Decreto autorizará polícia a usar armas achadas com bandidos

 
 
17/08/2016
Carlos Britto

 

O ministro da Justiça, Alexandre de Moraes, anunciou ontem que, até o fim deste mês, vai redigir e encaminhar à Presidência da República um decreto que permitirá às polícias estaduais utilizarem armas apreendidas com criminosos. Atualmente, de acordo com o Estatuto do Desarmamento, elas devem ser destruídas. A declaração foi feita ontem pela manhã, durante entrevista coletiva sobre a operação realizada pela Polícia Civil no Complexo da Maré para prender os responsáveis pela morte do soldado da Força Nacional Hélio Andrade, assassinado na quarta-feira da semana passada, quando, em companhia de outros dois agentes, entrou por engano na Vila do João, e o grupo foi atacado por traficantes. Durante a operação de ontem, três bandidos morreram e outros três foram presos e tiveram as armas apreendidas.

— Já me reuni com representantes do Ministério do Exército, e o comando da instituição concordou que as polícias devem utilizar o armamento apreendido. Na verdade, essa medida deveria ter sido tomada há muito tempo — disse o ministro, que também prometeu o encaminhamento de outro decreto para facilitar a compra de armas pelas polícias.

Moraes, no entanto, poderá enfrentar problemas jurídicos para aprovar o decreto. Um projeto do deputado federal Laerte Bessa (PR-DF), ainda em tramitação na Câmara, trata do mesmo assunto. Por nota, o Ministério da Justiça informou que a regulamentação de armas apreendidas, segundo o Supremo Tribunal Federal, deve ser feita por lei federal (Estatuto do Desarmamento) que, por sua vez, autoriza o Executivo a regularizar a situação, o que será feito agora pelo ministro.

A Polícia Civil vai submeter as três pistolas apreendidas ontem a exame de balística para determinar se alguma delas foi utilizada no assassinato do soldado da Força Nacional. O objetivo da ação era encontrar e prender os traficantes Thiago da Silva Folly, o TH, e Alexandre Ramos Nascimento, o Pescador. Segundo a polícia, o primeiro é o chefe do tráfico no conjunto de favelas e teria ordenado o ataque ao carro onde estavam os agentes. Já o segundo seria o braçodireito de TH e estaria presente no momento em que o carro da Força Nacional foi atacado. Os dois bandidos, no entanto, conseguiram escapar. A polícia também apreendeu grande quantidade de cocaína, ecstasy, crack, lançaperfume e maconha prensada, trazendo na embalagem a mascote Vinicius da Olimpíada.

 

TRAFICANTE FUGIU, MAS JÁ ESTARIA DE VOLTA

Logo cedo, 145 policiais das Delegacias de Homicídio da Capital, de Niterói e São Gonçalo, da Baixada Fluminense e também da Coordenadoria de Recursos Especiais (Core) ocuparam as principais vias de acesso à Vila do João. Os agentes da Core foram recebidos a tiros por oito traficantes assim que chegaram à Rua do Canal, próximo ao local onde o agente da Força Nacional foi assassinado. Parte do comércio local fechou as portas.

— As armas foram apreendidas em um local muito próximo à rua onde o soldado morreu. Por isso, há uma grande chance de que alguma delas tenha sido utilizada no crime. Vamos submetêlas a um exame de balística para chegar a uma conclusão. Sabemos, no entanto, que a ordem para atacar o carro partiu do TH. Quanto a isso, não há dúvidas — afirmou o delegado da Divisão de Homicídios da Capital, Fábio Cardoso.

Ainda segundo o delegado, assim que soube da operação, Pescador fugiu para o Morro do Dendê, na Ilha do Governador, cujo tráfico de drogas é controlado pela mesma facção da Maré, mas teria sido impedido de entrar na comunidade.

 

O globo, n. 30326, 17/08/2016. Rio, p. 11