Correio braziliense, n. 19447, 23/08/2016. Política, p. 2

Virada cada vez mais difícil

Senado começa a julgar o impeachment de Dilma na quinta, e o cenário se mostra quase definido pelo afastamento: 45 parlamentares dizem abertamente que vão votar contra ela

Por: João Valadares

 

Com a proximidade do julgamento final da presidente afastada, Dilma Rousseff (PT), o cenário pró-impeachment no Senado é considerado praticamente irreversível. Em reserva, até os aliados da petista admitem que não há mais o que fazer. Levantamento do Correio, atualizado ontem, mostra que o quadro em desfavor de Dilma é pior do que no início de agosto. Agora, dos 63 senadores que declararam como vão votar, 45 se posicionaram pelo afastamento definitivo e 18 contrários. Os dois únicos indecisos são os senadores Acir Gurgacz (PDT-RO) e Omar Aziz (PSD-AM). Eles votaram a favor da pronúncia da presidente em 9 de agosto.

Lúcia Vânia (PSB-GO), José Maranhão (PMDB-PB) e Antônio Carlos Valadares (PSB-SE) não foram localizados. Todos eles votaram contra a petista nas duas primeiras sessões. Há ainda 12 senadores que preferiram não declarar o voto ao Correio. Desses, apenas Elmano Ferrer (PTB-PI), Otto Alencar (PSD-BA) e Roberto Muniz (PP-BA) disseram não à pronúncia da presidente. O mais provável é que aqueles que não declararam o voto agora mantenham a mesma posição. Somando os dois únicos indecisos, que também votaram contra Dilma, o placar aponta 59 votos a favor do impedimento da petista e 21 contrários, exatamente o placar final da votação da pronúncia ocorrida em agosto. Para afastar a presidente, são necessários 54 votos — dois terços do total de senadores.

O presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), deve se abster novamente. Entre os parlamentares que não declaravam o voto e resolveram abrir após a sessão que decidiu levar a presidente a julgamento final, destacam-se Eduardo Braga (PMDB-AM), Cristovam Buarque (PPS-DF), Jáder Barbalho (PMDB-PA) e Romário (PSB-RJ). Todos disseram que vão votar pelo afastamento definitivo de Dilma Rousseff.

Ontem, a senadora Gleisi Hoffmann (PT-RS) afirmou mais uma vez que não existe nenhum motivo para que a presidente deixe o poder. “Essa farsa já foi muito longe. Não existe motivo para o impeachment. Não há cometimento de crime de responsabilidade”, comentou.

O líder do DEM no Senado, Agripino Maia (RN), salientou que não resta nenhuma dúvida de que a presidente deve ser afastada de maneira definitiva. “Os votos dados anteriormente, na Câmara e no Senado, comprovam a fundamentação jurídica de todo o processo”, avaliou.

Reservadamente, alguns integrantes do PT salientam que pode até ser melhor para o partido que Temer siga até 2018. Dessa maneira, a sigla se reorganiza e aposta todas as fichas em Lula, que já percorre o país para tentar resgatar sua imagem, bombardeada pelos efeitos da Operação Lava-Jato.

A posição do senador Pedro Chaves, que substituiu o senador Delcídio do Amaral, cassado após ser flagrado bolando um plano para a fuga de Néstor Cerveró, ex-diretor da Área Internacional da Petrobras, era considerada uma incógnita até o voto “sim” na sessão de pronúncia da presidente. O empresário tem vínculos familiares com o pecuarista José Carlos Bumlai, amigo do ex-presidente Lula, preso em regime domiciliar por envolvimento no esquema de corrupção da Petrobras. Uma filha do senador é casada com um dos filhos de Bumlai.

No início do processo, os aliados de Dilma nutriam a esperança de “virar” o voto do senador Cristovam Buarque. Agora, diferentemente de outras oportunidades, ele já antecipou que se posicionará pela saída da petista. Em entrevista ao Correio, disse ter convicção do seu posicionamento. “A volta da presidente Dilma, com todo respeito a ela, seria muito ruim. Ela não tem apoio parlamentar e nós vivemos em um país democrático, então, temos que respeitar o parlamento. Estive diversas vezes com ela nesse processo e, em nenhum momento, ela me disse como seria o governo dela”, declarou. Cristovam avalia que faz um sacrifício pelo Brasil. “Então, votar para que Dilma volte, eu creio que é votar para que o Brasil atravesse mais alguns anos de crise profunda. Então, eu estou fazendo um sacrifício pelo meu país e, com muita tristeza, perco amigos, eleitores, leitores — tem pessoas que falam que não me leem mais —, mas estou fazendo pelo meu país”, disse.

 

Resposta

Ontem, em resposta à Organização dos Estados Americanos (OEA), a Câmara dos Deputados defendeu a legalidade do processo de impeachment de Dilma Rousseff. O Senado, que é responsável pela fase final, também prestou esclarecimentos na mesma linha. Nas respostas, encaminhadas ao Ministério das Relações Exteriores, o Senado e a Câmara asseguraram que o direito à ampla defesa foi garantido. “Em síntese, não houve nenhuma violação ao texto constitucional e à lei que rege a matéria e, em consequência, se assegurou a mais ampla defesa”, diz o documento enviado pela Câmara, analisando que o rito foi seguido com “rigoroso cumprimento” às normas constitucionais.