Correio braziliense, n. 19372, 09/06/2016. Política, p. 4

CCJ aumenta tropa de Eduardo Cunha

Três deputados foram trocados antes de a comissão analisar consulta que pode permitir uma pena mais leve ao presidente afastado da Câmara, acusado de quebrar o decoro

Por: Natália Lambert

 

A cada dia uma nova manobra altera as expectativas em relação ao futuro do presidente afastado da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Ontem, na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), diante da perspectiva de rejeição da consulta que deve definir as regras do processo do peemedebista, o Partido da República (PR) promoveu uma troca de cadeiras para aumentar o pelotão de choque de Cunha no colegiado.

Jorginho Mello (PR-SC) e Paulo Freire (PR-SP) deixaram de ser titulares, os que têm direito a voto, e foram para a suplência. No lugar deles, assumem Laerte Bessa (PR-DF) e Wellington Roberto (PR-PB), fiéis aliados do peemedebista e que devem votar a favor dele na consulta 17/2016. A deputada Clarissa Garotinho (PR-RJ), adversária de Cunha que está de licença-maternidade e era suplente, foi substituída pelo deputado João Carlos Bacelar (PR-BA). O trio tem feito uma defesa acirrada de Cunha no Conselho de Ética.

As mudanças causaram revolta no plenário da CCJ, até de um dos membros substituídos. “Isso é um precedente inédito muito grave. Cheira mal”, protestou Jorginho Mello, que reclamou da troca sem ter sido avisado pelo partido. Para Wadih Damous (PT-RJ), foi uma “manobra espúria”. A empreitada na CCJ pretende salvar Eduardo Cunha no plenário, caso o Conselho de Ética decida pela cassação. Em resposta a uma consulta enviada pela presidência, assinada por Waldir Maranhão (PP-MA) a pedido de Wellington Roberto, o deputado Arthur Lira (PP-AL), relator e aliado de Cunha, sugeriu um rito de votação que pode abrandar a pena e até causar o arquivamento do processo.

Quatro questões foram feitas à CCJ sobre processos disciplinares. A primeira quis saber se, após a apreciação no Conselho de Ética, será votado o parecer do relator do caso Cunha no plenário da Casa ou um projeto de resolução. De acordo com Lira, o projeto será submetido à votação, apesar de o parecer ter sido apreciado em casos anteriores. A orientação é fundamental, já que são permitidas emendas a projetos de resolução. Outra determinação de Lira é que as emendas não podem agravar a pena, só abrandar. Na prática, isso poderia até salvar Cunha da punição máxima de ser cassado. A última questão define que, no caso de rejeição do projeto, a representação da Rede e do Psol, que pede a cassação, será prejudicada. A recomendação de Lira será apreciada pela CCJ, mas a decisão de aceitá-la ou não cabe ainda ao presidente em exercício, Waldir Maranhão.

De acordo com o presidente do Conselho de Ética, José Carlos Araújo (PR-BA), a troca de cadeiras feita pelo seu próprio partido é só mais uma das ações que mostram que Eduardo Cunha ainda “manda e desmanda” na Casa. “É uma manobra clara e evidente para aprovar a consulta e facilitar a vida do Cunha.” A estratégia dos deputados contrários ao parlamentar será obstruir a votação da matéria no colegiado. A leitura do parecer de Lira ficou agendada para a sessão de hoje, às 10h. Procurado, o líder do PR, Aelton Freitas (MG), não se manifestou.

 

Novo adiamento

Diante de uma derrota iminente, Araújo adiou por duas vezes no mesmo dia a votação do parecer que pede a cassação de Cunha. A nova sessão está marcada para terça-feira, às 14h30. Ele disse que a medida tem bons objetivos. “Se for manobra, pelo menos a minha é para o bem e baseada no regimento.”

Na última terça-feira, a ausência da deputada Tia Eron (PRB-BA) daria a vitória a Cunha, já que o voto que a substituiria seria do suplente Carlos Marun (PMDB-MS), ferrenho defensor do colega. Entre os membros do colegiado, 10 já declararam voto contra a cassação de Cunha e nove a favor. A única que não se pronunciou é a parlamentar baiana. Desde que optou por não comparecer à sessão, Tia Eron tem sofrido pressões de todos os lados. Deputados suspeitaram de uma interferência do governo por causa de uma reunião no Palácio do Planalto entre o ministro Marcos Pereira (Indústria e Comércio), presidente licenciado do PRB, e Michel Temer, na véspera da sessão do Conselho. Para Araújo, se houve mesmo orientação para que a deputada faltar, isso seria “lamentável”.

Membro da Executiva do PRB, o deputado Celso Russomanno (PRB-SP) afirmou ontem que a sigla deu “liberdade” para Tia Eron votar como quiser, apesar de destacar que ele é favorável à cassação de Cunha. Procurada, Tia Eron não quis falar com o Correio. Por meio da assessoria, afirmou que cumprirá normalmente a agenda de trabalho nos próximos dias e garantiu presença na sessão de terça-feira do Conselho.

 

Frase

"É uma manobra clara e evidente para aprovar a consulta e facilitar a vida do Cunha”

José Carlos Araújo, presidente do Conselho de Ética