Moro acolhe denúncia e Lula vira réu na Lava Jato
17/09/2016
O juiz federal Sérgio Moro acolheu ontem denúncia da Procuradoria da República no Paraná e tornou o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva réu em ação penal da Operação Lava Jato por corrupção passiva e lavagem de dinheiro.
O petista foi acusado formalmente de receber R$ 3,7 milhões em benefício próprio – de um desvio total de R$ 87 milhões – da empreiteira OAS, entre 2006 e 2012.
É a primeira vez que o ex-presidente vira réu em processo na 13.ª Vara Federal de Curitiba sob a acusação de se beneficiar do esquema de corrupção e desvios de recursos da Petrobrás.
Além de Lula, foram denunciados e vão responder como réus na ação penal sua mulher, a ex-primeira-dama Marisa Letícia; Paulo Okamotto, presidente do Instituto Lula; José Adelmário Pinheiro, o Léo Pinheiro, ex-presidente da OAS; Paulo Gordilho, arquiteto e ex-executivo da OAS; Agenor Franklin Magalhães Medeiros, ex-executivo da OAS; Fábio Hori Yonamine, ex-presidente da OAS Investimentos; e Roberto Moreira Ferreira, ligado à OAS.
A decisão de Moro não faz citação à afirmação dos procuradores na acusação de que o expresidente era “o comandante máximo da organização criminosa”.
A apresentação da denúncia – comandada por Deltan Dallagnol, coordenador da força-tarefa, marcada pelo uso do programa PowerPoint e de adjetivos para caracterizar a suposta participação do ex-presidente no esquema – gerou críticas da defesa do petista e no mundo jurídico.
Moro se mostrou cuidadoso ao descrever a acusação contra Lula, observando que “nessa fase processual não cabe exame aprofundado das provas” e que “a admissibilidade da denúncia não significa juízo conclusivo quanto à presença da responsabilidade criminal”. Segundo o juiz, as ressalvas são oportunas porque entre os denunciados está um ex-presidente da República e a acusação e seu recebimento “podem dar azo a celeumas de toda a espécie”.
“Tais celeumas, porém, ocorrem fora do processo. Dentro, o que se espera é a observância estrita do devido processo legal, independentemente do cargo ocupado pelo acusado”, diz o juiz na decisão, destacando que Lula, no trâmite da ação, “poderá exercer livremente sua defesa”. Ele observou que o Ministério Público Federal não imputou o crime de associação criminosa, pois o fato é alvo de inquérito no Supremo Tribunal Federal – o chamado “quadrilhão”.
Moro diz no despacho que “visualiza- se, pela prova indiciária, um modus operandi consistente na colocação pelo ex-presidente de propriedades em nome de pessoas interpostas para ocultação de patrimônio”, citando o triplex no Guarujá, no litoral paulista, e o sítio em Atibaia, no interior.
O juiz relata que a denúncia se vale de delações de “criminosos colaboradores”, como o exdeputado Pedro Corrêa (PP) e o senador cassado Delcídio Amaral (sem partido-MS), para imputar “conhecimento e participação dolosa” de Lula no esquema.
Moro admite que “tais elementos probatórios são questionáveis”, mas aceitos nessa fase preliminar do processo.
Marisa. Sobre Marisa Letícia, o juiz escreveu que “lamenta” a imputação contra a ex-primeira- dama. Diz que, “muito embora haja dúvidas relevantes quanto ao seu envolvimento doloso, especificamente se sabia que os benefícios decorriam de acertos de propina no esquema”, a sua participação específica nos fatos e a sua contribuição para a aparente ocultação do real proprietário do apartamento é suficiente por ora para justificar o recebimento da denúncia também contra ela”.
Na primeira instância da Lava Jato, Lula é investigado também em inquérito que apura a compra e a reforma do Sítio Santa Bárbara, em Atibaia, e por suspeita de recebimento de propinas em forma de pagamentos de palestras para a LILS Palestras e Eventos e em doações para o Instituto Lula. / RICARDO BRANDT, FAUSTO MACEDO, JULIA AFFONSO e MATEUS COUTINHO
Argumento
“Na primeira parte da denúncia, argumenta o MPF que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva tinha conhecimento e participação direta no esquema criminoso.”
Sérgio Moro
JUIZ FEDERAL
Brasília
Esta é a segunda vez que Lula se torna réu na Justiça Federal, mas a primeira vez na Operação Lava Jato. Em Brasília, o petista também é réu por tentativa de obstrução de Justiça, acusado de tentar atrapalhar as investigações da Lava Jato.
AÇÃO PENAL
●Juiz federal Sérgio Moro recebe denúncia contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que vira réu em ação penal da Operação Lava Jato
Triplex no Guarujá
Procuradoria denunciou Lula no caso. De acordo com a investigação, o petista recebeu vantagens indevidas pagas pela OAS no triplex e no armazenamento de bens do acervo presidencial
“Luiz Inácio Lula da Silva seria beneficiário direto das vantagens concedidas pelo Grupo OAS e, segundo a denúncia, teria conhecimento de sua origem no esquema criminoso que vitimou a Petrobrás"
JUIZ FEDERAL SÉRGIO MORO, EM SUA DECISÃO
O QUE DIZ A DENÚNCIA
Lula recebeu, de forma direta, em benefício pessoal, valores oriundos do “caixa geral de propinas da OAS com o PT”
CRIMES
● Corrupção passiva
● Lavagem de dinheiro
DESPESAS PAGAS PELA OAS
R$ 3,7 milhões
R$ 1,1 milhão
DIFERENÇA ENTRE O VALOR QUE LULA DIZ TER PAGO À BANCOOP POR UM APARTAMENTO NO GUARUJÁ E O IMÓVEL EFETIVAMENTE ENTREGUE (TRIPLEX)
R$ 926 mil
BENFEITORIAS PAGAS PELA OAS NO TRIPLEX
R$ 351 mil
EXECUÇÃO DE UM PROJETO DE COZINHA E OUTROS MÓVEIS NO APARTAMENTO
R$ 1,3 milhão
ARMAZENAMENTO DE BENS DO ACERVO PRESIDENCIAL, MANTIDOS PELA GRANERO DE 2011 A 2016
OUTROS RÉUS
● Marisa Letícia Lula da Silva - Ex-primeira dama
● Paulo Okamotto - Presidente do Instituto Lula
● Léo Pinheiro - Ex-presidente da OAS
● Paulo Gordilho - Engenheiro da OAS
● Agenor Franklin Medeiros - Ex-executivo da OAS
● Fábio Hori Yonamine - Ex-executivo da OAS
● Roberto Moreira - Ex-executivo da OAS
OUTRAS INVESTIGAÇÕES
Sítio e palestras
Ainda em Curitiba, Lula é alvo de dois inquéritos – um relativo a um sítio em Atibaia e outro sobre pagamentos de empreiteiras à empresa de palestras do petista
Obstrução da Justiça
Lula já é réu por tentativa de obstrução da Lava Jato – a Justiça Federal em Brasília acatou denúncia que o acusa de atuar para “comprar o silêncio” do ex-diretor da Petrobrás Nestor Cerveró
O Estado de São Paulo, n. 44899, 21/09/2016. Política, p. A4