Valor econômico, v. 17, n. 4095, 21/09/2016. Brasil, p. A4
Temer diz que país cresce após impeachment
Governo seguirá o caminho da responsabilidade fiscal e social, afirmou o presidente na ONU
Por: Juliano Basile
O presidente Michel Temer defendeu ontem a tramitação do processo de impeachment no Brasil, durante a abertura da Assembleia-Geral da Organização das Nações Unidas (ONU), em Nova York, e disse que o país está pronto para voltar a condições de crescimento econômico.
De acordo com o presidente o caminho seguido pelo governo será o de responsabilidade fiscal, com a aprovação de reformas para conter os gastos, e social, com a manutenção de programas de transferência de renda à população mais carente.
"Trago às Nações Unidas uma mensagem de compromisso inegociável com a democracia. O Brasil acaba de atravessar processo longo e complexo, regrado e conduzido pelo Congresso Nacional e pela Suprema Corte brasileira, que culminou em impedimento. Tudo transcorreu dentro do mais absoluto respeito à ordem constitucional", afirmou, durante o discurso de abertura da Assembleia-Geral. Ele não mencionou a ex-presidente Dilma Rousseff, mas defendeu que o processo foi feito de acordo com a lei e a Constituição.
"Não há democracia sem Estado de direito - sem normas que se apliquem a todos, inclusive aos mais poderosos. É o que o Brasil mostra ao mundo. E o faz em meio a um processo de depuração de seu sistema político", continuou o presidente.
Temer afirmou ainda que o Brasil tem um Judiciário independente, um Ministério Público atuante e órgãos do Executivo e do Legislativo "que cumprem seu dever". "Não prevalecem vontades isoladas, mas a força das instituições, sob o olhar atento de uma sociedade plural e de uma imprensa inteiramente livre."
Em seguida, ele ressaltou que a tarefa do Brasil, agora, é retomar o crescimento econômico "e restituir aos trabalhadores brasileiros milhões de empregos perdidos".
"Temos clareza sobre o caminho a seguir: o caminho da responsabilidade fiscal e da responsabilidade social. A confiança já começa a restabelecer-se, e um horizonte mais próspero já começa a desenhar-se. Nosso projeto de desenvolvimento passa, principalmente, por parcerias em investimentos, em comércio, em ciência e tecnologia. Nossas relações com países de todos os continentes serão, aqui, decisivas."
Integrantes das delegações do Equador, Bolívia, Costa Rica, Nicarágua, Venezuela e Cuba deixaram o plenário em ato que foi interpretado como uma forma de manifestar descontentamento com o impeachment. Questionado sobre as manifestações, o ministro das Relações Exteriores, José Serra, avaliou que é próximo a zero o impacto do protesto.
"Sinceramente, eu não vi. E não acho relevante", resumiu o ministro, ressaltando que precisaria se informar antes sobre a atitude de cada país. "A ONU tem 200 países, então, não me parece uma porção significativa. " O ministro ressaltou ainda que a referência ao impeachment feita por Temer no discurso foi breve. "Foi uma cortesia aos países da ONU", afirmou.
Temer deu recados claros a países com os quais pretendem estreitar relações. O presidente defendeu o Mercosul e a integração latino-americana como prioridades da política externa brasileira. Ele elogiou a Argentina, dizendo que há confiança entre os dois governos, qualificou como positivo o acordo do governo colombiano com as Farc pelo presidente Juan Manuel Santos e teve um encontro bilateral com o presidente do Peru, Pedro Pablo Kuczynski. O líder peruano disse a Temer que acompanhou o processo de impeachment e que foi bom saber que ele assumiu o cargo.
O encontro com o presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, se resumiu a um aperto de mão durante almoço em homenagem ao secretário-geral da ONU, Ban Ki-Moon. Havia a expectativa que eles pudessem se encontrar durante a reunião sobre os refugiados, organizada pelo governo americano, mas Temer preferiu não participar desse encontro. Quando Temer proferiu o discurso de abertura da Assembleia-Geral da ONU, Obama não havia chegado ao plenário.
Em sua fala, Temer criticou duramente o protecionismo comercial. "O protecionismo é uma perversa barreira ao desenvolvimento, subtrai postos de trabalho e faz de homens, mulheres e famílias de todo o mundo - Brasil inclusive - vítimas do desemprego e da desesperança", disse. Para ele, o sistema multilateral de comércio "é parte da luta contra esse mal".
"De particular importância para o desenvolvimento é o fim do protecionismo agrícola. Já não podemos adiar o resgate do passivo da OMC em agricultura. É urgente impedir que medidas sanitárias e fitossanitárias continuem a ser utilizadas para fins protecionistas. É urgente disciplinar subsídios e outras políticas distorcidas de apoio doméstico no setor agrícola."
O presidente defendeu na ONU os programas de transferência de renda desenvolvidos no Brasil. "Nosso olhar deve voltar-se, também, para as minorias e outros segmentos mais vulneráveis de nossas sociedades. É o que temos feito no Brasil, com programas de transferência de renda e de acesso à habitação e à educação, inclusive por meio do financiamento a estudantes de famílias pobres", declarou.