Título: Lula fará químio durante três meses
Autor: Campbell, Ullisses
Fonte: Correio Braziliense, 30/10/2011, Política, p. 2

Começa amanhã tratamento quimioterápico para eliminar câncer na laringe. No aniversário do ex-presidente, há três dias, médico desconfiou da rouquidão e dificuldade para engolir. Ontem, Lula foi internado para exames e recebeu o diagnóstico. À noite, deixou o hospital Ullisses Campbell

São Paulo – O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva descobriu ontem que tem um câncer de aproximadamente 3cm na laringe. Ele iniciará tratamento amanhã para eliminar o tumor. Segundo os médicos do Hospital Sírio-Libanês, em São Paulo, Lula fará três ciclos de quimioterapia ou radioterapia com intervalos de 20 dias. Não será necessário, pelo menos por hora, mantê-lo internado para o tratamento.

Lula recebeu com calma o diagnóstico do câncer do seu médico particular, Roberto Kalil Filho, que fez os primeiros exames que indicaram o tumor. O ex-presidente estava ao lado de sua esposa, Marisa Letícia, quando soube da doença e reagiu com tranquilidade. Não colocou nenhuma objeção ao tratamento sugerido pela equipe médica, diferentemente do que ocorreu quando foi diagnosticado em outras consultas doenças como hipertensão e bursite. Mas quis saber dos efeitos colaterais: "Vai cair meu cabelo?", indagou aos médicos. Lula deverá perder todos os pelos do corpo na segunda ou terceira dose de quimioterapia.

Na quinta-feira, dia de seu aniversário de 66 anos, Lula chegou ao Instituto Cidadania, no bairro do Ipiranga, rouco. Teve dificuldades de engolir uma fatia do bolo que os funcionários ofereceram. Chegou até mesmo a reclamar de dor a auxiliares. Mas não pareceu dar muita importância ao problema. À noite, Lula foi para casa, onde o esperava uma festa para cerca de 150 convidados que varou a madrugada. Dona Marisa, sua esposa, aproveitou a presença do médico particular da família, Roberto Kalil Filho, para contar sobre a rouquidão e a dificuldade que Lula estava enfrentando para engolir alimentos sólidos.

O ex-presidente diz que traga cigarrilhas esporadicamente — admite que já fumou mais — e consome bebidas alcoólicas, dois fatores que contribuem para esse tipo de câncer. Assim, o médico viu no relato indício de uma doença grave. Pediu que fosse feito um exame. Lula não gostou. Mas Kalil Filho pôde contar com dona Mariza, que se encarregou de levá-lo ao hospital ontem. "O ex-presidente Lula se queixou de uma rouquidão acima do normal, fez uns exames e detectou a doença", resumiu em entrevista o médico Paulo Hoff, da equipe médica que trata o ex-presidente.

A primeira consulta ocorreu na sexta-feira, no consultório particular de Kalil Filho. Ontem, Lula foi encaminhado ao Sírio-Libanês para realização de uma bateria de exames. Ele não resistiu, mas reclamou dizendo que não tinha nada grave. Kalil Filho não contou nem mesmo a dona Marisa que já estava desconfiado do câncer, que o levou a pedir uma tomografia no pescoço. O exame foi feito ontem e apontou o tumor em estágio inicial.

Depois do diagnóstico inicial, o ex-presidente seguiu para o Centro Cirúrgico, onde foi sedado. Uma parte do tumor foi retirada para biópsia. Os médicos aproveitaram que o paciente estava sedado e fizeram também uma endoscopia. Enquanto Lula descansava desse pequeno procedimento cirúrgico, dona Marisa foi vista chorando em um corredor do hospital com um copo de água na mão. O procedimento foi feito por volta das 15h. Às 17h30, Lula já estava acordado, num apartamento, alimentando-se bem e falando com as pessoas.

Segundo o médico Paulo Hoff, as chances de cura são elevadas, pois o tumor é pequeno e com poucas possibilidades de se espalhar pelo organismo. O oncologista do Sírio-Libanês Artur Katz, também da equipe que trata do ex-presidente, disse que o atual estado de saúde de Lula é "excelente". "Ele fará as sessões de quimioterapia e voltará para casa no mesmo dia", explicou. Hoff disse ainda que o paciente está bem disposto e falante.

Antes de decidir pelo tipo de tratamento, os médicos se reuniram entre si. Em seguida, tiveram um encontro com o ex-presidente, no qual foram apresentadas todas as alternativas de tratamento. A mais eficaz seria uma cirurgia, que eliminaria todo o tumor, mas deixaria o ex-presidente sem voz ou afônico, como se falasse engasgado, o que é conhecido vulgarmente como "voz de pato Donald". Como a cirurgia poderia impedir que Lula voltasse a discursar, ele mesmo optou pela quimioterapia ou radioterapia. "Todos nós esperamos que ele tenha uma vida completamente normal durante o tratamento e no futuro", disse o médico Artur Katz. Às 20h13, Lula deixou o hospital.

Na manhã de ontem, amigos foram ao hospital, mas não conseguiram ver Lula, que estava sedado. No fim da tarde, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, fez uma visita rápida. Ao sair do hospital, disse que o ex-presidente usava uma máscara de oxigênio após passar por exames médicos entre a manhã e a tarde. "Ele vai superar essa dificuldade porque é um lutador", ressaltou.

Durante a Cúpula Ibero-Americana, no Paraguai, o presidente do país, Fernando Lugo, deu aos demais líderes presentes a notícia, desejou melhoras a Lula e recomendou exames periódicos aos outros presidentes.

Assim que a notícia de que Lula estava no Sírio-Libanês com diagnóstico de câncer, muitas pessoas foram à porta do hospital. Um grupo de senhoras que fazia rodas de oração para o ex-vice-presidente José Alencar, morto em março após lutar há 15 anos contra um câncer no abdômen, também passou a rezar pelo ex-presidente. "O Lula ainda tem muito o que contribuir pela nação", disse a aposentada Fátima Baldasserine, 58 anos.

Representantes do Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo do Campo, entidade onde Lula começou sua militância política, tentaram fazer uma visita a Lula, mas foram desaconselhados. O sindicato divulgou uma nota de solidariedade: "Acompanhamos suas lutas no passado, em defesa do bem-estar de milhões de trabalhadores do País e estamos, mais uma vez, ao lado deste grande líder e companheiro, formando, junto com o povo brasileiro, uma corrente de fé, torcendo pela sua plena recuperação". O Corinthians, time de futebol de Lula, também divulgou nota de apoio: "O dia não começou com a melhor das notícias. Todos os brasileiros e principalmente nós, os corinthianos, se assustaram com o problema de saúde do nosso ex-presidente Lula. Estamos todos na torcida para que você esteja em breve junto com a gente torcendo pelo Timão".