Governo alivia exigência de gasto com pessoal dos estados

 
02/08/2016
Martha Beck
Bárbara Nascimento
Isabel Braga
Eduardo Barreto

 

Para assegurar a aprovação pelo Congresso do projeto de renegociação das dívidas de estados com a União, a equipe econômica decidiu fazer concessões. O ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, informou que o governo vai permitir que, por dez anos, os estados retirem do cálculo das despesas de pessoal gastos com “penduricalhos” que hoje elevam os salários dos servidores do Judiciário, como o auxílio-moradia e indenizações. Também serão excluídas da conta despesas de exercícios anteriores e com terceirizados.

No projeto original, a União criou regra que obriga os governadores a incluírem na conta de pessoal várias despesas que vinham sendo deixadas de fora, como as com inativos, pensionistas e terceirizados. Esse tipo de manobra foi usada nos últimos anos por vários estados para não se desenquadrarem na Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). Hoje, os estados não podem gastar mais que 60% de sua Receita Corrente Líquida (RCL) com pessoal. Quando esse percentual chega a 95%, a LRF proíbe qualquer movimentação de folha que implique em aumento de gastos.

Com isso, quando a regra da nova lei fosse aplicada, a maioria dos estados acabaria superando os limites da LRF. Isso gerou queixa de várias categorias de funcionários públicos, que alegam o risco de demissão ou de paralisação de serviços importantes para a população. Diante disso, Meirelles disse, em reunião com líderes na manhã de ontem, que o governo concorda em deixar temporariamente de fora do cálculo de pessoal os adicionais da folha do Judiciário, que impactam fortemente os gastos estaduais. Isso evitaria um desenquadramento excessivo na LRF.

Em troca dessa flexibilização os estados terão que fazer valer a regra do teto para os gastos públicos especificamente nas despesas com pessoal. Pela regra, os gastos de um ano só podem crescer com base na inflação do ano anterior.

— O que foi decidido é que apenas nas carreiras do Judiciário, Tribunal de Contas, Ministério Público e Defensoria Pública, para efeito do limite de comprometimento das receitas definido pela LRF, essas despesas (com auxílio-moradia) são excluídas das despesas de pessoal. Em contrapartida, foi acordado que essas despesas de pessoal, incluindo terceirizados e os demais, passarão a ficar sujeitos a um teto que seja equivalente ao teto aplicado à União — ressaltou Meirelles.

O relator do projeto da renegociação, deputado Esperidião Amin (PP/SC), explicou que o texto original já dava aos governadores dez anos para adequarem os gastos com pessoal aos limites da LRF. Segundo o deputado, há uma demanda do Congresso para aumentar esse prazo , e já espera que Legislativo e Executivo pressionem para ter o mesmo benefício. Ele ainda fez críticas ao texto e defendeu que não seja votado hoje, como queria o governo, porque exige debate.

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Temer blinda Meirelles, que terá mais atribuições

 
02/08/2016

 

Diante da importância da agenda econômica para a sobrevivência de seu governo, o presidente interino, Michel Temer, não quer que ninguém mexa com o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles. Dentro do Palácio do Planalto, a frase “Meirelles sempre vai ganhar qualquer discussão econômica” já virou uma máxima para rebater qualquer questionamento ou opinião divergente. Interlocutores relatam que Temer blindou o ministro:

— Não há nada que ele peça e não leve — disse um integrante do Planalto.

É por isso que a transferência da Secretaria de Orçamento Federal do Ministério do Planejamento para a Fazenda, pedida por Meirelles, é dada como certa. Hoje, o Planejamento é o responsável pela gestão orçamentária, mas é a Fazenda quem gere as finanças por meio do Tesouro. Isso significa que uma pasta dá os limites para os gastos, enquanto a outra faz os pagamentos de fato. Com a Secretaria de Orçamento na Fazenda, a condução da política fiscal ficaria concentrada num só lugar e deixaria o ministro mais poderoso.

Temer já sinalizou aos ministros que evitem ao máximo falar sobre assuntos da área de Meirelles, para evitar bolas divididas — entre eles, José Serra (Relações Exteriores) e Eliseu Padilha (Casa Civil), que têm uma gama ampla de assuntos, muitos deles com viés econômico.

 

PRESSÃO POLÍTICA NA META

Outro sinal da força de Meirelles veio na fixação da meta fiscal de 2017 em um déficit fiscal primário de R$ 139 bilhões. A ala política do governo pressionou até o último minuto para que o valor fosse maior — próximo dos R$ 170 bilhões de 2016 — e desse maior margem de manobra para o governo na gestão das contas do ano que vem. No entanto, Temer não quis enfraquecer seu ministro da Fazenda e seguiu sua orientação para o número.

Interlocutores da área econômica afirmam que até mesmo em temas em que Meirelles parece ter saído derrotado, como a aprovação de reajustes de servidores, que impactaram as contas de 2016, o quadro não foi bem assim. O ministro, afirmam, fez um movimento calculado de deixar esse assunto resolvido para os próximos anos, para poder se dedicar à aprovação da proposta de emenda constitucional (PEC) que fixa um teto para os gastos e que representa um ajuste fiscal estrutural, o que, na sua visão, é mais importante. (Martha Beck e Simone Iglesias)

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Desconto para São Paulo sobe a R$ 500 milhões

 

02/08/2016

 

O governo cedeu às pressões de São Paulo e aumentou de R$ 400 milhões para R$ 500 milhões o valor do desconto que o estado poderá ter em suas parcelas da dívida com a União. Por ter o maior estoque de débitos, o governo paulista tem um tratamento diferente dos demais estados: em vez de ter uma carência de 100% dos valores das parcelas, São Paulo está sujeito a um teto. Dessa forma, a parcela média do governo paulista, que hoje é de R$ 1,3 bilhão, cairia para R$ 800 milhões.

Ao anunciar as linhas gerais do projeto de renegociação das dívidas dos estados em junho, o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, havia informado que o teto era de R$ 400 milhões. Isso já representava uma mudança na ideia inicial do governo, de R$ 300 milhões.

Ao ler o projeto ontem, o relator Esperidião Amin (PP/SC) teceu uma série de críticas a vários pontos da proposta. Um deles é o artigo que unifica quais despesas deverão ser enquadradas como gasto com pessoal.

— Quero saber qual o reflexo verdadeiro, na contabilidade dos estados, desse critério. O Rio tem como fazer isso? — questionou Amin.

O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), ponderou:

— Estouramos a primeira sessão extraordinária para ler o relatório. Foi o primeiro passo. Amanhã (hoje) nós vamos dar o segundo e, se Deus quiser, vamos votar até o final do dia. (Bárbara Nascimento e Isabel Braga)

 

O globo, n. 30311, 02/08/2016. Economia, p. 17