Quibe e esfirra no menu da PF

Chico Otavio

11/08/2016

 

 

Braço da Lava-Jato prende Samir Assad, que comandava com irmão Adir, já preso, esquema milionário de pagamento de propina, no qual eram identificados pela clientela como as iguarias árabes

Primeiro foi “quibe”. Ontem, chegou a vez de “esfirra”. Acusados de lavar dinheiro de empreiteiras para o pagamento de propinas, os irmãos Adir e Samir Assad estão presos pela Lava- Jato. Eles usavam firmas fantasmas e notas fiscais frias para desviar verbas de obras públicas. Um dos delatores da operação, Vinícius Veiga Borin, consultor que trabalhava para bancos caribenhos, disse que a dupla era conhecida no mercado da lavagem por “quibe & esfirra".

Samir Assad foi preso pela Polícia Federal, ontem, em São Paulo, por ordem do juiz Marcelo Bretas, da 7ª Vara Federal Criminal do Rio. Esta etapa da Lava-Jato foi batizada de “Irmandade”. Denúncia oferecida pela Procuradoria da República no Rio de Janeiro acusa Samir, junto com o irmão e outras nove pessoas, de montar um caixa dois de empreiteiras para permitir o pagamento de quase R$ 178 milhões em suborno, entre 2008 e 2013, a dirigentes da Eletronuclear.

O núcleo financeiro comandado pelos irmãos Adir e Samir teria operado para grandes empreiteiras, como a Andrade Gutierrez e a Delta, em obras como a construção da usina nuclear de Angra III, a reforma do Complexo do Maracanã para a Copa do Mundo de 2014 e a implantação do Comperj, o polo petroquímico de Itaboraí.

A nova denúncia, com a prisão de Samir, é um desdobramento da Operação Prypyat, que aprofundou as investigações sobre o esquema de corrupção nas obras da Eletronuclear. Adir já fora preso em duas oportunidades: em março de 2015, acusado de lavar dinheiro e de ter desviado R$ 40 milhões das obras de reforma da Refinaria Presidente Getulio Vargas (Repar), no Paraná; e em junho deste ano, por envolvimento no esquema de caixa dois da Delta, estimado em R$ 360 milhões.

Na ocasião, Adir foi levado para uma cela no Rio usando tornozeleira eletrônica. Ontem, Samir chegou à PF a bordo de um Porshe, que foi apreendido com outros dois carros de luxo do empresário.

O esquema dos Assad consistia na emissão de notas frias, por serviços jamais prestados às empreiteiras, para produzir caixa dois para o pagamento da propina. Eles mantinham empresas como a JSM Engenharia e Terraplenagem, a SP Terraplenagem e a Legend, cujo objetivo eram somente o de “derramar” as notas. Somados os valores apurados até agora pela Lava-Jato, quase R$ 600 milhões passaram pelo sistema montado pelos Assad. Porém, como o dinheiro era sacado em espécie, na boca do caixa, o desafio agora é chegar aos agentes públicos beneficiados.

Na denúncia, os procuradores da República citam a delação do ex-executivo da empreiteira Andrade Gutierrez Flávio Barra. Ele revelou que, durante as obras de Angra III, como o consórcio teve a participação da Andrade, foi procurado por Samir, que ofereceu-lhe a proposta de superfaturamento e contratação fictícia das empresas de seu esquema. O acordo, segundo a denúncia, definia que não haveria prestação de serviço e que 80% dos valores pagos com base em contratos fictícios seriam devolvidos em espécie, para serem entregues aos agentes públicos.

A prisão de Samir é mais uma etapa da Lava-Jato no Rio. A denúncia o acusa dos crimes de lavagem de dinheiro, falsidade ideológica e organização criminosa.

No estado, o Ministério Público Federal montou uma força-tarefa para investigar o desvio de recursos federais em grandes obras. Em etapa anterior, denominada Operação Saqueador, também foram presos o empresário Fernando Cavendish, da Delta; o empresário Marcelo Abud, sócio de Adir Assad; e o bicheiro Carlinhos Cachoeira.

 

 

O globo, n. 30314, 11/08/2016. País, p. 3.