Vamos em frente

George Vidor

22/08/2016

 

 

Recuperação da economia brasileira desta vez será mais lenta do que em recessões anteriores

Não serão anos fáceis, pois a recuperação da economia brasileira deve ser mais lenta do que em recessões anteriores. Em 2008-2009, o Brasil sofreu um tranco diante da crise financeira internacional, mas em 2010 a produção já havia voltado ao mesmo patamar que havia perdido. Desta vez, isso provavelmente só ocorrerá a partir de 2020.

Isso significa que Michel Temer, se confirmado na presidência, terá mesmo que conduzir um governo de transição, tomando medidas de ajuste que compensem a política econômica irresponsável que Dilma Rousseff avalizou, chegando a perder o rumo em 2014. As consequências vieram em 2015 e o país só resistiu porque Dilma, mesmo a contragosto, nomeou Joaquim Levy para o Ministério da Fazenda. Mas o resto de governabilidade evaporou no início de 2016, o que tornou o processo de impeachment inevitável.

Temer não é um líder carismático. O PMDB foi parceiro político do governo Dilma e demorou a pular fora do barco. Por isso, ninguém sai para a rua empunhando faixas do tipo “Viva Temer”, embora as pesquisas mostrem que a volta da Dilma é um pesadelo. Está claro que o Brasil precisa de um governo de transição que nos permita chegar a 2018. E, nesse sentido, Temer teve a sensibilidade de montar uma equipe econômica com credibilidade e reconhecida competência para promover os ajustes necessários.

O Congresso percebeu que o fogo estava começando no porão e para que não se alastre vem aceitando uma agenda política de reformas, com grande possibilidade de votar as mais polêmicas em 2017, ano ideal para isso porque antecede o das eleições gerais, quando os ânimos não estarão tão serenos.

Tudo indica que chegaremos ao último trimestre de 2016 já com a economia no azul, modestamente. O câmbio está no lugar certo e a inflação cede – ainda que devagar – o que abrirá espaço para uma leve redução nas taxas de juros. A faxina nas empresas estatais continua em curso. O governo está disposto a colocar em pauta um programa de concessões de serviços públicos e mesmo a Petrobras conseguirá retomar investimentos que foram paralisados para reavaliação de contratos e também devido à precária situação financeira da empresa. A renegociação de dívidas dos estados dará algum fôlego aos entes federativos enquanto a arrecadação tributária não se reage.

Os Jogos Olímpicos foram uma alegria para os brasileiros e ajudaram a dar uma pausa no clima de mau humor que contaminou o país. Agora é ir em frente.

 

Na terrinha

Brasil e Portugal têm laços históricos, culturais e sanguíneos inseparáveis, mas as relações econômicas entre os dois países sempre ficaram muito aquém do que deveria ser, um fenômeno quase inexplicável. Depois da Revolução dos Cravos, em 25 de abril de 1974, quando Portugal deu uma guinada estatizante, alguns grupos empresariais portugueses migraram para cá ou puseram um pé no Brasil, mas mesmo assim a integração avançou relativamente pouco. A crise na Europa e a frustração com a situação política e social por aqui curiosamente estimularam o fenômeno de investimento de brasileiros em uma segunda residência em Portugal. Os preços dos imóveis se tornaram convidativos por lá. Além disso, Portugal vem passando por uma transformação interessante. O longo isolamento preservou uma certa autenticidade no jeito de ser dos portugueses, características que turistas europeus descobriram e gostam. O Porto, por exemplo, hoje é uma cidade turística que chega a rivalizar com Lisboa. Tem voos internacionais diretos.

Portugal adotou a estratégia de “exportar” mais produtos para esses visitantes. Esse esforço passou a fazer parte da política oficial de estímulo às exportações. É um bom momento também para se promover marcar brasileiras, seja para os consumidores locais ou para os visitantes. No bairro de Príncipe Real, uma região revitalizada de Lisboa, abrirá em dezembro um espaço para essas marcas, chamado OBA, ocupando o Palácio Castilho. A ideia não é um shopping center de marcas, mas um centro de negócios capaz de reunir empresas que não querem, ou não conseguem, promover-se por conta própria. Por trás do OBA estão empreendedores especializados em marketing, comunicação e assessoria para os trâmites de entrada no mercado europeu. O OBA dará partida focando em marcas ligadas ao design e à cultura do Brasil. Nada de sandálias Havaianas, por enquanto.

 

 

O globo, n. 30331, 22/08/2016. Economia, p. 16.