‘Provem corrupção minha e irei a pé ser preso’, diz Lula

 
16/09/2016
Ricardo Galhardo
Álvaro Campos

 

Em um discurso de mais de uma hora, interrompido pelo choro, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva desafiou ontem os procuradores da Operação Lava Jato a apresentarem provas de que ele tenha cometido algum ato de corrupção. Lula se disse vítima de perseguição e de um “golpe” para impedi-lo de se candidatar em 2018.

“Eles têm que aprender que a única coisa que tenho orgulho é que conquistei direito de andar de cabeça erguida nesse país (choro). Provem uma corrupção minha que irei a pé até a delegacia para ser preso. Pensei que estava em outro país”, disse o ex-presidente em pronunciamento na reunião do diretório nacional do PT, em hotel na região central de São Paulo.

Acompanhado de dezenas de aliados, ex-ministros, parlamentares, advogados e dirigentes petistas, Lula afirmou que a denúncia apresentada anteontem pelos procuradores da Lava Jato é mais um lance do “golpe tranquilo e pacífico” que, segundo ele, teve início com o impeachment de Dilma Rousseff.

“Eles construíram uma mentira, uma inverdade, um enredo de uma novela. Já cassaram o (Eduardo) Cunha, já elegeram o (Michel) Temer pelo golpe, já cassaram a Dilma, agora precisa concluir a novela. Quem é o mocinho e o bandido? Vamos dar um fecho: acabar com a vida política do Lula.” Lula falou pouco sobre o mérito da denúncia. Voltou a repetir que não é dono do triplex no Guarujá nem do sítio em Atibaia, e reclamou do que chamou de truculência da Lava Jato com sua família. Por diversas vezes ele pediu respeito com a ex-primeira-dama Marisa Letícia, também acusada formalmente pelo Ministério Público.

O ex-presidente se comparou a Jesus Cristo e diversas figuras históricas como os também ex-presidentes Getúlio Vargas, Juscelino Kubitschek e João Goulart.

“Não tenho a vocação de Getúlio de me dar um tiro, nem do Jango de sair do País. Se eles quiserem me tirar vai ter que ser na urna.” Ao argumentar que sua vida pública é conhecida da maioria do povo brasileiro, o petista citou Jesus Cristo. “Tenho uma história pública conhecida.

Acho que só ganha de mim aqui no Brasil Jesus Cristo.” Em outro momento se comparou a Tiradentes.

“É que nem as ideias de Tiradentes. Não adiantar matar, esquartejar, as ideias ficaram no ar e 30 anos depois conquistamos a independência.” ‘

 

Burocracia’. O ex-presidente fez críticas diretas e ataques indiretos aos procuradores da Lava Jato. Ele classificou funcionários públicos concursados, a exemplo dos integrantes do Ministério Público, como a “burocracia” que impede os avanços das ações de governo ao contrário da “honesta” classe política, que precisa se submeter ao escrutínio das urnas. “A profissão mais honesta é a do político. Por mais ladrão que ele seja, tem que ir pra rua, encarar o povo e pedir voto. O concursado não.” Segundo Lula, os procuradores também estão sujeitos à lei.

“Não é que somos mais honestos, mas tiramos da sala o tapete que escondia a corrupção desse país. Ninguém está acima da lei, nem um ex-presidente, nem o procurador da República.” Uma nota aprovada pelo PT com ataques ao procurador Deltan Dallagnol tratou os representantes do MPF como “burocratas facciosos” que “agora buscam concluir o trabalho sujo que lhes foi encomendado pelas forças reacionárias”. “Seu objetivo é retirar da cena política o principal líder do povo brasileiro.” A defesa do petista anunciou que vai remeter reclamação ao Conselho Nacional do Ministério Público acusando os procuradores de desvio de finalidade.

 

Novela

“A única coisa que tenho orgulho é que conquistei direito de andar de cabeça erguida nesse país (choro). Provem uma corrupção minha que irei a pé até a delegacia para ser preso.”

 

“Já cassaram o (Eduardo) Cunha, já elegeram o (Michel) Temer pelo golpe, já cassaram a Dilma, agora precisa concluir a novela. Quem é o mocinho e o bandido? Vamos dar um fecho: acabar com a vida política do Lula.”

Luiz Inácio Lula da Silva

EX-PRESIDENTE

 

______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

Lágrimas substituem a jararaca em fala menos raivosa

 

16/09/2016
Alberto Bombig

 

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva mudou radicalmente de estratégia no pronunciamento que fez ontem se comparado ao Lula que vociferou contra tudo e contra todos em março deste ano, quando foi levado de maneira coercitiva para prestar depoimento em uma sala do aeroporto de Congonhas, em São Paulo. No dia 4 de março, após ter sido ouvido por um delegado da Polícia Federal no inquérito da Lava Jato, Lula ameaçou: “Se quiseram matar a jararaca, não bateram na cabeça”. Ontem, um Lula abatido foi às lágrimas diante das câmeras de TV e dos fotógrafos, em mais um espetáculo midiático da operação, desta vez, protagonizado pela defesa.

“Eu só quero que respeitem a dona Marisa (mulher dele, também denunciada anteontem pelo Ministério Público Federal)”, disse Lula ontem, em tom colaborativo, completamente o oposto do político raivoso de março. O que mudou nesses pouco mais de seis meses transcorridos entre os dois pronunciamentos de Lula? As investigações avançaram e o PT perdeu a Presidência com o impeachment.

O “novo” discurso de Lula, que se recusou a responder a perguntas dos jornalistas ontem, foi, antes de tudo, político, emocional. O ex-presidente praticamente não entrou no mérito das graves acusações da Lava Jato sobre sua ligação (que ele não nega) com Léo Pinheiro, ex-homem forte da OAS. Fez afirmações genéricas sobre a investigação e chamou a denúncia do MPF de “pirotecnia”. E, claro, se declarou uma “vítima”.

No momento mais desafiador, Lula pediu “provas” de que praticou corrupção. O dever da prova é das autoridades, dos acusadores.

Lula sabe disso e, no âmbito jurídico, parece ter lançado mais um desafio à Lava Jato. Porém, se comovem uma parcela importante dos brasileiros e revelam o lado humano da jararaca, as lágrimas do ex-presidente também não bastam para comprovar sua inocência e decretar o fim do processo. Essa luta ele terá de travar nos tribunais com os bons advogados que tem à disposição.

______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

Okamotto vê Lei Rouanet para a OAS

 

16/09/2016
Ricardo Galhardo

 

Denunciado pela Lava Jato pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro, o presidente do Instituto Lula, Paulo Okamotto, disse que recorreu à OAS para bancar a manutenção do acervo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva porque não tinha outra alternativa. Para Okamotto, não há crime no ato e o acervo composto de milhares de cartas e presentes a Lula é de interesse público e, portanto, a empreiteira deveria pleitear o direito à Lei Rouanet para ser ressarcida dos valores pagos pelo aluguel do espaço onde o material está guardado.

“A OAS para mim deveria inclusive reivindicar Lei Rouanet porque está fazendo um pagamento para manter um bem cultural do povo brasileiro. É que não tínhamos dinheiro. Quando fizemos o contrato não tinha recursos. Como vai pagar um aluguel de R$ 25 mil? Não tinha outro jeito.

Com é que ia fazer? Onde iria guardar 14 contêineres?” / R.G.

 

O Estado de São Paulo, n. 44894, 16/09/2016. Política, p. A4