Cunha a um passo de salvar mandato

Natála Lambert e Paulo de Tarso Lyra

14/06/2016

 

 

CRISE NA REPÚBLICA » Caso do presidente afastado da Câmara no Conselho de Ética chega a dia definitivo com histórico de manobras para livrá-lo da cassação. Voto da deputada Tia Eron pode ser decisivo.

Após meses de discussões, manobras, troca de membros e reviravoltas, o Conselho de Ética traça hoje, a partir das 14h30, o destino do presidente afastado da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Ou não. Nas palavras do presidente do colegiado, José Carlos Araújo (PR-BA), é impossível ter expectativas onde “há manobristas”. Entretanto, a votação do relatório que pede a cassação do peemedebista está agendada, e a expectativa, dos dois lados, é de que Cunha receba uma punição mais branda do que a perda do mandato. Diante da possível derrota, deputados contrários a Cunha criticam jogo de cena criado por aliados do parlamentar sobre uma possível renúncia da presidência.
Ontem, o Ministério Público Federal protocolou na Justiça Federal do Paraná ação civil pública por ato de improbidade administrativa contra Cunha. Na ação, a Força-Tarefa da Lava-Jato pede que o peemedebista perca seus direitos políticos por 10 anos, além de ter de devolver os mais de R$ 20 milhões que movimentou em contas não declaradas no exterior. Por meio de nota, Cunha informou que vai recorrer. 
Dona do voto que pode definir o processo, a deputada baiana Tia Eron (PRB) chegou a Brasília ontem, mas manteve o silêncio e reafirmou que só falará com a imprensa depois da votação. Aliados de Eduardo Cunha confiam no voto da colega, que entrou no Conselho de Ética como aliada do deputado, na vaga do antigo relator Fausto Pinato (PP-SP). Apesar de Tia Eron ter elogiado o relatório elaborado por Marcos Rogério (DEM-RO) e afirmado que votaria pela “moral”, a expectativa da maior parte dos integrantes do Conselho é de que ela diga não à cassação, segundo apurou o Correio.
O relator, que defenderá novamente a perda do mandato hoje nas alegações finais, tem certeza de que fez a parte que lhe cabia. “Fiz um relatório contundente, e alegar que não há provas é desconhecer o processo. Eu quero votar o meu relatório. Cada um vai votar de acordo com a sua consciência”, afirmou Marcos Rogério. Para o deputado Júlio Delgado (PSB-MG), também é chegada a hora de apreciar o texto. “Já esgotamos todos os nossos argumentos. Os fatos estão aí, prova não falta e é bom que o voto seja aberto, porque os 11 que votarão a favor do Cunha terão de carregar isso na sua biografia”, comentou Delgado.
Ontem, na véspera da votação, aliados do presidente afastado defendiam uma solução diferente. Conforme antecipou o Correio na edição de sábado, o deputado Carlos Marun (PMDB-MS) afirmou que, assim que a luta no Conselho de Ética acabar, e for aprovada uma punição mais branda ao peemedebista, como a suspensão de três meses sugerida em voto em separado, ele pedirá pessoalmente a Cunha que renuncie à presidência da Casa.
“Não dá mais”
Colegas do Conselho compartilham a ideia. De acordo com Sérgio Moraes (PTB-RS), “não dá mais” para o parlamentar ficar na presidência. “Tem coisa que não dá mais. Essa é uma delas. Ele deve renunciar pelo andamento da Casa e terá a oportunidade de se defender no Supremo Tribunal Federal.” Questionado sobre o voto a favor de Cunha, Moraes afirma que está “acompanhando a decisão do STF”. “Eles decidiram pela suspensão. Se o Supremo tivesse certeza, já teria mandado prender. Não temos poder investigativo. Estou votando com os pés no chão.”
“Conversa para boi dormir”, define Júlio Delgado (PSB-MG) sobre a estratégia da renúncia. Para o parlamentar mineiro, a proposta é uma tentativa de justificar a absolvição de Cunha fingindo uma “punição”. Chico Alencar (PSol-RJ) afirma que a ideia, inclusive, traz o reconhecimento da culpa de Eduardo Cunha. “É admitir que ele não tem mais condições políticas e éticas para presidir a Casa. É uma das saídas tradicionais da elite. Finge-se que perde o anel, o tira do dedo indicador e o coloca no mindinho para manter as mãos no poder”, comentou Alencar. Em diversas oportunidades, Eduardo Cunha já afirmou que não renunciará, inclusive, em recentes conversas com líderes partidários, garantiu que essa não é uma possibilidade.
Hoje, na mesma hora do Conselho de Ética, a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJC) analisará o parecer do deputado Arthur Lira (PP-AL) à consulta feita pela presidência da Casa que define o rito de votação de processos político-disciplinares, entre eles, o de Eduardo Cunha. Entre outras deliberações que beneficiam Cunha, de acordo com a orientação de Lira, caso o Conselho de Ética determine uma pena ao representado, o plenário não tem poder para aumentar essa pena, somente abrandar. Os deputados Chico Alencar, Ivan Valente (PSol-SP) e Bacelar (PTN-BA) apresentaram votos em separado sobre a questão.
Turbulências
O Planalto insiste na estratégia de se distanciar o máximo possível da disputa no Conselho de Ética envolvendo o presidente afastado Eduardo Cunha, mas tem a exata noção de que, qualquer que seja o resultado, a turbulência baterá às portas do Palácio. Se Cunha sobreviver, algo que parece cada vez mais concreto nos relatos que chegam ao governo trazidos por parlamentares, não significa que os problemas acabam. Cunha ainda tem uma longa lista de débitos com a Procuradoria-Geral da República e com o Supremo Tribunal Federal, o que pode gerar novos pedidos de cassação. Além disso, de todos os ameaçados pelos pedidos de prisão feitos por Rodrigo Janot, ele é o que está mais ameaçado.
Por outro lado, se o relatório pedindo a cassação for aprovado, o abalo poderá ser imediato, atrapalhando as votações na Câmara. “Cunha é alguém que, quando toca a campainha, o prédio inteiro ouve, não apenas aquele apartamento”, ilustrou um assessor palaciano.
Placar
A favor de Cunha
Alberto Filho (PMDB-MA)
André Fufuca (PP-MA)
João Carlos Bacelar (PR-BA)
Laerte Bessa (PR-DF)
Mauro Lopes (PMDB-MG)
Nelson Meurer (PP-PR)
Sérgio Moraes (PTB-RS)
Washington Reis (PMDB-RJ)
Wellington Roberto (PR-PB)
Wladimir Costa (SD-PA)
Indecisa
Tia Eron (PRB-BA)
Contra Cunha
Betinho Gomes (PSDB-PE)
José Carlos Araújo (PR-BA) - presidente, só vota em caso de empate
Marcos Rogério (DEM-RO)
Júlio Delgado (PSB-MG)
Leo de Brito (PT-AC)
Nelson Marchezan Junior (PSDB-RS)
Paulo Azi (DEM-BA)
Sandro Alex (PSD-PR)
Valmir Prascidelli (PT-SP)
Zé Geraldo (PT-PA)

DEM formaliza substituição
O DEM formalizou ontem a substituição do deputado Onyx Lorenzoni (RS) pelo deputado Mandetta (MS) na suplência do Conselho de Ética da Câmara. Onyx, voto contrário ao deputado afastado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), deixou o colegiado devido a uma viagem oficial ao exterior. O líder da bancada na Casa, Pauderney Avelino (AM), indicou Mandetta por ser um parlamentar contrário ao peemedebista, ou seja, se tiver a chance de votar, terá a mesma postura de Onyx. Para que Mandetta participe da votação do parecer que pede a cassação, um titular do bloco partidário precisa faltar à sessão e ele, ser o primeiro a ter registrado presença.