Ministro diz que sai do governo se reformas não avançarem

 
 
09/08/2016
Tiago Dantas Júnia Gama

 

O ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Marcos Pereira, disse ontem que pretende deixar o governo federal caso reformas urgentes, como a trabalhista e a previdenciária, não estejam encaminhadas até o primeiro semestre do ano que vem. Durante palestra na Associação Comercial de São Paulo, o ministro ainda criticou o Congresso, que, segundo ele, não votará nada antes das eleições.

— Já disse para o presidente (Michel Temer) e para outros empresários pelo Brasil afora: se não avançar e se eu perceber que não vai avançar, não tenho intenção e não tenho disposição para continuar no governo. Fui para ajudar o país. Se eu perceber que não vai avançar, volto para meu escritório de advocacia, que está de portas abertas.

 

DESEMPENHO INSUFICIENTE

As declarações, que provocaram desconforto no Palácio do Planalto, foram dadas num momento em que o governo avalia que o desempenho de Marcos Pereira é fraco, mesmo não havendo grande expectativa sobre sua atuação no governo. Temer só aceitou a indicação para não perder o apoio do PRB, partido de Pereira. E há um cuidado para que a relação com o PRB continue boa. Integrantes da base acreditam que Pereira está, na verdade, construindo um discurso preventivo para a possível saída do cargo após o julgamento do impeachment.

Caso deixe de ser interino e se torne presidente efetivo, a tendência é que Temer exonere Pereira, pedindo nova indicação ao próprio PRB, ou realoque o partido em ministério de menor porte.

— Ele deve sair assim que o impeachment for aprovado. Está lá só por imposição do PRB. Mas uma coisa é impor algo a um governo interino; outra é a um governo efetivo — afirmou ontem um senador aliado do Palácio do Planalto.

Ainda durante a palestra, o ministro afirmou que o governo Temer precisa “ter coragem” para fazer e defender que (as reformas) sejam aprovadas no primeiro semestre do ano que vem:

— O governo precisa apresentar (as reformas) até o final de novembro. Se não aprovar até o primeiro semestre, não vai aprovar neste governo.

Alheio ao debate em torno de sua atuação no ministério, Pereira afirmou:

— Precisamos fazer quatro reformas estruturantes urgentes: tributária, trabalhista, previdenciária e política. Essas quatro reformas dependem do Congresso Nacional, e aí é preciso que os senhores entendam que temos duas agendas que nos impedem de avançar nessas propostas: o processo de impeachment e as eleições. Não vamos conseguir avançar essas reformas antes da eleição.

Pereira disse que essas medidas são consideradas impopulares por políticos:

— O deputado e o senador infelizmente não vão votar reformas chamadas impopulares. E eu não vejo nada de impopular, porque a economia vai destravar e vai avançar — afirmou o ministro, que continuou: — Vou ser sincero e transparente: não vamos conseguir avançar essas agendas antes da eleição.

Auxiliares de Temer minimizaram as declarações de Marcos Pereira. Ressaltaram que o PRB, com 22 deputados que costumam votar unidos conforme a orientação da cúpula, é um partido importante para a composição da base aliada e que não há intenção de prejudicar a relação. Mas, admitem que, após o impeachment, em um cenário de eventuais mexidas na Esplanada, o PRB pode vir a ser chamado a indicar um novo nome.

— O governo vai aprovar, sim, essas medidas. E, para começar, o PRB deve votar todo unido para aprovar essas medidas. Tem duas maneiras de ficar no governo: quando o ministro quer, ou quando o presidente quer — afirmou uma fonte do Palácio do Planalto.

Na opinião de Pereira, a reforma tributária é a “mais difícil de todas”, porque depende de acordos com estados e municípios, que teriam que combinar com mudanças na divisão dos impostos. Ao falar sobre a reforma trabalhista, ele disse que defende a regulamentação da terceirização e o trabalho intermitente (aquele em que é possível contratar por hora). O ministro declarou que o “acordado prevalece pelo legislado”, fazendo uma referência à sua preferência por acordos coletivos.

Advogado e bispo, Pereira se licenciou da presidência do PRB, partido que apoiou o governo de Dilma Rousseff até 16 de março. Naquela data, o PRB devolveu o Ministério do Esporte, que era ocupado por George Hilton.

 

O globo, n. 30318, 09/08/2016. País, p. 6