Valor econômico, v. 17, n. 4086, 08/09/2016. Especial, p. A12

Temer recebe vaias e aplausos em desfile de 7 de setembro

Segundo Eliseu Padilha, os manifestantes que vaiaram eram apenas "18 pessoas em 18 mil"

Por: Andrea Jubé, Bruno Peres e Letícia Casado

 

Na primeira aparição pública após o fim do impeachment, o presidente Michel Temer ouviu vaias, mas também recebeu aplausos de um público estimado em vinte mil pessoas. Do outro lado do muro de metal que dividiu a Esplanada dos Ministérios para o desfile do Dia da Independência, três mil manifestantes pediram a saída do pemedebista. Temer mostrou força política ao reunir no palanque autoridades dos três Poderes, em contraponto à edição do ano passado, que já evidenciava o isolamento da então presidente Dilma Rousseff.

Com receio dos protestos, Michel Temer optou pela discrição e deu sinais de que ainda não está à vontade no cargo. Não desfilou em carro aberto, dispensando o tradicional Rolls-Royce presidencial. Também não desceu do carro para passar a tropa em revista e não vestiu a faixa presidencial. Ele chegou ao evento acompanhado da primeira-dama, Marcela Temer, que escolheu um vestido branco, cor que simboliza a paz, que o presidente invoca em seus discursos. No final do desfile, por volta das 11 horas, Temer seguiu para o Rio de Janeiro, para a abertura dos Jogos Paralímpicos.

Temer já havia decidido não usar a faixa, mas consultou um grupo de ministros mais próximos, que concordou com ele. A avaliação, segundo um auxiliar presidencial, foi de que a faixa é um símbolo de poder, e se Temer já estava no exercício deste poder, seria um gesto excessivo e desnecessário vesti-la.

Foi no momento da chegada do presidente, às 9 horas, que um grupo de manifestantes gritou "fora, Temer" e "golpistas, não passarão" da arquibancada mais próxima ao palanque presidencial, do outro lado da avenida.

De acordo com assessores presidenciais, o local era reservado para convidados de funcionários da Presidência da República. Logo apoiadores do governo retrucaram com palavras de ordem como "fora, PT" e "a nossa bandeira jamais será vermelha". No final, o mesmo grupo voltou a protestar, mas a música executada pela banda dos Dragões da Independência abafou os gritos contra o presidente.

O ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha, disse que as manifestações são naturais. "Em eventos abertos ao público, é natural que haja manifestações políticas. Embora tendo sido superada a discussão sobre a legalidade e legitimidade do governo, alguns segmentos ainda procuram olhar e voltar para trás", lamentou. Segundo o ministro da Casa Civil, o número de manifestantes era mínimo. " Dezoito pessoas em 18 mil, a dimensão está boa", disse.

Representantes dos três Poderes prestigiaram o palanque de Temer: o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), o presidente do Supremo Tribunal Federal, Ricardo Lewandowski, e quase a metade dos 24 ministros. Os ministros do PMDB compareceram em peso: Eliseu Padilha, Geddel Vieira Lima (Secretaria de Governo), Osmar Terra (Desenvolvimento Social) e o secretário-executivo do Programa de Parcerias de Investimentos (PPI), Moreira Franco.

Da cúpula pemedebista, estavam ausentes o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL) e o presidente da sigla e ex-ministro do Planejamento, senador Romero Jucá (RR). Ainda estavam presentes o titular da Justiça, Alexandre de Moraes, além de ministros do DEM, PSDB, PSD, PSB, PR e PP.

A presença de autoridades é um contraponto à imagem que marcou o desfile do ano passado, de uma presidente isolada, enquanto o PMDB, principal aliado, preparava o desembarque do governo. No ano passado, dos seis ministros da sigla, apenas Hélder Barbalho, então titular da Secretaria de Pesca, prestigiou o evento. Nenhum chefe dos demais poderes compareceu, salvo o governador do Distrito Federal, Rodrigo Rollemberg (PSB), que também participou neste ano. Cresciam os protestos contra Dilma, e bonecos gigantes infláveis - os "Pixulecos" dela e do ex-presidente Lula - eram símbolos da rejeição ao governo.

No palanque, no ano passado, Dilma e seu vice mal se falaram. Havia um mal estar indisfarçável entre eles. Duas semanas antes, Temer havia renunciado ao cargo de articulador político do governo, alegando sabotagem dos petistas. Cinco dias depois, Temer embarcaria em uma viagem oficial à Rússia e Polônia, levando na comitiva todos os ministros do PMDB.

Na edição deste ano, a marcha do "Grito dos Excluídos", organizada por movimentos sociais e partidos de oposição ao governo Temer, reuniu cerca de três mil pessoas. Mas segundo os organizadores, havia dez mil manifestantes. O ex-ministro da Secretaria Geral do governo, Gilberto Carvalho, um dos mais próximos ao ex-presidente Lula, participou dos protestos. Ele era o encarregado da interlocução com movimentos sociais durante a gestão de Dilma.

Junto com Temer, o ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha (PMDB-RJ) também era alvo preferencial dos manifestantes, que percorreram a Esplanada depois do desfile. "Cunha na cadeia" e "Temer golpista" eram as principais palavras de ordem do protesto, formado por integrantes de movimentos sociais e estudantis, além de militantes e simpatizantes de partidos políticos, especialmente do PT.

Em uma performance, um grupo se acorrentou e um dos manifestantes erguia um cartaz com a frase: "Independência ou golpe". Um incidente relatado pela Polícia Militar foi a agressão de um manifestante a um profissional de imprensa do portal UOL, que não sofreu lesões graves. O agressor foi levado para a delegacia. (com agências noticiosas)

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Em SP, protestos não registraram incidentes

Por: André Guilherme Vieira / Fernando Taquari / César Felício

 

Duas manifestações marcaram os protestos contra o governo do presidente Michel Temer em São Paulo, com perfil radicalmente diferente. Na região da Avenida Paulista, pela manhã, o destaque foi a presença quase exclusiva de militantes de movimentos sociais e sindicalistas entre os manifestantes. O grupo ocupava inteiramente cerca de três quarteirões da avenida Brigadeiro Luiz Antonio, uma pista com quatro faixas de rolamento e descia da região dos Jardins para a do parque Ibirapuera.

Em alas, desfilavam militantes do Movimento Sem Terra (MST), associações ligadas à moradia popular, CUT, Sindicato dos Metalúrgicos de Osasco e sindicatos de servidores.

A participação de candidatos na eleição municipal foi intensa. À frente, estavam o prefeito de São Paulo, Fernando Haddad (PT), candidato à reeleição e o ex-senador Eduardo Suplicy, que tenta pelo PT uma cadeira na Câmara dos Vereadores. Houve distribuição de propaganda eleitoral de dois candidatos a vereadores petistas: Juliana Cardoso e Alfredinho, e podiam ser vistas bandeiras do PT, do PCO e do PDT. Segundo os organizadores do movimento, cerca de 15 mil pessoas acompanhavam a manifestação.

Um grupo de cerca de cem policiais militares acompanhava a manifestação. Havia uma equipe da PM filmando o ato.

Na Praça da Sé, marco zero da cidade, o público era diferente. A maioria dos manifestantes era formada por jovens e não se viabandeiras de partidos, apenas cartazes em que o "fora Temer" se alternava com o "Diretas Já". Ambulantes vendiam faixas com as mesmas frases.

Um pequeno coral fez uma apresentação cantando "fora Temer". A Polícia Militar se limitava a cercar a região da Catedral com oficiais em motos e caminhando.

Assim que tomou corpo, a passeata começou a subir a Brigadeiro Luiz Antonio, do centro em direção aos Jardins. Eram cerca de 1,5 mil pessoas, com grande contingente cuja faixa etária variava entre 15 e 20 anos, com adereços do movimento punk. Havia muitos estudantes secundaristas e bandeiras vermelhas com as iniciais "L e L", de " liberdade e luta ", nome da corrente trotskista que atuou na década de 70. Alguns puxavam muros na região central com a letra maiúscula "A" dentro de um círculo e cortada por um traço, símbolo do movimento anarquista. Ao menos 40 dos manifestantes durante a tarde estavam com roupas escuras, rostos cobertos e alguns portavam equipamentos de segurança, como máscaras contra gás, coletes e escudos de madeira. Cerca de 250 policiais observavam à distância, divididos em guarnições de 20 a 25 soldados

Sob o compromisso de não ter a sua identidade revelada, e mantendo o rosto coberto, um dos jovens que se assume como "black bloc" concordou em dar entrevista à reportagem e permitiu que a conversa fosse gravada em vídeo pelo celular.

Este rapaz tem 19 anos, estuda na rede pública estadual no período da manhã e trabalha à tarde. Diz ter se juntado ao "coletivo" em 2013, durante as manifestações populares ocorridas naquele ano.

"Eu estava assistindo ao noticiário da TV numa quinta-feira e vi a Polícia Militar batendo nas pessoas. E aí percebi que tinha de fazer algo contra essa opressão policial, porque temos o direito de fazer manifestação", diz.

O manifestante se declara anarquista e diz que participa de um coletivo (de black blocs) destinado a defender as pessoas em manifestações.

"Já teve caso em que a gente garantiu a segurança de um pessoal que estava se manifestando a favor do Impeachment", garante. Apesar de se autodeclarar contrário a qualquer tipo de governo, diz que votou em Dilma Rousseff em 2014.

Sobre a violência que costuma marcar alguns protestos, com pessoas quebrando vidros de agências bancárias, vandalizando lojas e ateando fogo a lixo nas ruas, o "black bloc" atribui a responsabilidade à polícia, que estaria agindo por meio de agentes infiltrados. "A gente é pela paz, até porque não dá pra encarar a PM. Eles têm muito equipamento, armamento, não dá".

O manifestante diz que prefere ser chamado de "anarco", e não de "black bloc" e afirmou que tanto a denúncia de episódios de violência policial quanto a exigência de eleições presidenciais antecipadas eram seus objetivos no protesto.

Outros manifestantes se diziam contra Temer, mas não necessariamente favoráveis à ex-presidente Dilma Rousseff. "Não me considero petista, mas houve um golpe parlamentar em que as pessoas mais corruptas do país tomaram o poder através de uma manobra. Depois de tantos anos de democracia, retroagimos", disse o professor Matheus Motta, de 30 anos. Acompanhado dos dois filhos, o advogado Marcos Fonseca, 32 anos, afirmou que em sua opinião " as pedaladas fiscais são uma farsa e outros governantes adotaram a mesma prática e não foram condenados". Já o secundarista Guilherme Martins, de 18 anos, afirmou que o maior motivo para comparecer a manifestação foi para protestar contra a ação da Polícia Militar, que reprimiu os últimos atos na capital paulista. "A PM só sabe agir com repressão. Defendo a desmilitarização ", explicou.