recuperação do nível de atividade depende, no entanto, do reequilíbrio das contas públicas. Para isso, destacou, é fundamental que o Congresso aprove a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que estabelece limites ao crescimento das despesas federais. “É importante termos uma diretriz básica: não pode ter despesa acima da arrecadação”, afirmou.

De acordo com o ministro, o controle de gastos não será prejudicado pelas regras orçamentárias que vinculam receitas a determinadas categorias de despesa. No caso das verbas para as áreas de saúde e de educação, afirmou, a questão já foi equacionada pela PEC, que mudou a vinculação para a variação da inflação do ano anterior. “Com isso, essas despesas não vão crescer acima da capacidade de arrecadação”, avaliou.

Uma área importante em que as despesas têm crescido sistematicamente acima da arrecadação, nos últimos anos, é a Previdência Social. Nesse caso, um grupo de trabalho está preparando uma proposta de reforma, que deve ser concluída nas próximas semanas.

Outra vinculação — a do salário mínimo, que é atrelado à inflação e ao crescimento do PIB — também está sendo avaliada, já que a variação do piso salarial tem impacto direto em diversos gastos governamentais. Meirelles não quis adiantar o teor das mudanças em estudo. “Prefiro não dar opinião, porque isso só vai perturbar os trabalhos do grupo”, argumentou. Segundo ele, todas as alterações propostas serão “compatíveis com o esforço fiscal” que está sendo feito pelo governo.

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Política não atrapalha

 

As seguidas complicações políticas derivadas dos desdobramentos da Operação Lava-Jato, que provocaram a queda de três ministros desde o início da gestão do presidente interino Michel Temer, não perturbam o trabalho da área econômica do governo, de acordo com o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles.


“Acredito que teremos condições de continuar trabalhando normalmente. Alguma substituição de ministro, por ser objeto de denúncia, não tem alterado nosso trabalho”, afirmou Meirelles, em entrevista dada ontem à Rádio CBN. “Do meu ponto de vista, estamos apresentando um projeto de logo prazo, que será válido para diversos governos e mandatos. A sociedade brasileira está entendendo isso”, acrescentou.

Mesmo com o cenário político conturbado, o ministro acredita que o Congresso deverá aprovar a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que fica limites à expansão dos gastos públicos. “A reação dos líderes da base aliada foi muito positiva”, afirmou. “A questão política é de curto prazo, e a PEC tenta equacionar um problema fiscal de longo prazo”, disse.

Questionado sobre eventuais ambições políticas, o ministro da Fazenda afirmou que é candidato apenas “a fazer um bom trabalho no Ministério da Fazenda”. “Conseguindo isso, estarei realizado profissionalmente. Meu foco no momento é esse”, afirmou. No início da década passada, Meirelles chegou a ser eleito deputado federal por Goiás, na legenda do PSDB. Abriu mão do mandato para ocupar a presidência do Banco Central no governo Lula.