Correio braziliense, n. 19376, 13/06/2016. Brasil, p. 5

Receio na Saúde

Limites para gastos na saúde colocam em xeque a prestação de serviços à população, em tempos de gripe H1N1 e zika

Por: Júlia Chaib

 

Especialista temem retrocesso na saúde pública em meio às ameaças causadas pelo vírus da gripe H1N1 e o zika vírus, responsáveis por mortes e doenças. O motivo depreocupação é a proposta de limite de gastos apresentada pelo presidente interino Michel Temer e por opiniões do ministro da Saúde, Ricardo Barros. O receio de entidades e técnicos do próprio Ministério é de que o orçamento se torne ainda mais escasso. 


O presidente interino, Michel Temer, já garantiu que não vai alterar os percentuais relativos aos gastos com Saúde e Ecucação não serão alterados. 


Antes da proposta de limite de gastos apresentada pelo ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, três projetos já preocupavam especialistas da área e técnicos do Ministério da Saúde. A Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 143 desobriga um piso de despesas no setor, feitas por estados e prefeituras. A Lei 13.097/15 autoriza o investimento de capital estrangeiro em serviços de saúde. A PEC 451, proposta pelo presidente afastado da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), obriga as empresas a fornecerem planos de saúde aos trabalhadores urbanos e rurais.


A autorização de entrada de capital estrangeiro inclui construção e manutenção de hospitais, inclusive, filantrópicos, com participação direta ou indireta. Uma nota técnica do Ministério da Saúde ressalta que isso pode desfigurar o SUS. A regra “entra em conflito” com o sistema. O documento critica o uso de capital externo no setor filantrópico. Como o cidadão pode abater parte dos gastos com saúde no Imposto de Renda, a nota avalia que o investimento estrangeiro causará acesso indireto a subsídios e afetará a arrecadação tributária. Não haveria garantias de aumento de leitos.


A PEC de Meirelles impede que despesas com saúde e educação atreladas ultrapassem a inflação do ano anterior. O ministro da Saúde, Ricardo Barros, chegou a dizer que “o país precisa rever o direito universal à saúde”, mas depois recuou por causa da má repercussão. O Ministério da Saúde estima que R$ 35 bilhões do setor sejam perdidos em 2017 se for aprovada a PEC 143, que acaba com os pisos de 12% e 15% de gastos em saúde nos estados e nas prefeituras, respectivamente. A proposta aguarda votação em segundo turno no Senado.


O Conselho Nacional de Saúde, a Associação Brasileira de Saúde Coletiva e o Centro de Estudos Brasileiros em Saúde criticam as mudanças. “É desconhecer completamente o processo de subfinanciamento histórico do SUS e a realidade da saúde pública brasileira, especialmente nesses anos de epidemia de dengue e de zika vírus”, disse o conselho em nota. “Os gastos públicos em ações e serviços públicos de saúde estão estagnados desde 2000 em 1,7% do PIB, ou seja, o ministro da Fazenda quer uma economia de 1,5% a 2,0% do PIB retirando recursos do já insuficiente orçamento do Ministério da Saúde.”


A professora de saúde coletiva da Universidade Federal do Rio de Janeiro Lígia Bahia afirma que, se for aprovada, a PEC 143 coloca em risco o financiamento da área. “A proposta é cortar o que já estava sob restrição”, disse. “São proposições incompatíveis com sistemas públicos universais. A ideia geral não explicitada é a da privatização da saúde em um momento de recessão. Ou seja, sem emprego e diminuição de renda, como será possível pagar pela saúde?”