Fachin revê decisão sobre a 2ª instância

Beatriz Bulla, Júlia Lindnar e Igor Gadelha

05/08/2016

 

 

Ministro revoga habeas corpus concedido pelo presidente do STF que libertou prefeito; na Câmara, Moro defende que entendimento vire lei.

Em mais um embate no Supremo Tribunal Federal (STF) sobre o início do cumprimento de pena após a condenação em segunda instância, o ministro Luiz Edson Fachin revogou uma decisão do presidente da Corte, Ricardo Lewandowski, sobre o tema.

Responsável pelo plantão do Supremo durante o recesso do tribunal, em julho, Lewandowski contrariou o entendimento da maioria dos ministros e concedeu habeas corpus para liberar o prefeito eleito de Marizópolis (PB) a responder processo em liberdade, mesmo depois de ter sido condenado pelo Tribunal Regional Federal da 5.ª Região.

O prefeito José Vieira da Silva foi afastado do cargo em julho, após ser condenado a cumprir pena no regime semiaberto em razão da prática dos crimes de fraude a licitação e desvio de recursos públicos. Para Lewandowski, a execução da pena antes do esgotamento das possibilidades de recursos configura um “constrangimento ilegal”.

Em fevereiro, no entanto, o plenário do Supremo decidiu, por 7 votos a 4, alterar a jurisprudência adotada no País para este tipo de caso e permitir a execução da pena a partir das condenações por tribunal de segunda instância. Antes, portanto, do chamado “trânsito em julgado” do processo. Em despacho assinado na terça-feira, Fachin revogou a decisão individual de Lewandowski e lembrou que a Corte se manifestou de forma colegiada.

Sem efeito vinculante. A decisão sobre prisão após julgamento em segunda instância foi tomada pelo plenário do Supremo durante discussão de um habeas corpus e, por isso, não tem efeito vinculante. Para Fachin, no entanto, a Corte deve conferir “estabilidade” à sua própria jurisprudência. O ministro escreveu ainda em sua decisão que o plenário não discutiu “apenas peculiaridades” do caso concreto no habeas corpus, o que indica a intenção dos ministros de “indicar a compreensão” sobre o tema.

A decisão de Lewandowski não foi o primeiro despacho monocrático que contrariou a maioria dos ministros. No início de julho, o ministro Celso de Mello, decano do STF, também entendeu que a decisão sobre o início do cumprimento da pena não tem efeito vinculante.

Celso e Lewandowski ficaram vencidos no plenário sobre a execução da pena após condenação em segunda instância. O Supremo terá de rediscutir o tema, pois há duas ações na Corte que tentam alterar o entendimento fixado no início do ano.

O debate chegou a ser pautado em junho pelo presidente do STF, mas acabou sendo adiado.

Processo penal. Ontem, em audiência na Câmara, o juiz federal Sérgio Moro, que conduz as investigações da Operação Lava Jato na primeira instância, afirmou que a decisão do STF sobre o tema foi a reforma “mais importante do nosso processo penal”. Para ele, a mudança sinaliza que a Corte está “sensível” aos problemas de corrupção e criminais. “Foi uma decisão muito importante e acho que não fere a presunção de inocência, a não ser que a gente vá afirmar que não existe presunção de inocência nos Estados Unidos e na França”, afirmou Moro, lembrando que, nesses países, as penas começam a ser cumpridas a partir da primeira condenação. Na presença de deputados, o juiz afirmou que “seria ideal” que o Congresso aprovasse legislação nesse sentido.

Presunção de inocência

“Foi uma decisão muito importante e acho que não fere a presunção de inocência.”

Sérgio Moro

JUIZ FEDERAL RESPONSÁVEL PELAS AÇÕES DA OPERAÇÃO LAVA JATO

PARA ENTENDER

Decisão não  é vinculante

O STF discutiu em fevereiro um habeas corpus de um homem condenado a 5 anos de reclusão, em regime fechado, por roubo, que podia recorrer em liberdade. O caso chegou à Corte após ele recorrer da sentença e o TJ-SP, além de negar o recurso, determinar o início do cumprimento da pena. Na votação no STF, os ministros decidiram que as penas passassem a ser executadas já na 2.ª instância, ou seja, antes de esgotar as possibilidades de recursos. A decisão, porém, não ganhou o chamado efeito vinculante, desobrigando outros magistrados a seguir a jurisprudência em casos análogos.