De volta ao lucro

Ramona Ordoñes e Danielle Nogueira

12/08/2016

 

 

Após 3 trimestres de prejuízo, Petrobras tem ganho de R$ 370 milhões, abaixo do esperado

Após três trimestres seguidos de prejuízo, a Petrobras registrou lucro líquido de R$ 370 milhões entre abril e junho. O ritmo de recuperação da estatal, porém, ficou muito aquém das projeções dos analistas, que previam ganhos de cerca de R$ 2 bilhões no período. O resultado representa uma queda de 30,3% em relação ao lucro registrado no segundo trimestre do ano passado, de R$ 531 milhões.

Os números mostram que a recuperação da companhia ainda é lenta. No segundo trimestre, a estatal foi beneficiada pela alta dos preços e da produção de petróleo, mas outros fatores afetaram o resultado. A petroleira fez uma nova e inesperada baixa contábil — de R$ 1,1 bilhão referente ao Comperj, empreendimento em Itaboraí, na Região Metropolitana do Rio, em razão da reavaliação do projeto e do adiamento da construção da refinaria para depois de 2020. Desde 2014, a Petrobras já tinha feito baixas de R$ 27,1 bilhões no negócio — ou seja, no total, foram R$ 28,2 bilhões em perdas.

O Comperj foi um dos empreendimentos que tiveram cronograma e investimentos revistos em razão da Operação LavaJato. Em nota, a estatal informou que isso afetou o custo de conclusão das unidades da refinaria associadas à Unidade de Processamento de Gás Natural (UPGN).

4 MIL ADEREM À DEMISSÃO VOLUNTÁRIA

Além da baixa contábil, as provisões — quando a empresa tem de reconhecer perdas em seu balanço — com o Programa de Incentivo ao Desligamento Voluntário (PIDV) foram os principais impactos negativos sobre o resultado. Já há adesão de 4.000 funcionários ao programa, o que fez a estatal prever gastos de R$ 1,2 bilhão.

— O provisionamento de gastos para o PIDV, a devolução de alguns campos à ANP (Agência Nacional do Petróleo) e a baixa (contábil) no Comperj foram os principais pontos que levaram a um resultado inferior ao esperado pelo mercado — resumiu Ivan Monteiro, diretor financeiro da Petrobras.

A diretora de Exploração e Produção da estatal, Solange Guedes, acrescentou que a forte redução do número de sondas contratadas também afetou o resultado negativamente: o total de sondas em operação caiu de 48 no ano passado para 31 no fim do segundo trimestre. Ainda de acordo com ela, continuam as negociações com os fornecedores para redução de custos de operação.

Diante deste quadro, a Petrobras continua no vermelho no semestre: acumulou prejuízo de R$ 876 milhões, ante lucro de R$ 5,8 bilhões em igual período de 2015. No primeiro trimestre do ano, a estatal havia registrado perda de R$ 1,2 bilhão.

Para a sócia da consultoria GO Associados, Luciana Nazar, novas baixas contábeis não estão descartadas e poderão afetar o balanço da empresa no futuro:

— Com a reavaliação do cronograma do Comperj, há uma postergação de receita. Por isso, é preciso fazer uma provisão de perdas. Não descarto que novas baixas sejam feitas, mas acredito que o ritmo dessas provisões deve desacelerar — disse Luciana, lembrando que o prejuízo de mais de R$ 36 bilhões no quarto trimestre de 2015 foi influenciado por baixas bilionárias.

ABAIXO DA META DE INVESTIMENTO

No caso das demissões, Luciana diz que eram esperadas, pois a empresa vem anunciando seu programa de desligamento voluntário há algum tempo. A especialista frisa que isso implica aumento de gastos num primeiro momento, mas terá impacto positivo no futuro, pois o quadro de pessoal será reduzido.

Ao comentar o resultado, Monteiro também informou que a Petrobras não cumprirá a meta de investimentos de US$ 20 bilhões de 2016. O diretor financeiro afirmou que o montante a ser aplicado pela estatal este ano deve ficar entre US$ 17 bilhões e US$ 19 bilhões. No primeiro sepresas mestre, foram investidos US$ 11,2 bilhões:

— O resultado do primeiro semestre aponta para isso (não atingir a meta). A probabilidade de a gente ficar abaixo do que a gente orçou é muito grande.

O valor maior do barril de petróleo, porém, ajudou a empresa. Segundo analistas, a média do Brent (referência no mercado internacional) no segundo trimestre foi de US$ 47,39 ou 35% acima da cotação média do primeiro trimestre do ano.

A produção total de petróleo e gás natural, por sua vez, foi de 2,804 milhões de barris de óleo equivalente por dia no segundo trimestre, um aumento de 7% em comparação com o período de janeiro a março, em linha com as expectativas do mercado. A alta se deve principalmente à entrada de novos sistemas de produção no pré-sal.

Segundo a diretora de Exploração e Produção, a meta de produção para este ano, de 2,1 milhões de barris diários, está garantida, mesmo com o número menor de sondas em operação.

— A meta está mantida. Temos eventos importantes neste segundo semestre que vão fazer isso acontecer, como a entrada de 28 poços a serem interligados e entrada em produção do sistema Caraguatatuba que vai contribuir — afirmou Solange.

Luana Siegfried, analista do braço de pesquisa e análise do banco de investimentos americano Raymond James, lembra que a oferta mundial de petróleo está em queda, no momento, pois muitas emcortaram a produção após as quedas bruscas da cotação desde 2014:

— Isso acabou levando a um recente aumento nos preços. Os Estados Unidos, por exemplo, produzem hoje um milhão de barris a menos por dia que no ano passado. A alta recente nos preços beneficiou todas as empresas de petróleo.

Em relação ao segundo trimestre de 2015, porém, a média de cotações do barril do tipo Brent caiu 23,7%. Como a Petrobras não repassa imediatamente essa oscilação de preços ao mercado doméstico, ela ganha com isso. Nos cálculos do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE), a estatal vendeu a gasolina com preços 12,6% mais altos do que no mercado internacional entre abril e junho. O diesel, por sua vez, foi vendido 35,7% mais caro.

Isso permitiu ganho de R$ 12,8 bilhões para a Petrobras no primeiro semestre do ano. Porém, o volume de venda de derivados, como diesel, gasolina e querosene de aviação, caiu no semestre. Reflexo da recessão, que reduz a demanda por combustível. O resultado foi que a petrolífera amargou queda de 7% na receita com comercialização de derivados como resultado da retração da atividade econômica. Na prática, a alta nos preços não compensou a queda no volume de vendas.

— Foi muito baixo o resultado. A geração de caixa caiu, apesar do aumento da produção. Operacionalmente, não foi bom — resumiu Pedro Paulo Silveira, economista-chefe da Nova Futura Corretora.

ENDIVIDAMENTO MENOR

Um dos pontos positivos do balanço foi a redução da dívida. No fim do segundo trimestre, ela alcançou R$ 397 bilhões, uma queda de 19% em relação aos R$ 493 bilhões do fim de 2015. Monteiro destacou que as operações feitas no primeiro semestre reduziram o custo do endividamento em US$ 10 bilhões no período de 2016 a 2019.

Mas analistas ressaltaram que a variação cambial contribuiu para reduzir o endividamento. Como a maior parte da dívida é em dólar, toda a vez que a moeda americana cai, a empresa é beneficiada. A dívida em dólar recuou só 2%.

— A Petrobras abateu parte da dívida com recursos de caixa, da venda de ativos. Mas o principal veio de efeitos exógenos (externos). Tem a ver com a variação do câmbio — explica Silveira.

Segundo Monteiro, a estatal tem de pagar este ano mais R$ 28 bilhões em amortização e juros. No primeiro semestre, foram pagos R$ 70 bilhões. (Colaborou Glauce Cavalcanti)

FRASE

“O provisionamento de gastos para o PIDV (programa de demissão voluntária), a devolução de alguns campos de petróleo e a baixa no Comperj foram os principais pontos que levaram a um resultado inferior ao esperado”

Ivan Monteiro

Diretor financeiro da Petrobras

 

 

O globo, n. 30321, 12/08/2016. País, p. 3.