Correio braziliense, n. 19447, 23/08/2016. Opinião, p. 11

Economia, escolaridade e desemprego no DF

Por: Aldo Paviani

 

Desde longa data, sustenta-se que Brasília deverá mudar seu perfil de atividades. Em outras palavras, sua base econômica sustentada nos serviços (terciário) vai chegando ao fim, pois o desemprego chegou para 301 mil pessoas, em junho último (Dieese/Codeplan/Setrab). O esgotamento desse modelo se deve ao fato de que tecnologias aprimoram procedimentos em atividades que ocupavam maior número de pessoas, como serviços bancários. O atual período técnico-científico e informacional, segundo o geógrafo Milton Santos, é cada vez mais exigente quanto às qualificações para o mercado de trabalho. A base da pirâmide ocupacional, mais alargada por incluir trabalhadores com o fundamental completo ou mesmo analfabetos, abriga maior volume de desempregados. Ao mesmo tempo, o topo da pirâmide, que inclui pessoas com as mais elevadas qualificações, ocupa os detentores de melhores salários, tanto no serviço público quanto no setor privado.

Nas contratações e mesmo em concursos, nota-se a exigência por escolaridade mais elevada e, mesmo assim, nem sempre o emprego é oferecido para quem tem apenas o curso superior completo. Em algumas atividades, os empregadores dão preferência aos que possuem maior preparo, domínio de mais de um idioma, além de conhecimentos específicos de certas áreas como direito, matemática, administração e língua portuguesa. A taxa de desemprego das regiões administrativas (RAs) de menor renda do Distrito Federal – Grupo 3 da PED- Dieese/Codeplan/Setrab — foi de quase três vezes (22,5%) à das RAs do Grupo 1 – de mais alta renda —Plano Piloto, Lago Norte e Lago Sul (7,9%).

Cruzando os dados de desemprego com os de escolaridade nota-se que o Grupo 1 possui curso superior com média de 67,5% das entrevistas (Pdad/2013, da Codeplan), enquanto que o Grupo 3, a média dos que possuem curso superior cai para 10,2%, menos da metade da média do DF, 24,7%. Além disso, ao examinar os dados de analfabetismo dos mesmos grupos, verifica-se o baixo percentual do Grupo 1 apenas 0,36% da população se enquadra nos “analfabetos e analfabetos funcionais”, enquanto a taxa do Grupo 3 chegou a 2,88%, bem acima da média do DF, 1,9%.

Esses dados demonstram que as localidades mais carentes, além de oferecerem trabalho para pessoas com escolaridade mais baixa e, por isso, com menor remuneração — são RAs mais populosas. O Grupo 3, com sete RAs, possui 1.138.208 habitantes, segundo estimativa da Codeplan, de 2013, o que significa 40,8% da população do DF. Núcleos urbanos populosos, como é o caso de Ceilândia, possuem potencial elevado de atrair imigrantes. Essa localidade abriga o Sol Nascente e Pôr do Sol (94.199 habitantes — estimativa da Pdad/2015 da Codeplan) — constitui-se em uma das maiores favelas brasileiras. O Grupo 3, com população avantajada, deveria oferecer lugares de trabalho proporcional à respectiva população para reduzir a desigualdade social.

O Grupo 3 apresenta igualmente condições urbanas e ambientais problemáticas. Pôr do Sol e Sol Nascente contam com esgotamento sanitário em apenas 5% do território. Ademais, possuem na borda oeste enorme erosão. Nela a população deposita lixo e restos de materiais de construção, sem impedir o avanço da voçoroca. No período chuvoso, essa área da favela apresenta enxurradas de grandes proporções, que causam danos materiais aos que moram nas imediações.

Da análise anterior pode-se deduzir que os lugares mais carentes possuem baixa capacidade de gerar postos de trabalho, como é ocaso do Grupo 3. Mas, no geral, qual é o comportamento do mercado de trabalho, segundo a PED? Como distribui as ocupações por setores de atividade no DF? O resultado pode ser surpreendente, pois nada menos do que 57,9% das ocupações encontram-se na rubrica serviços, exceto administração pública. Em sequência, 19% são ocupações no comércio, reparo de veículos automotores e motocicletas. A administração pública oferece 14% das ocupações. A oferta de ocupações pela construção e pela indústria de transformação, são de pequena monta: 5 e 4%, respectivamente. Os dados revelam que a capital do funcionalismo é um mito. A atividade terciária é dominante e, pelo desemprego existente, demonstra ter chegado a seu limite de expansão. Por isso, é chegada a hora de mudar esse perfil e investir em atividades produtivas, que gerem postos de trabalho.

 

 

ALDO PAVIANI

Professor emérito da Univerdade de Brasília (UnB) e pesquisador associado do Departamento de Geografia e do Neur/Ceam/UnB