O novo esquema de Cunha

 
02/07/2016
Eduardo Militão
 

O presidente afastado da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), participou da criação de um esquema de corrupção dentro da Caixa Econômica durante quatro anos, segundo a Procuradoria-Geral da República (PGR). O peemedebista foi denunciado por envolvimento “na implantação e no funcionamento do esquema de corrupção e lavagem de dinheiro relacionado à Caixa Econômica Federal ao menos entre os anos de 2011 e 2015”, de acordo com a acusação, apresentada em 10 de junho e cujos trechos constam da ordem de prisão contra o doleiro Lúcio Funaro, detido ontem pela Polícia Federal.

 

O mandado de prisão foi concedido pelo ministro-relator da Lava-Jato do Supremo Tribunal Federal (STF), Teori Zavascki. A Operação “Sépsis” cumpriu ainda 19 mandados de busca e apreensão em São Paulo, Rio de Janeiro, Brasília e Recife. O lobista Milton Lyra; o dono da JBS Friboi, Joesley Batista; o empresário e herdeiro da Gol Linhas Aéreas Henrique Constantino; e empreiteiros de Recife estão entre os alvos das buscas.

 

Na denúncia no Inquérito nº 4.266, Cunha foi denunciado por 15 atos de corrupção passiva, por 318 atos de lavagem de dinheiro e por prevaricação. A acusação diz que o deputado recebeu propinas para facilitar a liberação de recursos do Fundo de Investimentos do FGTS (FI-FGTS) em favor de obras da empreiteira Carioca Engenharia, de Ricardo Pernambuco e Ricardo Pernambuco Júnior.

 

Uma das bases da ação de hoje é a colaboração premiada do ex-vice-presidente da Caixa Econômica Federal Fábio Cleto. Ele contou aos investigadores que pagava propina para Cunha para liberar recursos do (FI-FGTS) em favor de obras de empreiteiras. Depoimentos do ex-diretor da Hypermarcas Nelson Mello e do ex-senador Delcídio Amaral (PT-MS) reforçam os pedidos de prisão e de buscas.

 

Outro lado

Cunha divulgou ontem nova nota em que nega a responsabilidade em qualquer fato mencionado por Fábio Cleto, em delação premiada, que motivou a terceira denúncia pelo Supremo Tribunal Federal. “Desconheço o conteúdo da delação, porém quero desmentir com veemência os supostos fatos divulgados e desafio a provarem”, escreveu o parlamentar em comunicado. “O delator, ao que parece, é réu confesso de práticas irregulares as quais cabe a ele responder por elas.”

 

Cunha disse que não tem operador nem gestor financeiro, e não autorizou ninguém a tratar de negócios em nome dele. “Lamento que todas as denúncias formuladas são baseadas em palavras de delator, com histórias fantasiosas”, afirma.

 

Em nota divulgada ontem, a Caixa disse que “lamenta que, apesar de sua rígida estrutura de governança e de qualidade técnica dos investimentos, um suposto esquema possa ter se utilizado de informações encaminhadas aos membros dos órgãos deliberativos do fundo, para obtenção de vantagens escusas”. “Este fato isolado não reflete, de forma alguma, a postura de uma instituição que possui funcionários e órgãos de governança reconhecidos como de mais alto padrão pelo mercado.”

 

Autorização para se defender

O ministro Teori Zavascki liberou Eduardo Cunha a comparecer à Casa para fazer a própria defesa no processo que pode cassar o mandato dele. Mas o parlamentar continua proibido de frequentar o gabinete. “Ressalvadas as situações indicadas pelo Ministério Público há de se entender que a sua presença em ambiente do Congresso Nacional, notadamente em gabinete, só se justifica para o exercício de atividade parlamentar, que está suspenso”, escreveu o ministro. O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, se manifestou a favor do ingresso do requerente na Câmara dos Deputados apenas “na qualidade de usuário de serviço certo e determinado, ou para o exercício de direito individual, desde que comunicado previamente a essa Corte”. Teori Zavascki também autorizou a quebra do sigilo telefônico de Cunha, a pedido da defesa, em uma das investigações da Lava-Jato.

 

Correio braziliense, n. 19395, 02/07/2016. Política, p. 3