Correio braziliense, n. 19454, 30/08/2016. Política, p. 3

Embate com roteiro definido

Senadores seguiram à risca a estratégia acertada na véspera: críticas à gestão petista de um lado e discurso de golpe do outro

Por: Julia Chaib e Eduardo Militão

 

Ao longo de toda a segunda-feira, o plenário do Senado foi palco de uma sessão histórica, em que a presidente afastada, Dilma Rousseff, respondeu uma a uma as perguntas dos senadores favoráveis e contrários ao impeachment. Dilma chegou ao Congresso acompanhada de uma comitiva de apoiadores e, antes de ser inquirida, fez um discurso no qual chamou de golpe o processo, se for concluído. Depois, ao longo do interrogatório, governistas e oposicionistas mantiveram uma estratégia de abordagem à petista. Dilma foi alvo de críticas e perguntas duras, que relembrou as eleições de 2014, mas a sessão transcorreu de forma tranquila, sem bate-boca.

No total, 47 senadores fizeram perguntas a Dilma. No domingo, tanto os senadores da base de Michel Temer quanto apoiadores de Dilma se reuniram para definir estratégias para a sessão. Os governistas decidiram que a petista daria o tom do dia e que buscariam fazer perguntas técnicas. Ontem, no princípio da sessão, os parlamentares aliados da petista tentaram mudar a ordem de inscritos para perguntas, para que opositores e escudeiros dela se alternassem nos questionamentos, mas não conseguiram.

Boa parte da fala dos contrários ao impeachment foi no sentido de criticar o processo e ressaltar os feitos da gestão petista, dando a possibilidade a Dilma de lembrar das ações e reclamar de Temer. Já os governistas abordaram a crise econômica e pediram explicações sobre as duas ações em que a petista é acusada de crime. A primeira a perguntar foi a senadora Kátia Abreu (PMDB-TO), ex-oposicionista do DEM e que enfrenta a cúpula de seu partido por ser aliada de Dilma. Ex-presidente da Confederação Nacional da Agricultura (CNA), ela aproveitou o momento para destacar os feitos da gestão da petista em favor dos ruralistas e disse que não houve crime na forma de pagamento do Plano Safra.

O embate mais duro se deu quando o senador Aécio Neves (PSDB-MG), segundo colocado nas eleições presidenciais de 2014, inquiriu Dilma. O presidente do PSDB trouxe à tona o pleito e os debates daquele ano. O tucano começou dizendo que não estava alegre ao questionar Dilma. “Não poderia imaginar que, depois de nos despedirmos do último debate (eleitoral de 2014), nos encontraríamos nestas condições”, disse o tucano. Aécio afirmou que Dilma mentiu nas eleições, lembrou o processo no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e perguntou se ela e o governo se sentem “sinceramente responsáveis” pela recessão e pela crise econômica.

O tucano ainda lembrou que a chapa de Dilma e Michel Temer responde a ações no Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Ao rebatê-lo, a petista disse: “Foi aberta, contra as suas contas, investigação, pela juíza Maria Thereza (de Assis Moura), do TSE”. E continuou: “Sistematicamente, o senhor vem me acusando”. Dilma reclamou de medidas tomadas por Aécio “para desestabilizar” o seu governo, como pedir recontagem de votos e auditorias nas urnas. Também disse que o cenário econômico internacional mudou depois de outubro de 2014. E provocou Aécio: “Não há nada de mau em se perder ou ganhar uma eleição”, disse a presidente afastada.

Apoiador de Dilma, o senador Paulo Paim (PT-RS) foi o 23º parlamentar a questionar a petista. O senador bateu na tecla de que o governo de Temer poderá representar o fim de programas sociais e direitos trabalhistas. E afirmou que Dilma é alvo de traição, já que diversos ex-apoiadores, inclusive ex-ministros do seu governo votarão a favor do impeachment. “A dor de uma traição é maior do que as balas e baionetas. As pessoas aqui sabem que você é inocente”, disse Paim. Dilma aproveitou para ressaltar os programas sociais de seu governo, como o Mais Médicos.

Ao longo de diversas respostas, a petista citou as pautas-bomba aprovadas na gestão de Eduardo Cunha (PMDB-RJ) como presidente da Câmara e o fato de as comissões da Casa não terem funcionado por semanas. Reiterou o argumento usado na sua defesa, de que o processo de impeachment foi deflagrado por revanchismo. “Esse processo tem marcado nele as impressões digitais com todos os dedos de Eduardo Cunha”, afirmou, em resposta ao senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP).