Correio braziliense, n. 19449, 25/08/2016. Economia, p. 8

Renan contraria governo e apoia o reajuste do STF

Presidente do Senado afirma que colocará medida em votação em 8 de setembro e aprofunda divergências entre partidos da base. Aumento terá impacto anual de R$ 4,5 bilhões nas contas públicas e, segundo equipe econômica, pode comprometer o ajuste fiscal

Por: Antonio Temóteo

 

O racha da base aliada em relação ao aumento de salários do funcionalismo público foi escancarado ontem pelo presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL). Apesar de todas as críticas e do apelo do Palácio do Planalto para que o Congresso suspenda a tramitação de projetos de reajustes a servidores, ele disse que a correção dos rendimentos dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Procurador-Geral da República (PGR) será votada em 8 de setembro. Se aprovada, a medida resultará em um efeito cascata que agravará ainda mais a situação das contas da União, de estados e de municípios.

Para Renan, as críticas aos reajustes são uma “pequenez”, pois o aumento é justificável e foi previamente negociado. Ele destacou que, se as propostas não forem apreciadas na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE), um requerimento de urgência será votado para levar a matéria diretamente ao plenário da Casa. As principais vozes contrárias à correção de salários vêm do PSDB e do DEM, com a observação de que, ao ceder e elevar o teto de remuneração do funcionalismo, o Congresso estará pondo em risco o ajuste fiscal.

Relator na CAE do projeto que trata do aumento dos subsídios dos ministros do STF, o senador Ricardo Ferraço (PSDB-ES) deu parecer contrário à medida devido à grave crise econômica que o país enfrenta. A divisão da base aliada de Temer ficou clara quando o senador Valdir Raupp (PMDB-RO) apresentou voto em separado favorável ao reajuste dos magistrados.

Tanto os ministros do STF quando o Procurador-Geral da República pleiteiam salário de R$ 36.713 a partir de 1º de junho de 2016 e de R$ 39.293 de janeiro de 2017 em diante. A Consultoria de Orçamento do Senado estima que somente o aumento dos magistrados terá impacto financeiro anual superior a R$ 4,5 bilhões para os cofres públicos. Apenas na União, a despesa estimada supera R$ 1,2 bilhão, devido à repercussão sobre os salários dos demais juízes federais, dos ministros do Tribunal de Contas da União (TCU), e à elevação do teto do funcionalismo. Com o efeito cascata, haverá gasto adicional também nos estados.

No Ministério Público da União (MPU), o custo extra será de R$ 243,2 milhões em 2016, de R$ 670,1 milhões em 2017, de R$ 858,9 milhões em 2018, de R$ 1,1 bilhão em 2019 e de R$ 1,2 bilhão em 2020. No Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT), as despesas com pessoal aumentarão R$ 33,2 milhões em 2016, R$ 94,7 milhões em 2017, R$ 119,9 milhões em 2018, R$ 158,8 milhões em 2019 e R$ 162,2 milhões em 2020.

O governo considera que evitar esses aumentos no momento em que a equipe econômica tenta convencer os agentes produtivos e o mercado financeiro de que o ajuste fiscal é para valer. Renan afirma, contudo, que o impacto do reajuste para a União seria mínimo, de R$ 200 milhões em 2016. “Não podemos circunscrever a questão fiscal ao reajuste dos ministros. Havia concordância para que a matéria fosse votada. O impacto fiscal do aumento dos salários dos servidores do Judiciário é muito maior”, disse.

 

Demandas

Além dos reajustes aos ministros do Supremo e ao PGR, 10 projetos de lei preveem correção salarial para servidores. Estão na lista carreiras com grande poder de mobilização, como os auditores da Receita Federal e os policiais federais. Os acordos para os aumentos foram fechados ainda no governo de Dilma Rousseff e encaminhados ao Legislativo pelo presidente interino, Michel Temer, preocupado com possíveis greves no período da Olimpíada do Rio.

Apesar das críticas de senadores do PSDB e do DEM, Renan mantém a determinação de votar os projetos. “Claro que existem resistências e nós precisamos mais do que nunca fazer o ajuste fiscal para que a economia responda, mas esse é um compromisso constitucional, uma exigência legal que temos que resolver”, disse.

Durante a sessão do Congresso, ontem, o senador José Aníbal (PSDB-SP) criticou as propostas de reajustes. Ele afirmou que, enquanto milhões de brasileiros estão desempregados, o Legislativo presta um desserviço ao aumentar o valor dos contracheques dos funcionários públicos. “É estranho o PT e parte da base votarem para elevar os gastos públicos em um momento de crise”, disse.

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Sai aumento para defensores

 

O Senado Federal aprovou ontem o Projeto de Lei nº 32, de 2016, que reajusta os salários dos defensores públicos. Após um intenso debate em plenário, os parlamentares deliberaram simbolicamente em favor da concessão do aumento no valor dos contracheques. A deliberação só ocorreu porque os líderes do governo condicionaram a apreciação da matéria a votação da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que amplia a Desvinculação das Receitas da União (DRU).

O imbróglio sobre o tema começou em uma sessão tumultuada da Comissão de Assuntos Econômicos (CAE), na última terça-feira. O colegiado aprovou o projeto de lei que reajusta o salário dos defensores públicos da União, mas a decisão foi tomada quando já havia sido iniciada uma sessão do Congresso. De acordo com o regimento, os trabalhos das comissões devem ser interrompidos se houver sessão deliberativa em plenário.

 

Acordo

Os senadores Ronaldo Caiado (DEM-GO), Ricardo Ferraço (PSDB-ES) e José Aníbal (PSDB-SP) entraram com recurso contra a aprovação da matéria na CAE. O próprio Renan disse, ao presidir a sessão do Congresso, que “nenhuma deliberação das comissões será levada em consideração“, caso tenha sido tomada após o início dos trabalhos no plenário. Entretanto, com o acordo para a aprovação da DRU, a matéria foi apreciada na sessão de ontem.

Pela proposta, o salário do defensor-geral, teto da categoria, sobe para R$ 31.557 a partir de 1º de julho de 2016, e será elevado gradativamente até alcançar R$ 33.763 em janeiro de 2018. O impacto será de R$ 7,8 milhões neste ano, mas chegar a R$ 119,8 milhões em 2018. A medida gerou debate no plenário da Casa. O senador José Aníbal (PSDB-SP) destacou que, desde o fim da década de 1990, os defensores já tiveram o salário aumentado em 839,7%. “Com um país com contas públicas arruinadas concederia mais reajuste. Isso é uma vergonha”, disse. (AT)

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Greve causa transtorno

 

As paralisações promovidas por várias categorias de servidores públicos têm provocado dificuldades à população. No Ministério das Relações Exteriores, mais de 80 postos no exterior estão parados e a prestação de serviços consulares está comprometida, apesar da manutenção em atividade de 30% do efetivo de servidores. A categoria reivindica a equiparação salarial do Serviço Exterior Brasileiro às demais carreiras típicas de Estado.

Na página oficial do consulado em Barcelona (Espanha) um aviso “lamenta os transtornos e inconvenientes causados aos usuários”. Nos consulados de Vancouver e Montreal (Canadá) apenas atendimentos emergenciais estão sendo feitos. O posto em Bruxelas (Bélgica) também publicou avisos nas páginas oficiais em redes sociais sobre atrasos na entrega de documentos.

Na manhã de hoje, o Sindicato Nacional dos Servidores do Ministério das Relações Exteriores (Sinditamaraty) promove uma assembleia geral para avaliar os desdobramentos da greve. “As adesões estão aumentando. A expectativa é que o movimento se intensifique, pois ainda não fomos procurados para tratar da nossa reivindicação”, afirmou Suellen Paz, presidente da entidade.

 

Tesouro

A paralisação dos servidores do Tesouro Nacional e da Controladoria-Geral da União também tem causado problemas à sociedade. O Tesouro Direto, por exemplo, serviço que possibilita investimentos de pessoas físicas em títulos públicos, funciona de maneira irregular há vários dias. Ontem, membros do Sindicato Nacional dos Analistas e Técnicos de Finanças e Controle (Unacon Sindical) e do Conselho de Delegados Sindicais (CDS) se reuniram para coordenar as próximas ações do movimento. A pressão é pela reabertura da mesa de negociação com o governo. Os dirigentes não descartam convocação de greve geral.

“A próxima semana será decisiva. Vamos nos reunir, avaliar o que aconteceu até agora e planejar as atividades para setembro. O governo ainda não deu nenhuma resposta, então não tem por que interromper o movimento. Vamos intensificar a mobilização até termos uma resposta negativa ou positiva, o governo não pode nos ignorar”, disse o presidente da Unacon Sindical, Rudinei Marques.

Entre as reivindicações estão o realinhamento remuneratório e o cumprimento integral do acordo assinado com o Ministério do Planejamento. Os servidores também pedem tratamento isonômico com as carreiras da Receita Federal. Além disso, querem a atualização das atribuições e da nomenclatura dos cargos e a exigência de nível superior para ingresso na carreira de de técnico federal de finanças e controle.