Puxado pelo rombo nas contas da Previdência Social, o déficit primário do governo central - que reúne, além da Previdência, Tesouro Nacional e BC -atingiu R$ 20,3 bilhões em agosto, pior resultado para o mês na série iniciada em 1997. O saldo negativo representa alta de 268,9%, já descontada a inflação, na comparação com o déficit apurado em agosto de 2015 (R$ 5,1 bilhões).
No acumulado dos oito primeiros meses do ano, o saldo negativo foi de R$ 71,418 bilhões - 384,7% acima do registrado no mesmo período do ano passado, em termos reais, e também o pior da história. Em relação ao Produto Interno Bruto (PIB), o déficit acumulado no ano está em 1,8%. Em 12 meses, o governo central tem déficit primário de R$ 178,9 bilhões, acima da meta de R$ 170,5 bilhões estabelecida para 2016.
O Tesouro atribuiu o resultado negativo de agosto à combinação de um aumento de 13,1% na despesa total com uma queda de 5,3% na receita líquida, ante o mesmo mês de 2015. A secretária do Tesouro Nacional, Ana Paula Vescovi, aproveitou a divulgação do relatório fiscal para defender a aprovação de reformas estruturais no Brasil, sobretudo a da Previdência. Segundo a secretária, o crescimento do déficit da Previdência Social (RGPS) tem sido o principal condicionante do resultado primário do governo central.
Ela destacou que, de janeiro a agosto, a Previdência Social registrou déficit de R$ 89,0 bilhões, enquanto o Tesouro Nacional e o Banco Central foram superavitários em R$ 17,0 bilhões. Ela destacou que o crescimento persistente nas despesas obrigatórias, que incluem as previdenciárias, tem levado a um ajuste nas despesas discricionárias, mas que esse movimento está perto de um limite.
"Esse ajuste acentuado das despesas discricionárias se aproxima de um esgotamento e chegou a hora de o Brasil enfrentar mudanças de regras, medidas estruturais para que a gente possa fazer a contenção e o ajuste gradual que estamos propondo nas despesas obrigatórias", disse a secretária, que ressaltou que o governo não tem um "plano B" para o caso da não aprovação das medidas de ajuste.
Questionada sobre o fato de o déficit fiscal em 12 meses estar superior à meta para o fechamento do ano, Ana Paula observou que esse resultado considera R$ 55 bilhões em pagamento excepcional de passivos em dezembro - despesa que não se repetirá este ano. Ela disse que, nos últimos quatro meses deste ano, o governo central espera um déficit de R$ 97,9 bilhões, sendo R$ 60 bilhões no RGPS.
Em suas estimativas para o fechamento do ano, o governo conta com a entrada nos cofres públicos de R$ 6,2 bilhões referentes ao programa de regularização de ativos no exterior, que vai até 31 de outubro. Ana Paula disse que, pela visão do governo, é preferível que o Congresso Nacional não altere Lei de Repatriação, a fim de evitar incerteza no mercado. Mas ressaltou que cabe ao Congresso decidir.
Sobre uma eventual destinação de recursos da repatriação para o Fundo Soberano, que hoje conta com cerca de R$ 2 bilhões, a secretária do Tesouro disse que a disposição do governo é contrária a isso. "Nós queremos extinguir Fundo Soberano", disse Ana Paula, acrescentando que os recursos podem ser guardados para cobrir eventuais riscos fiscais ou destinados a restos a pagar do Orçamento.
A secretária disse que os servidores do Tesouro Nacional decidiram, em assembleia, encerrar a mobilização que vinham realizado ao longo do último mês em busca de melhorias salariais. Segundo ela, não houve acordo por uma elevação salarial, mas sim um debate em torno de medidas "que podem significar amadurecimento, fortalecimento e modernização da carreira". Com o término da mobilização, o relatório referente à dívida pública de agosto, que está atrasado, será divulgado em meados de outubro.
Ana Paula disse também que o governo ainda não tem decisão sobre uma possível compensação de um resultado pior dos Estados. A meta dos governos é de um superávit de R$ 6,6 bilhões em 2016, mas o déficit do setor público pode ser maior, caso eles não atinjam esse objetivo.
Valor econômico, v. 17, n. 4102, 30/09/2016. Brasil, p. A3