Correio braziliense, n. 19425, 01/08/2016. Política, p. 4

Cassação de Cunha para destravar a pauta

Definição sobre perda de mandato de deputado e impeachment de Dilma devem nortear rumo de medidas econômicas no Congresso. No STF, denúncias da Lava-Jato estão acumuladas

Por: Eduardo Militão, Júlia Chaib e Paulo de Tarso Lyra

 

O Congresso retoma seus trabalhos nesta segunda-feira com o objetivo de aprovar uma pauta para tentar retomar o rumo da economia brasileira, mas com o empecilho de antes ter que resolver o impasse do ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha (PMDB-RJ) e da presidente afastada Dilma Rousseff. Ambos estão à beira da cassação de seus mandatos. A gestão interina de Michel Temer precisa de um mínimo de legitimidade para continuar pautando uma agenda econômica. No Judiciário, várias denúncias criminais da Operação Lava-Jato e de outros casos precisam ser recebidas pelos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), que ainda deve analisar temas como o parlamentarismo.

Para a deputada Érika Kokay (PT-DF), “a pauta prioritária para a sociedade é a cassação de Eduardo Cunha”. Réu em duas das três ações penais da Lava-Jato no STF, ele é acusado de mentir aos colegas quando disse não ter contas no exterior. O Ministério Público Suíço indicou algumas dessas contas, em que ele recebeu 1,3 milhão de francos suíços (R$ 5,2 milhões) de um lobista ligado ao PMDB e condenado por corrupção e desvios na Petrobras.

Já para o líder do PSDB no Senado, Cássio Cunha Lima (PB), “a tarefa mais importante é concluir o processo de impeachment e votar as matérias para a retomada da economia”. Os senadores devem votar hoje o relatório do senador Antônio Anastasia (PSDB-MG) sobre o caso na Comissão Especial de impeachment. No plenário, em 4 de agosto. Mas só no fim do mês, deve acontecer o julgamento da presidente afastada para que ela seja cassada ou retorne ao cargo.

Se Dilma cair, os aliados do interino devem avançar em uma pauta para destravar a economia, mas que é vista pela nova oposição e pelos sindicatos como ofensivaa a direitos conquistados pela população mais pobre. A agenda inclui aumento da idade mínima para se aposentar, reforma trabalhista, limites para gastos públicos, suspensão de contratações de servidores nos estados e retirada de participação da Petrobras no pré-sal. Segundo Érika, haverá uma “agenda de resistência” do PT e da oposição.

Caso Dilma não seja cassada e retome o poder, hipótese considerada pouco provável, também haverá uma agenda para a economia, garante o deputado Paulo Teixeira (PT-SP). “Há um placar apertado e cada dia fica mais demonstrado que não há base jurídica (para cassar o mandato)”, disse ele.

Já Cunha deve ser cassado apesar da força demonstrada para frear o processo contra ele. “A minha expectativa é que será cassado”, avalia o senador José Aníbal (PSDB-SP). “Ele não tem mais esse poder.” O plenário deve se debruçar sobre o caso na semana que vem. São necessários 257 votos para aprovar o processo por quebra de decoro parlamentar e cassar definitivamente o mandato de Cunha.

A renegociação das dívidas dos estados deve ser votada a partir de hoje na Câmara. A Casa fará votações às segundas, às terças e, talvez, às quartas-feiras, toda semana, até setembro para os deputados participarem das campanhas eleitorais em seus municípios. Este mês, ocorrem convenções partidárias para definição dos candidatos.

O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), reúne hoje o colégio de líderes para definir o cronograma de votações e está empenhado em pautar projetos de interesse do governo interino. Mas líderes partidários temem não haver quórum para a renegociação das dívidas, que alivia o caixa dos governadores para reduzir suas despesas. A proposta significa uma renúncia de R$ 50 bilhões para a União. “Eu acredito que, no mês de agosto, a gente tenha alguma condição de fazer três (sessões) vezes por semana”, disse Maia no início do recesso branco, que terminou ontem. “Quando chegar em setembro, ficará difícil.”

Para a primeira semana, o governo também colocou como prioridade a votação do projeto que cria novas regras para a exploração do pré-sal. Maia quer apressar a votação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 241, que limita o aumento de gastos públicos ao vinculá-los à inflação do ano anterior. O teto é polêmico por incluir os setores de saúde e da educação.

 

Corrupção

Considerado como prioridade por Rodrigo Maia, a Comissão Especial que analisará o pacote de dez medidas contra a corrupção começa a funcionar nesta semana. Na terça-feira, o relator, deputado Onyx Lorenzoni (DEM-RS), apresentará o cronograma do colegiado, com a previsão de entrega do relatório para novembro. No dia 4, o juiz da Lava-Jato no Paraná, Sérgio Moro, será o primeiro convidado a participar da comissão. E, no dia 9, o coordenador da força-tarefa do caso, Deltan Dallagnol. As datas coincidem com as votações do relatório sobre o impeachment de Dilma na Comissão Especial do Senado e no Plenário.

 

O que vem pela frente

Principais temas com previsão de análise pelo Executivo, Congresso e Judiciário

 

Câmara

Cassação de Cunha

Os deputados precisam votar o parecer pela cassação do ex-presidente Eduardo Cunha, acusado de mentir aos colegas ao negar ter contas no exterior.

 

Pré-sal

O projeto de Lei 4.567/16 retira da Petrobras a participação obrigatória de 30% na exploração do pré-sal. Está na pauta do plenário.

 

Teto de gastos

A PEC 241 cria um limite para aumento de gastos públicos, que não pode ultrapassar inflação do ano anterior.

 

Dívidas dos estados

O PLP 257/16 renegocia a dívida dos estados com a União, mas condiciona isso à redução de despesas, suspensão de contratações e aumento da idade mínima para aposentadoria.

 

Fundos de pensão

O PLP 268/16 tira representantes dos trabalhadores do controle dos fundos de pensão estatais.

 

Senado

Impeachment de Dilma

O julgamento da presidente afastada deve acontecer entre o fim de agosto e setembro, para que ela seja cassada ou retorne ao cargo.

 

Abuso de autoridades

O presidente do Senado, Renan Calheiros, quer aprovar o PL 280/16, considerado reação ao avanço da Lava-Jato contra os políticos.

 

Gastos flexíveis

O Senado deve analisar PEC 31/16, já aprovada na Câmara, que aumenta de 20% para 30% o uso livre de verbas antes exclusivas para órgãos ou setores, como saúde e educação. É a chamada DRU.

 

Terceirização

O PL 300/15 permite que funcionários terceirizados também trabalhem em atividades-fim das empresas e é criticado por sindicatos.

 

Executivo

Reforma da Previdência

O governo de Michel Temer pretende encampar uma reforma previdenciária para, entre outras coisas, aumentar a idade mínima. Dilma também tentou, mas sem sucesso.

 

Reforma trabalhista

Senadores esperam que o governo de Temer emplaque uma reforma nas regras trabalhistas, o que permitiria manter ou aumentar os empregos, mas pode retirar conquistas dos trabalhadores.

 

Supremo Tribunal Federal

Denúncias contra políticos

O STF está há 3 anos e meio sem acolher denúncia contra o presidente do Senado, Renan Calheiros, no caso Mônica Veloso. Só três acusações da Lava-Jato se tornaram ações penais até agora.

 

Prisão em 2ª instância

Duas ações judiciais pressionam o STF para recuar e mudar o entendimento de que uma pessoa já pode ser presa após ser condenada em 2ª instância, como acontece no resto do mundo.

 

Correção de dívidas

O STF julga o RE 870947 para definir o índice de correção das dívidas dos estados para com os contribuintes motivadas por condenação judicial, os chamados precatórios. Há mais de 6 mil casos à espera da decisão.

 

Parlamentarismo

STF deve analisar se uma emenda à Constituição pode criar o parlamentarismo no Brasil. A ação foi aberta em 1997 pelo ex-chefe de gabinete de Dilma Rousseff Jaques Wagner. O julgamento foi suspenso por pedido de vista.

 

Contratações da Petrobras

Plenário deve analisar mandado de segurança que permitiu à Petrobras continuar contratando sem licitação, apesar de determinação contrária do Tribunal de Contas da União.